quarta-feira, 20 de agosto de 2014

FanFic: "Perigosa Obsessão - Parte II" (+18)




Autora: Nai Jackson


Sinopse:

Michael Jackson é um advogado respeitado e bem sucedido que construiu uma sólida carreira na cidade de Los Angeles. Juntamente com sua esposa, Melodie, e o filho dos dois, Blanket, Michael desfruta de uma vida tranquila e confortável; é um pai exemplar, um marido afetuoso e um profissional reconhecido por seu trabalho.




A calmaria de sua rotina é rompida quando seu filho é sequestrado na saída da escola e ele descobre que um pesadelo esquecido por sete anos pode ter retornado para rondar sua família. Therese Brown, uma ex-advogada obcecada por ele, acaba de receber alta da clínica psiquiátrica onde estava internada e tenta, a todo custo, reconstruir a ligação que ambos tiveram no passado.

Louca, psicótica ou simplesmente uma mulher apaixonada? Michael fará o possível para manter Therese afastada... mas ela é persistente; e guarda um segredo que poderá mudar completamente o rumo de suas vidas.




Personagens 



- Michael Jackson - 


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- Therese Brown - 


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- Melodie Jackson -


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- Blanket Jackson -



- Christopher Carter - 


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Epílogo



Los Angeles, 16:30 P.M. Primavera de 2003 

A mulher vestida com uma saia primaveril desceu do carro e colocou os pés na calçada, respirando o ar leve e fresco do fim da tarde. Estava cansada de ficar dentro do carro, onde passara boa parte das últimas semanas, captando detalhes e informações, antes de pode agir. 
Mais cedo vira um belo casal deixar o filho de seis anos na escola e sair de mãos dadas, rindo um com o outro, na maior descontração. Os dois pouco haviam mudado desde a última vez que ela os vira - em uma situação que lhe rendera um buraco no tórax, sete anos em uma clínica para doentes mentais, e uma cicatriz na pele branca que nunca desapareceria. Perdera sete anos da vida, convivendo com um bando de retardados, fazendo terapia e recebendo medicação. Vigiada 24 horas por dia por guardas e médicos que nem sabiam o que estavam fazendo. Mas agora estava livre, finalmente. Sabia que o seu bom comportamento e sua cooperação iriam lhe render bons frutos, como realmente rendeu. 
Ajeitou a franja de cabelos pretos sobre a testa para esconder uma antiga cicatriz e levantou o rosto em direção ao sol, absorvendo o calor gostoso que penetrava na sua pele. Ajeitou o vestido e travou a porta do carro, enquanto caminhava em direção ao parquinho repleto de crianças correndo de um lado para o outro, em uma pracinha próxima à escola infantil. Um grupo de babás despreocupadas conversavam entre si, em uma rodinha, vez ou outra virando o rosto para ver se estava tudo bem com suas crianças.   
Ela observou de longe o garoto que corria em volta do escorregador, escondendo-se de um dos colegas que estava com o rosto apoiado em uma árvore, contando até cem. Não deixava de se surpreender com o quanto ele se assemelhava ao pai. A mesma curvatura das bochechas, os mesmos lábios, os mesmos cabelos, a mesma forma de se mover e, o que mais a encantara, os mesmos olhos negros, atentos, firmes, decididos. Descobrira que seu nome era Prince Michael, mas que todos o chamavam de Blanket.
A mulher caminhou pela grama e aproximou-se do esconderijo do garoto, colocando no rosto um sorriso enorme e iluminado.
- Olá – disse com a voz doce. – Tudo bem, lindinho?
O menino a olhou desconfiado, sem responder.
- Ei, não precisa se preocupar comigo, eu não sou uma estranha – comentou rindo. – Como estão o Michael e a Melodie? Sou uma antiga amiga dos seus pais.
Blanket a fitou, menos desconfiado desta vez.
- Ah... Estão em casa – respondeu. 
- Faz muito tempo que não os vejo, sabia? – ela murmurou. – O que acha de me levar até lá para uma visita? Eles iriam adorar.
- Tenho que falar com a Emma – ele murmurou gesticulando para a babá desatenta. - Mamãe e papai disseram que não posso fazer nada sem perguntar para a Emma primeiro.
- Sei disso. E é por isso que já falei com ela – mentiu. – Ela disse que podemos ir.
O menino olhou para a babá, desconfiado, e voltou a olhar para a mulher que sorria simpática para ele.
- Vamos? – ela chamou, esticando a mão para o garoto. – Podemos passar em algum lugar para comprar um sorvete bem grande antes de vermos sua mamãe e seu papai.
Indeciso sobre o que fazer, Blanket a encarou, sem se mover.
- Como você se chama, hein? – ele perguntou antes de tomar sua decisão. 
A mulher alargou ainda mais o sorriso e inclinou-se mais um pouco, entrelaçando seus dedos nos pequeninos dedos do garoto, antes de responder:
- Therese Brown. Seu pai já falou sobre mim para você?
Ele balançou a cabeça negativamente.
- Não.
- Que falta de consideração da parte dele... – ela reclamou mordendo o canto do lábio. – Posso contar para você como eu e ele nos conhecemos, quando estivermos a caminho da sua casa... – continuou a dizer, caminhando pelo gramado e trazendo o garoto consigo.
“Sim, cada um tem o final que merece, Michael”, cantarolou consigo mesma, satisfeita, enquanto conversava com o menino ao seu lado, a cópia perfeita e fiel do pai. “Se não estamos juntos agora, assim como merecemos, é porque o fim ainda não chegou para nós.”
“É apenas o nosso começo, querido. Pode acreditar!” 




"Perigosa Obsessão - Part Two"



Capítulo 1

Residência dos Jackson, Los Angeles, 17:20 P.M


O sol começara a se por no horizonte, tingindo vagarosamente de púrpura e roxo o céu até então azul. A brisa fresca de primavera soprava a copa das árvores no jardim bem cuidado, fazendo-as farfalhar com o suave movimento. Deveria ser um fim de tarde como outro qualquer, mas um fato inesperado interrompera a tranquilidade da família Jackson, fazendo Michael e Melodie abandonarem o trabalho mais cedo e seguirem de volta para casa.
Dentro da ampla residência de dois andares, a tensão no ar era evidente, contrastando com a calmaria típica de fim de tarde vinda do lado de fora. Na sala de estar, uma mulher pálida e assustada de meia idade lutava contra as próprias lágrimas, tentando, apesar do desespero, reunir o máximo de informações para dar ao jovem policial devidamente uniformizado parado a sua frente. 
- Estávamos no parque quando aconteceu – ela disse entre soluços, repetindo o mesmo que dissera meia hora antes aos pais da criança desaparecida. – Ele estava brincando com os colegas e eu, bem, eu estava sentada com as outras babás.
Um segundo policial estava com um bloco pequeno em mãos, riscando e rabiscando anotações.
- E então...? – quis saber o primeiro policial.
- E então quando fui procurá-lo para virmos embora, ele não estava mais lá – a babá completou com um soluço.  
- Por que você o deixou sozinho, droga?! – interveio uma mulher morena, com as mãos trêmulas e os olhos vermelhos. – Você não deveria ter tirado os olhos dele, Emma. Confiávamos em você!
- Eu estava de olho nele, senhora Jackson – apressou-se em responder. 
- O tempo todo? – perguntou o segundo policial.
- Posso ter sido relapsa em algum momento, mas... – a babá abaixou a voz quando os olhos acusadores de Melodie Jackson o fuzilaram.
- Alguém viu alguma coisa? – continuou o policial. – A senhora perguntou alguma coisa para as pessoas que estavam no parque?
Emma balançou a cabeça positivamente.
- Nancy, a babá dos Cooper, disse ter visto quando o Blanket entrou no carro com uma mulher morena. Bonita e morena. Foi o que ela disse.
O policial a ouviu com atenção e continuou suas anotações. A alguns cômodos de distância dali, na cozinha da residência, Michael estava andando de um lado para o outro, esperando a chegada do detetive Christopher Carter, seu melhor e mais fiel amigo. Por mais que tentasse se situar diante dos fatos, simplesmente não conseguia acreditar que aquilo estava mesmo acontecendo. Alguém levara seu filho uma hora antes, sem propósito ou causa aparente, e ele odiava os pensamentos que se multiplicavam em sua mente sobre qual tipo de tratamento Blanket poderia estar recebendo naquele exato momento. 
- Entendi certo por telefone?  - ele ouviu uma voz sobressaltada próxima a porta perguntar. - Sequestraram o Blanket?
Michael levantou os olhos e viu o amigo de óculos escuros e expressão incrédula, enfiado em um terno azul escuro dois números a mais do que deveria.  
- Você demorou! – Michael disse, caminhando até ele.
– Cara, o que esses bandidos estão pensando? – o detetive perguntou. - Esta cidade é cheia de celebridades, pessoas realmente montadas na grana. Por que não sequestram o moleque de alguma delas? Isso sim iria render um bom resgate para esses amadores filhos de uma mãe. 
Michael curvou-se sobre a mesa e encarou o amigo. 
- Tenho quase absoluta certeza de que isso não é um sequestro em troca de dinheiro, Chris – ele murmurou. – Algo simplesmente não se encaixa.
Chris abaixou os óculos e puxou uma cadeira, dando sinal para que Michael fizesse o mesmo.
- Okay, vamos analisar o que temos – murmurou sentando-se. – Levaram teu filho, Mike. Quais são as possibilidades?
- Viram uma mulher com ele – Michael respondeu ao se sentar. – Isso reduz bastante as probabilidades.
Um sorriso correu os lábios de Chris e ele mordeu a perna dos óculos.
- Tem mulher na história? – perguntou com a voz divertida. – Esse garoto ligeiro só poderia mesmo ter vindo de você.
Michael suspirou e revirou os olhos.
- Não sei como o Estado compactua com a insanidade de permitir que você trabalhe na polícia - comentou, levando as mãos às têmporas.
- O Departamento de Entorpecentes é moleza – Chris murmurou com um sorriso aberto. – Só precisamos caçar umas drogas, apreender uns cigarrinhos, dar alguns privilégios aos rappers e...
- Chris! – Michael interrompeu com a voz firme. – Meu filho está desaparecido, há dois tiras na sala enchendo a babá de perguntas, minha mulher está desesperada, e eu quero acabar com a vida da pessoa que causou tudo isso. Parece ruim o bastante para você?
- Tudo bem, vamos manter o foco – Chris murmurou. - Viram uma mulher com ele. Isso configuraria tráfico de crianças?
- Tráfico de crianças? – Michael perguntou sem se convencer. – Em plena luz do dia em um bairro tranquilo como esse? Não, não me parece provável.
- Talvez liguem pedindo o resgate. Não faço ideia do número de sequestros registrados por aqui. Esse assunto não é responsabilidade do meu departamento, você sabe. Estou aqui para ajudá-lo como amigo. A ajuda profissional é aquela que está lá na sala, colhendo informações da sua babá.
Michael levantou as sobrancelhas e encarou Christopher. 
- Foi ela, Chris. Tenho quase certeza.
O detetive o encarou sem entender. 
- Sim, foi ela. Foi uma mulher que o levou, você já disse.
- Estou dizendo que sei quem ela é! – disse Michael sem controlar o nervosismo.
- Sabe? Quem poderia ser?
Michael encarou o detetive com olhos firmes.
- Therese – murmurou, notando o quão estranho era pronunciar esse nome em voz alta após tanto tempo mencionando-o apenas em pensamento. – Foi aquela filha da mãe quem o levou. Posso sentir.
Chris pensou por alguns instantes, completamente confuso, e segundos depois lembrou-se da história que Michael lhe contara anos antes, sobre uma desequilibrada mental que o perseguira antes do seu casamento com Melodie.
- A garota do “seu pênis é minha propriedade”? – indagou com um vinco na testa. – Você não disse que ela estava em uma clínica sob custódia da justiça?
- E estava – Michael confirmou. – Estava, até a última vez que me informei.
- Cara... isso que é deixar saudade – Chris comentou, voltando a colocar os óculos.
- Eles já foram para as ruas – uma voz de mulher disse, atraindo a atenção dos dois. – Irão fazer rondas por toda a parte.
Michael levantou a cabeça e viu sua mulher com os olhos vermelhos, tendo no rosto uma expressão tão frágil que o fez levantar-se e entrelaçar as mãos nas dela imediatamente, puxando-a para perto de si.
- Não se preocupe, Mel. Logo irão encontrá-lo. 
- Também vou dar uma volta por aí – Christopher avisou, levantando-se em seguida. – Fique tranquila, Melodie, eu irei trazer o Blankie de volta.
- Eu vou com você – Michael murmurou.
- Nem pense, cara – Chris recusou de imediato. – Você é do tipo que colocaria tudo a perder. Eu sou a lei e eu cuido disso, entendeu? – disse sacando o distintivo do bolso do paletó e mostrando-o ao amigo, como se isso aumentasse sua credibilidade. – Fique aqui, mantenha os ouvidos atentos no telefone e faça uma boa massagem na sua mulher.
Michael abriu a boca para discordar mas, ao desviar os olhos para Melodie, viu que Chris tinha toda razão. Ele a abraçou, passando a palma das mãos lentamente pelas suas costas e repousou um beijo no topo da sua cabeça.
- Você também acha que foi ela? – Melodie criou coragem para perguntar.
Apesar de achar que sim, Michael balançou a cabeça negativamente e acariciou seus cabelos escuros com as pontas dos dedos.
- Não – ele disse, tentando manter a voz em um tom tranquilo. – Já faz muito tempo que tudo aconteceu. Além do mais, a mulher que viram com o Blanket era morena.
- Isso não significa nada – ela murmurou. – Não sabemos como ela pode estar atualmente. Não consigo pensar em mais ninguém.
- Melodie, a Therese é passado – Michael afirmou para acalmá-la, mais uma vez sem acreditar em suas próprias palavras. – Ela morreu para nós.
- O passado é cheio de fantasmas, Michael – Melodie murmurou, sem conseguir afastar os maus pensamentos. – Fantasmas que podem voltar para nos assombrar.
Michael fechou os olhos e apoiou o rosto da mulher em seu pescoço. Não poderia acreditar que aquele pesadelo começara de novo. Sabia apenas que, se suas suspeitas estivessem certas, iria acabar com Therese Brown de uma vez por todas e o mais rápido possível. 
Custasse o que custasse.


Capítulo 2
Respirei fundo e sorri para o garoto sentado ao meu lado, usufruindo da deliciosa sensação de liberdade que estava me fazendo companhia nas últimas semanas. Após sete anos em uma clínica convivendo com um bando de malucos que mal sabiam o próprio nome, eu precisava mesmo de uma reconexão com o mundo real. Havia em mim uma grande necessidade de reconstruir laços que se perderam enquanto estive internada. Aquilo era fundamental para a reconstrução da minha identidade.
O primeiro passo foi voltar para o meu apartamento, que ficara vazio durante meu período de detenção. Desejei voltar ao meu antigo emprego no escritório de advocacia do senhor Harold, mas isso seria impossível, levando em conta que após ser julgada e condenada o Estado já não me considerava mais apta a exercer a profissão. “Droga, Therese”, pensei comigo mesma ao perceber que eu era a mais nova desempregada de Los Angeles. “Ainda bem que você já tem algo bastante divertido para ocupar a cabeça.”
Por ser a única herdeira dos meus pais, mortos em um incêndio quando eu era adolescente, dinheiro seria a última das minhas preocupações. Difícil mesmo seria suportar o tratamento que continuaria por algum tempo, obrigando-me a fazer sessões mensais com um terapeuta que me acompanharia por infernais doze meses. Ao final de um ano, ele entregaria ao Estado um relatório que poderia me conduzir à liberdade definitiva ou de volta a clínica para dementes por tempo indeterminado. Certamente eu não estava muito preocupada com a segunda opção. Não gosto de pensar a longo prazo. Muitas coisas podem acontecer em doze meses.
Reencontrar os amigos também me parecia ser fundamental para resgatar aspectos da minha vida antes da internação. Mas não tenho nem nunca tive amigos. Posso garantir que, enquanto estive longe, apenas uma pessoa sentiu genuinamente a minha falta. Michael Jackson. O pai do garoto que está aqui, sentado ao meu lado, com a boca enfiada em um enorme sorvete de duas bolas e os lábios sujos de calda de chocolate e granulado colorido.
Quanta história eu e Michael temos para contar. Ele, um advogado importante e gostoso pra caramba, é um dos responsáveis por eu ter ficado tanto tempo afastada da cidade. Ele e também Melodie Simpson, sua atual mulher, a criatura mais desprovida de atrativos que já tive a chance de conhecer na vida. Michael seria louco se não tivesse sentido minha falta. Apesar de todos os nossos desentendimentos, ele sabe que eu sempre fui a mulher certa para ele. Não há como fugir dos nossos próprios instintos e é por isso que, desde que recoloquei os pés em Los Angeles, decidi reconstruir minha ligação com ele. “Michael teve bastante tempo para refletir” pensei comigo mesma. “Eu o farei enxergar o erro que cometeu ao me afastar do seu convívio anos atrás. Irei resgatá-lo da vida de tédio que ele com certeza está levando.”
- Já está ficando escuro – o garoto à minha frente murmurou, atraindo minha atenção e colocando a colher lambuzada de calda dentro da taça vazia. – A gente tem que ir pra casa.
Levei lentamente uma colher de sorvete de limão à boca e sorri para ele.
- Mas eu ainda não terminei – eu disse gesticulando para a minha taça em cima da mesa, fazendo sinal para a garçonete do outro lado. – Vou pedir mais um para você, está bem?
Blanket assentiu e apoiou os cotovelos na mesa.
- Traga mais um para ele – murmurei quando a garota se aproximou. Virei-me novamente para o garoto. – Pode ser de creme?
Ele assentiu e fitei a moça.
- De creme. Três bolas.
Quando a mulher se afastou, recolhi mais um pouco do sorvete na colher e voltei a olhar para a criança.
A semelhança de Blanket com o pai era incrível. Eu conseguia enxergar Michael por trás dos seus olhos astutos e atentos. Ele também tinha traços de Melodie, mas não eram os mais marcantes. O que mais chamava a atenção além dos olhos, era o formato do rosto e da boca, herança clara do pai. O menino era reservado, um pouco fechado demais, talvez porque havíamos nos conhecido apenas meia hora antes, no parquinho ao lado da escola, tempo insuficiente para que ele agisse naturalmente comigo.
- Você fala pouco – murmurei, sorrindo para ele.
Ele apoiou o rosto na mesa.
- Eu. Quero. Meu. Pai. E. Quero. Minha. Mãe.
- Daqui a pouco você irá vê-los – tentei acalmá-lo e estava sendo sincera. Eu não tinha a mínima intenção de permanecer com aquele pirralho por muito mais tempo.
- Você falou que a gente ia pra minha casa – ele relembrou. – Já tomamos o sorvete, a gente já pode ir.
- Eu ainda não terminei – respondi e ele me fitou nos olhos, fazendo-me perceber que meu tom havia sido ríspido demais. Forcei um sorriso e segurei um palavrão que formou-se na ponta da língua. – Não se preocupe, os seus pais não irão brigar com você, okay? Eu já disse que sou amiga deles e eles não se importariam por você estar aqui comigo.
- Meu pai não fala de você – ele murmurou.
- Eu e ele não nos vemos há muito tempo, como já expliquei – eu disse e vi a garçonete aproximar-se e entregar o segundo sorvete a Blanket. – Estou muito curiosa para saber como ele está. Você poderia me dizer.
O garoto enfiou a colher na borda da taça e recolheu uma porção generosa, sem me falar mais nada. Cerrei os punhos e revirei os olhos, esforçando-me ao máximo para manter o controle. 
- Como o Michael está? – perguntei, incitando o garoto a abrir a boca para alguma coisa útil que não fosse apenas se entupir com o novo sorvete. 
- Papai está bem – ele afirmou. – Mamãe também está. Vamos viajar para a Disney nas férias.
- Hm... sério? – perguntei, completando mentalmente: “pobre ingenuidade infantil.” 
- Sim.
- Eles têm muitos novos amigos?
Blanket recostou-se inquieto na cadeira.
- Mamãe tem amigas no hospital. Temos vizinhos legais. E também tem o tio Chris.
Agora, sim, a conversa parecia estar sendo mais reveladora.
- Tio Chris?
Ele assentiu.
- É o melhor amigo de papai. Ele sempre passa o natal com a gente.
- Acho que ele ainda não conhecia seu pai quando eu e ele nos tornamos... amigos. Não me lembro de nenhum Chris.
- Ele é bem legal – Blanket disse, girando a taça do sorvete com duas bolas ainda dentro dela. – Ele veste umas roupas engraçadas, fala engraçado e prende bandidos.
Minhas sobrancelhas se arquearam e guardei aquilo na mente. Todas as informações eram importantes.
- Ele é um tira? – perguntei.
- Não, ele é policial – o garoto respondeu.
Revirei os olhos, pedindo paciência em silêncio e suspirei.
- A Melodie ainda trabalha no hospital, não é mesmo?
- Trabalha. Mamãe é chefe de alguma coisa lá. – Blanket colocou a taça na mesa e a empurrou na minha direção. – Eu não quero mais. A gente pode ir agora?
Fitei o garoto firmemente, sabendo que não iria conseguir arrancar mais nada de útil dele, e levantei-me, jogando alguns dólares em cima da mesa.
- Vamos – eu disse, puxando-o pela mão.
Entramos no carro estacionado próximo ao meio fio e dirigi rumo a casa que andei observando bastante nas últimas semanas. Liguei o som do carro e um rock começou a tocar no último volume. Blanket encolheu-se no banco ao meu lado, incomodado pelo barulho, e sorri, percebendo que sua expressão irritada também havia sido herdada do pai.
- Não gosta de rock? – perguntei para ele, abaixando um pouco mais o volume.
- Eu quero ir pra casa – ele murmurou, como se já não viesse repetindo aquele mantra irritante desde que estávamos na lanchonete.
- Okay, okay, já estamos indo pra casa – respondi, pisando forte no acelerador.
Puxei o ar lentamente para dentro dos pulmões e um sorriso brotou em meus lábios quando afirmei para mim mesma que, naquele momento, eu poderia fazer o que quisesse com o pequeno Blanket. Poderia sumir com ele, atirá-lo no primeiro barranco que visse na saída da cidade, qualquer coisa que me viesse a cabeça. Mas afastá-lo dos seus pais não era o meu plano quando, uma hora antes, eu o persuadira a entrar naquele mesmo carro e me acompanhar para comprar sorvete. 
Àquela altura a babá já teria voltado para casa e avisado a Michael e Melodie que o filho deles desaparecera. Era isso, e apenas isso por enquanto, que eu desejava. Eu queria avisar aos dois que estava de volta, e sumir com o filho deles por algumas horas era um retorno bastante triunfal. Minha intenção era mostrar a eles que, com grande facilidade, coloquei as mãos no seu bem mais querido e precioso. Era uma alerta para que eles dançassem de acordo com a minha música e mantessem os olhos bem abertos. 
A polícia já poderia estar envolvida, mas qual era a importância disso? Eu era apenas uma amiga da família que queria conhecer o filho de duas pessoas que fizeram parte do meu passado. Além do mais, qualquer testemunha ocular poderia relatar que o garoto entrou no meu carro de livre e espontânea vontade. Levei-o para tomar um sorvete. Qual sequestradora má intencionada iria levar uma criança para tomar um sorvete de creme e minutos depois devolvê-lo são e salvo em sua própria casa?
Assim que entrei na extensa rua cercada de altas palmeiras onde se situava a residência da família Jackson, parei o carro e abaixei todo o volume do som.
- Pronto, chegamos – murmurei para o garoto, fitando de longe o enorme muro de pedras ainda um pouco distante. – Espero que tenha gostado da minha companhia.
Ele levantou as sobrancelhas, sem me mostrar simpatia, e destravou rapidamente o cinto de segurança que o prendia a poltrona. Inclinei-me diante do porta luvas, tirei um papel e uma caneta de dentro dele e escrevi com pressa algumas palavras. Dobrei a folha cuidadosamente e a enfiei no bolso da calça de moletom de Blanket.
- Entregue isso para o seu pai.
Ele me fitou.
- Você não vai comigo? Não vai entrar? Pensei que quisesse...
- Está tarde demais para mim – eu disse sem conseguir fingir pesar. – Você demorou demais com aquele sorvete.
- Mas foi você quem...
- Desça – ordenei com firmeza. – Desça depressa ou vou arrancar com o carro e levá-lo para minha casa. Acredite em mim, você não iria gostar de lá.
Blanket abriu rapidamente a porta e saltou na rua, observando-me com olhos curiosos. Dei um tchauzinho para ele, voltei a aumentar a música e parti a toda velocidade, irrompendo em uma alta gargalhada ao imaginar a reação de Michael quando finalmente recebesse o filho de volta e lesse o meu pequeno recado.


Capítulo 3

Michael estava abraçado com Melodie, em frente ao telefone, quando ouviu a campainha tocar. Os dois seguiram apressadamente para a porta, esperançosos por alguma notícia, e ao abri-la deram de cara com Blanket acompanhado por uma vizinha baixinha e roliça que estava segurando com firmeza a sua mão. Melodie suspirou de alívio, sentindo uma enorme sensação de bem estar se espalhar por seu corpo, e abraçou o filho por reflexo, puxando-o rapidamente para o seu colo.
- Blanket! – ela murmurou, vendo Michael aproximar-se, tão aliviado quanto ela, e acariciar as costas do garoto. – Oh, meu amor, você está bem? O que fizeram com você?
- Eu estou bem – ele respondeu, confuso por aquela recepção tão efusiva. Fitou os olhos da mãe. – Mãe... a senhora estava chorando?
Melodie limpou as lágrimas rapidamente.
- Estávamos muito preocupados com você. Onde você estava?
O garoto juntou as sobrancelhas, ainda sem entender.
- A amiga do papai me levou pra tomar sorvete. 
Michael e Melodie se entreolharam, sabendo que havia algo de muito errado ali, e viraram-se para o rosto conhecido que esperava na porta.
- Ele estava andando sozinho aqui na rua quando o avistei – a mulher disse para os dois. – Vi quando a polícia esteve aqui e a babá disse que vocês o estavam procurando. Achei que deveria acompanhá-lo de volta.
- Obrigado por se preocupar, senhora Cooper – Michael agradeceu. Afagou a cabeça do filho, com as mãos ainda trêmulas e desordenadas, e repousou um beijo na sua testa. – Blanket. Você tem ideia do susto que nos deu?
- Nunca sabemos o risco que nossas crianças podem estar correndo – Ava Cooper comentou. – Por isso sempre digo para a Katie que não se deve dar conversa a estranhos. Há muitas pessoas maldosas por aí. Pessoas capazes de fazer todo o tipo de perversidade com quem não pode se defender.
- O Blanket sabe que não deve acompanhar estranhos  – Michael disse, dirigindo um olhar rápido de reprovação ao filho. – Ainda não sabemos ao certo o que aconteceu, mas tenho certeza de que ele poderá nos explicar melhor.
- Espero que tudo seja esclarecido – a mulher disse com um sinal de cabeça. – Deus queira que não haja nenhum psicótico solto pelo bairro. – Suspirou. - Bom, tenho que ir agora. Robert e eu vamos para a igreja. 
- Obrigada Ava – Melodie voltou a agradecer. – Traga Katie para brincar com o Blanket no sábado, sim?
Ela sorriu e assentiu, despedindo-se com um aceno e virando-se para ir embora. Michael fechou a porta e pegou Blanket do colo de Melodie, apertando-o forte em seus braços. O alívio que sentia era imenso e logo percebeu que, aqueles instantes anteriores, tinham sido os mais longos e angustiantes da sua vida.
- Você nos deixou muito preocupados – murmurou para o filho, fitando-o com atenção. – Diga, Blankie, alguém te machucou?
- Não.
- Gritaram com você?
- Também não.
- Obrigaram você a fazer alguma coisa?
O garoto balançou a cabeça negativamente. Michael o abraçou mais forte.
- Tem certeza de que está mesmo bem? 
- Absoluta, pai – o garoto respondeu.
- Você precisa nos contar o que aconteceu – Melodie disse para ele.  - Absolutamente tudo, Prince. Sem esconder nada.
Blanket olhou pra ela e assentiu devagar.
- Eu vou conversar com ele – Michael disse para Melodie, ansioso para esclarecer aquela situação. – Avise para a polícia que ele já está conosco. E ligue para o Chris.
Ela balançou a cabeça afirmativamente.
- Está bem.
Michael deu um beijo suave em seus lábios e colocou Blanket no chão, dando a mão para que o garoto segurasse e seguisse com ele na direção da escada.

* * * * *


Minutos depois Michael estava no quarto do filho, sentando com ele em cima da cama. O garoto estava inquieto, sabendo que fizera algo que não deveria ter feito.
- Blanket, o que você fez foi muito errado – Michael começou a dizer. - A babá da Katie disse que viu você de mãos dadas com uma mulher, entrando em um carro com ela. O que eu e sua mãe lhe ensinamos? 
- Que não devo conversar ou aceitar coisas de pessoas desconhecidas.
Michael assentiu.
- Isso mesmo – murmurou em tom de censura. - Você conhecia a mulher que apareceu no parque?
Blanket balançou a cabeça negativamente.
- Não. Mas ela disse que era sua amiga e amiga da mamãe. 
Michael puxou a cabeça do filho para seu colo e acariciou seus cabelos com suavidade.
- Você não pode acreditar em quem você não conhece. Essa mulher já esteve aqui em casa? Você já a viu comigo ou com sua mãe?
Blanket abaixou os olhos e fitou as mãos.
- Não.
Michael suspirou e preparou-se para fazer a primeira pergunta que se formara em sua cabeça quando Blanket desapareceu.
- Ela disse o nome dela pra você?
O garoto afirmou com um gesto de cabeça.
- O nome dela é Therese – ele respondeu, fitando o pai novamente. Michael sentiu o sangue correr mais rápido pelas veias e suas têmporas vibraram. – Therese alguma coisa.
Antes que pudesse evitar, as lembranças atingiram Michael rapidamente. O som ensurdecedor de tiros e gritos, a mancha de sangue no vestido de Melodie, os olhos incrédulos de Therese quando ele desferiu um tiro por legítima defesa contra sua barriga. Como ela poderia estar de volta? Como poderia ousar aproximar-se de Blanket? Michael cerrou os punhos e esforçou-se para não permitir que sua raiva transparecesse. 
- Essa mulher não é minha amiga e não é amiga da sua mãe – ele murmurou esforçando-se para afastar as lembranças. – Ela já fez coisas ruins para nós. Ela não é uma boa pessoa.
- Eu não sabia, papai – o garoto desculpou-se. - Ela não contou.
Michael segurou a mão do filho.
- Prometa-me, Blanket, que você nunca mais vai conversar com a Therese. Se ela voltar a lhe procurar, você vai se afastar dela e vai me avisar o mais rápido possível. Estamos entendidos?
Blanket assentiu.
- Tudo bem. 
- Promete mesmo que não vai mais falar com ela?
- Prometo. 
Michael o abraçou e deu um beijo no topo da cabeça do filho. Não sabia como Therese fora colocada de volta nas ruas, mas sabia que deveria proteger sua família dela. Ela já lhe dera provas suficientes de que era louca o bastante; e ele jamais se perdoaria se algo acontecesse a Blanket ou a Melodie novamente.
- Pai? – Blanket disse recobrando sua atenção.
- Sim?
- Ela mandou isso aqui pro senhor – o garoto lembrou, tirando um papel dobrado do bolso do moletom. 
Michael pegou o papel, hesitante e curioso, e o apertou na palma da mão.
- Vá indo para o banheiro – ele disse para Blanket. – Depois do banho nós iremos dormir com a mamãe.
- Podemos apagar as luzes e fazer barulho de fantasmas para ela ficar com medo?
Michael sorriu.
- Podemos. 
- E contar histórias de terror sobre zumbis e lobisomens?
- Isso também. 
Blanket saltou da cama com animação e seguiu para o banheiro, deixando o pai sozinho no quarto. Michael olhou para o papel que Blanket lhe entregara e o desdobrou lentamente, observando a caligrafia perfeita que surgiu diante dos seus olhos.

“Jackson
A semelhança entre você e o Blanket me deixou impressionada. É uma pena eu ter estado longe quando ele nasceu. Infelizmente, por motivos bem conhecidos por nós, tive que ficar afastada por um longo período. Mas, como dizem, nunca é tarde para recuperar o tempo perdido.
Espero que esteja com saudade. Apesar de tudo, eu também estou. Mas não nos preocupemos com isso, okay? Nos veremos antes do que você imagina.
Mande lembranças para a Melodie. Ela realmente conseguiu o que queria, não posso deixar de admitir. Espero que o casamento a tenha feito aprender a transar.

Com amor
Com carinho
Dane-se

Therese.”



Michael amassou o papel entre os dedos e praguejou alto, prometendo a si mesmo que estaria preparado quando Therese se reaproximasse. Saberia lidar com ela, quanto a isso não havia dúvida. E logo aquela louca estaria de volta ao manicômio de onde nunca deveria ter saído. 



Capítulo 4

No dia seguinte ao meu passeio com Blanket, fui despertada com o toque insistente e irritante da campainha. Saltei da cama apressadamente e, ainda meio grogue de sono, fui atender a porta para descobrir o que diabos poderia estar acontecendo do lado de fora.
- São seis da manhã – respondi assim que atendi e me deparei com dois homens, um alto e o outro baixo, parados em frente ao apartamento. – Espero que os senhores tenham um ótimo motivo para me acordar com tanto estardalhaço a essa hora. 
- Therese Brown? – o mais alto perguntou, pigarreando ao descer os olhos pelo baby doll de rendas que não me dei ao trabalho de cobrir com um robe. 
- Sim, sou eu.
- Sou o detetive Houston e esse é o detetive Aniston – disse sacando um distintivo e gesticulando para seu parceiro. - Temos uma denúncia contra a senhorita e gostaríamos que nos acompanhasse até a delegacia para alguns esclarecimentos.
A rapidez de Michael em usar sua influência como advogado e mexer alguns pauzinhos com seus contatos dentro da polícia me deixou surpresa e impressionada.
- Qual é a acusação? – perguntei.
- Segundo informações, a senhorita colocou um menor de idade em situação de risco – o outro detetive afirmou, sem tirar os olhos da minha roupa. – Michael e Melodie Jackson fizeram uma acusação formal contra a senhorita e é nosso dever apurar o caso.
- Eu sou absolutamente inocente – murmurei.
- Não estamos dizendo o contrário, senhorita. Como dissemos, é apenas um interrogatório para esclarecimentos. 
- Vocês não me interrogariam se acreditassem que sou inocente – retruquei.
- Estamos fazendo o nosso trabalho – o detetive Houston murmurou. – Vai nos acompanhar informalmente ou prefere que a gente volte mais tarde com uma intimação?
Arqueei as sobrancelhas.
- Posso me vestir primeiro ou preferem que eu vá assim? – perguntei apontando para minha roupa de dormir. 
O detetive Aniston lançou um olhar para o meu decote e tentou se recompor.
- Estaremos esperando aqui fora, senhorita Brown – ele disse educadamente, esforçando-se para esconder a excitação e abrir um sorriso simpático.
- Claro que estarão esperando aí fora – murmurei com uma piscadela. – Não convidei nenhum dos dois para entrar, convidei?
Fechei a porta, deixando os dois policiais do lado de fora, e caminhei em direção ao quarto em passos calmos e lentos. Enfiei-me em uma calça jeans e uma blusa escura de malha e parei em frente ao espelho para aplicar um batom claro nos lábios. Passei uma escova macia nos cabelos curtos e pretos e decidi que voltaria para os fios loiros assim que tivesse um tempo vago. 
Apenas alguns minutos depois, eu estava no banco de trás do carro dirigido pelo detetive Aniston, mais calma do que nunca, enquanto ele e seu parceiro me conduziam para a delegacia.

* * * * *

No prédio da chefatura da polícia fui conduzida até uma sala pequena impregnada com fumaça e cheiro de cigarro, onde um velho gordo de cabelos grisalhos esperava por mim atrás de uma enorme mesa de madeira repleta de papéis desarrumados.
- Aqui está ela, capitão – um dos detetives disse para o velho assim que entramos na sala.
- Bom trabalho, Houston. – Olhou diretamente em meus olhos. – Não criou problemas ao ser convidada para essa visita, senhorita?
- Ainda não, mas posso criar se não me explicarem o motivo do interrogatório – eu disse para ele.
- Você está dispensado, Houston – o velho murmurou para o detetive. – Quero conversar a sós com a moça.
O detetive assentiu com a cabeça e saiu da sala, fechando a porta atrás de si. Sentei-me relutante em uma cadeira e vi a identificação “Chefe de polícia Thomas Davis” ao lado do computador em cima da mesa.
- Agora o senhor pode me dizer por que eu estou aqui.
Ele sorriu, observando-me com atenção.
- Talvez eu deva informá-la de que Michael Jackson é bastante conhecido por aqui – ele começou a dizer com uma voz extremamente calculada. 
- Todos em Los Angeles conhecem Michael Jackson – murmurei recostando-me na cadeira, sabendo que Michael era um profissional reconhecido por defender grandes causas. – O que isso tem a ver com o fato de seus homens baterem à minha porta às seis horas da manhã?
O capitão acendeu um cigarro e deu uma longa tragada. 
- Ontem fomos avisados do lamentável desaparecimento de seu filho. 
Continuei com os olhos fixos nele, esperando que continuasse. 
- Coloquei meus homens nas ruas a procura do garoto, senhorita Brown - o velho prosseguiu. - Todos estávamos acreditando que se tratava de um sequestro. Mas, poucos minutos após a denúncia, Prince surgiu novamente em sua casa, como se absolutamente nada tivesse acontecido.
- Ainda não entendi o que isso tem a ver comigo, capitão.
Ele soltou a fumaça no meu rosto. 
- Quando perguntado sobre o que acontecera, ele disse que a senhorita o havia convidado para um passeio e o persuadido a acompanhá-la.
Cruzei as pernas tranquilamente.
- Sim, eu convidei – admiti. – E ele aceitou. Onde está o problema?
- A senhorita sumiu com uma criança, um menor, um incapaz, por algumas horas sem a permissão dos pais dela – o capitão disse com um tom subitamente ríspido. - É  que está o problema.
Descruzei as pernas e suspirei.
- A Melodie e o Michael exageraram quando colocaram a polícia na história – eu disse pacientemente. - Paguei um ou dois sorvetes pro Blanket e o levei de volta para casa logo depois. Diga-me, capitão Davis, se eu tivesse algum plano obscuro, algo que fosse digno de tanto desespero, eu teria levado o garoto de volta?
O capitão levantou-se, nitidamente irritado, e caminhou em círculos pela sala até parar diante de mim e me encarar com firmeza.
- Não queira me fazer de idiota, senhorita Brown – ele murmurou. - A senhorita foi condenada anos atrás por ter invadido uma propriedade do senhor Jackson e feito ele e a esposa reféns.
- Tudo não passou de um grande mal entendido, naquela época – afirmei. – Assim como esse interrogatório está sendo um grande mal entendido agora.
O capitão Davis inclinou-se sobre mim e levantou as sobrancelhas.- Não tenho o suficiente para prendê-la – murmurou fitando-me com firmeza, em um tom de voz nitidamente ameaçador. – Mas quero que saiba, senhorita Brown, que eu e meus homens estaremos de olho em você.
Levantei-me, sem me abalar por sua ameaça, e não consegui evitar que um sorriso satisfeito dançasse em meus lábios.
- Ótimo, capitão – murmurei afirmando a mim mesma que não perderia mais nem um segundo do meu tempo ali. - Mantenha seus olhos e os olhos de seus homens bastante abertos, certo? – Dei uma piscadela. - Eu sempre gostei de ser o centro das atenções.
Capítulo 5

Assim que coloquei os pés do lado de fora do prédio da chefatura da polícia, ainda saboreando a conversa que tive com o capitão, senti uma mão pesada repousar nos meus ombros por trás e obrigar-me a cessar os passsos. Virei-me para identificar quem se aproximara, certa de que daria de cara com os agentes Aniston e Houston, mas, para minha surpresa, acabei me deparando com um par desconhecidos de olhos arregalados que me fitava com curiosidade.
- Então você é a garota – o estranho disse, analisando-me dos pés a cabeça.
Arqueei as sobrancelhas e retirei as mãos dele de cima de mim.
- Quer fazer o favor de sair do meu caminho? – eu disse e voltei a caminhar.
O homem me acompanhou com passos largos e tocou meu ombro novamente, empunhando um distintivo desta vez. Nele estava escrito “Christopher Carter” ao lado de uma foto que correspondia ao cara negro com olhos atentos que continuava a me encarar. Lembrei-me das palavras de Blanket a respeito de um tira amigo da família e isso foi o suficiente para me fazer morder o canto da boca e ficar parada, tomada por uma súbita curiosidade.
- Eu sempre digo pro Mike que garotas brancas são sinônimo de encrenca, mas ele nunca me escuta – o cara murmurou, mais para si mesmo do que para mim. Pigarreou e tentou, sem sucesso algum, parecer ameaçador. – Olha aqui, belezinha, tenho algo a lhe dizer. Não ouse tocar no Mike Júnior outra vez, estamos entendidos? 
Estreitei as sobrancelhas e olhei bem para ele.
- O quê?
- Não se meta com os Jackson – ele reforçou. - Eu irei ficar muito ressentido se tiver que colocar um desconfortável par de algemas em torno dos seus lindos e delicados pulsos.
Eu o encarei, sem conseguir reprimir um sorriso. “Que tipo de idiota é esse cara?”
- Não sei quem você é e não me interessa nem um pouco saber – eu disse com um leve dar de ombros. – Mas se você estiver falando sobre o filho de Michael Jackson, posso lhe dizer que o maldito assunto já está devidamente esclarecido e encerrado.
- Encerrado? – ele perguntou e expressou um sorriso com nítida desconfiança. – Não sei quais são os seus planos, mas meu faro diz que isso ainda está bem longe de terminar. 
- Seu faro não me interessa, detetive – eu disse e recomecei a caminhar.
O agente apressou-se atrás de mim e me segurou pelo braço, forçando-me a encará-lo.
- Você já foi condenada uma vez e será novamente se voltar a procurar o Michael – Christopher murmurou, e parecia bem informado sobre o assunto. – Diga-me, o que estava pretendendo quando sequestrou o Blanket no parque da escola?
- Não sequestrei ninguém – apressei-me em corrigi-lo. – Levei o garoto para dar uma volta. 
Ele semicerrou os olhos carregados de ironia.
- E eu sou o irmão afro-descendente de George W. Bush.
Soltei um suspiro frustrado e revirei os olhos. Eu não precisava perder meu tempo com aquele cara, mas algo me dizia que ele seria o meu passaporte para o seio da família Jackson. Forcei-me a abrir um sorriso e, desta vez, foi uma das minhas mãos que encontrou os seus ombros. 
- Não se deixe influenciar pelas palavras do Michael e da Melodie, agente. Você nem me conhece. Não pode fazer juízo algum a meu respeito.
Christopher correu os olhos novamente pelo meu rosto.
- Sei o suficiente para deduzir a boa bisca que você é.
Franzi os lábios, fingindo estar constrangida por sua observação.
- É isso mesmo o que você acha? – perguntei. – Posso saber o que de tão terrível o Michael falou sobre mim? Tenho direito a uma defesa.
O tira me fitou de um jeito estranho e vi um sorriso despontar em seus lábios.
- Esquece, Theresa. Você não iria gostar de saber.
- Therese – corrigi. – Seja como for, ainda tenho direito a uma defesa. Quero tirar todas essas más impressões, agente Carter. Depois de me conhecer você verá que não sou tão má quanto dizem por aí.
Ele levantou as sobrancelhas e pressionei um pouco mais forte os seus ombros, sentindo-os tensionarem com o toque. 
- Podemos marcar algo? – perguntei. - Um jantar, um drinque... qualquer coisa.
O tira se mostrou um pouco hesitante, de olhos ainda semicerrados.
- Está pensando em armar alguma pra cima de mim? – ele perguntou. – Pensa que sou idiota?
Com certeza eu pensava, mas ele não precisava ficar sabendo disso.
- De forma alguma – murmurei e sorri, mordendo o lábio inferior. – Continuo a ter o espírito persistente de uma advogada. Gosto de esclarecer todos os pontos e encaixar todas as peças em seus devidos lugares. Você conhece um lado da história, mas não conhece a história inteira. Estou disposta a mostrar a você o outro lado e espero que você esteja disposto a conhecê-lo.
Ele arqueou as sobrancelhas e, mesmo sem sorrir, pareceu-me satisfeito. Fitou meus olhos e sua expressão tornou-se um pouco mais branda, provando-me, pela milésima vez, que os homens são mesmo todos iguais.
- Talvez eu possa sim lhe dar a honra da minha companhia por um instante – ele respondeu e finalmente sorriu para mim, entregando-me um cartão com seu nome e telefone. – Ligue para mim e, se eu tiver um tempo vago, marcaremos um jantar. Um jantar, um drinque e qualquer coisa. 

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Sanatório San Pedro, Glendale, sete anos antes

O som das colheres de plástico batendo contra o prato raso era o único som que se ouvia no refeitório. As internas comiam, de cabeça baixa, sendo vigiadas por três jovens freiras que as observavam com atenção. Os pulsos não estavam atados, os pés também estavam livres, e Therese sabia que, apesar daquele ser um ambiente deplorável, a cadeia era um lugar pior. Estava ali a três meses e todos os dias praguejava por estar sendo tão injustiçada. Não era louca. Não era uma demente. Esperava ansiosamente o dia em que os médicos perceberiam que ela era absolutamente normal e lhe concederiam outra vez a liberdade.
- Não vai comer? – a interna sentada do seu lado perguntou quando notou que ela mal tocara na comida. Era magra, pálida, muito jovem, completamente esquizofrênica, e Therese se perguntava que tipo de infração cometera para ir parar ali. Chamava-se Lorna. – Se não for comer, eu quero. Eu quero, sim, Maria Anna. Ainda tenho fome.
Therese olhou para ela e sentiu vontade de repetir pela centésima vez que seu nome não era Maria Anna, mas a mulher era tão digna de pena que ela preferiu não perder tempo. Empurrou o prato na sua direção e viu a interna apará-lo com a mão em punho. A sopa tinha gosto de água fervida.
- Pode ficar com tudo – ela disse.
A interna agarrou o prato e mostrou um sorriso de dentes amarelos e pontiagudos.
- Tem certeza de que não quer mesmo comer? – perguntou. – Você tem que comer, Maria Anna. Tem que comer.
- Não estou com fome – Therese respondeu. – Eles acham que somos animais – resmungou. - Até os porcos recusariam uma lavagem nojenta como essa aí.
A mulher deu de ombros e remexeu a sopa com a colher.
- Você não pode ficar sem comer – ela disse a Therese. Gesticulou para as freiras com um gesto de cabeça. – Elas já sabem?
Therese a fitou.
- Sabem do quê?
A interna apontou para a barriga de Therese com a colher.
- Do que está aí dentro – sussurrou. – Já dá pra ver. Dá, sim. O que está aí dentro.
Therese voltou os olhos para a mesa e deu de ombros, sem querer mais conversar. Não queria falar sobre aquele assunto. Não interessava a ninguém. Tocou a barriga e lembrou-se de Michael, do tiro que ele lhe dera; e em como quase acabara com o único elo que ainda ligavam eles dois. 

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Capítulo 6

Christopher Carter era um bobo munido com um distintivo. Apenas um olhar e dois minutos de conversa já seriam suficientes para qualquer pessoa tomar consciência do quanto ele era idiota. O agente era uma espécie ridícula daqueles débeis mentais que se acham naturalmente engraçados e que enfeitam qualquer frase com piadinhas irônicas para causar algum efeito. Não sei onde Michael o conheceu, sei apenas que os dois devem ter pouquíssimas coisas em comum. Michael é um homem sério e extremamente centrado... ou pelo menos era, na época em que convivi com ele. Muitas coisas podem ter mudado... e, enquanto conheço mais da sua nova vida, já começo a me perguntar o quanto. Sete anos é tempo mais do que suficiente para moldar e modificar as pessoas. 
Eu também me sinto modificada. Como não poderia deixar de ser, as merdas do passado deixaram seus ensinamentos. Várias coisas aconteceram durante o período de internação na clínica e algumas delas me marcaram mais do que eu gostaria. Também poderão marcar Michael - e tenho certeza de que irão - assim que eu lhe contar algo do seu interesse. Talvez ele não acredite... Mas ele tem o direito de saber. Ou melhor, ele tem o direito, e o dever, de descobrir.
Tirei o resto do dia para comprar algumas roupas e voltar a ter os cabelos louros que eu tinha quando Michael me viu pela primeira vez. Agora os fios estão um pouco mais curtos, mas a tonalidade clara fica imensamente melhor do que a escura que fui obrigada a usar no internato. Lá eu não tinha a mínima vontade de cuidar da minha aparência. Eu não recebia visitas, então, para quem eu iria ficar bonita? Para meia dúzia de dementes que nem sabiam a diferença entre um homem e uma mulher? Algumas das internas de lá eram tão malucas que costumavam arrancar os cabelos para comer. Quando estavam agressivas, os enfermeiros tinham o maior trabalho para enfiá-las nas camisas de força e fazê-las parar de gritar. 
Eu não poderia sequer pensar na possibilidade de voltar para aquele lugar. Diante das novas circunstâncias, com os homens do capitão Davis presos no meu encalço, seria sensato procurar um advogado para cuidar dos meus interesses e, principalmente, para se certificar de que o pequeno passeio com Blanket Jackson não iria se tornar um problema. “Alguns conselhos profissionais não seriam uma má ideia”, pensei comigo mesma, enquanto colocava no armário as peças de roupa que eu comprara. “E quem é o melhor advogado da cidade?”, perguntei com um sorriso dançando nos lábios.
Michael Jackson, claro.
Peguei o carro e dirigi até seu escritório, fazendo o mesmo perscurso que se tornara habitual anos atrás. Entrei no prédio, subi pelo elevador e, assim que pisei no andar onde Michael trabalhava, notei que o espaço havia sido ampliado e estava mais elegante do que nunca. Caminhei na direção de uma das suas secretárias e, com muita tranquilidade, pedi para ser anunciada. Logo percebi que ele continuava a empregar mulheres atraentes com cara de prostitutas. Certos hábitos nunca mudam, definitivamente.
- A senhorita tem hora marcada? – a mulher loira perguntou.
- Não, não tenho – respondi. – Mas ele irá me receber.
O tom confiante da minha voz fez a mulher arquear as sobrancelhas.
- O senhor Jackson não recebe...
- Diga ao Jackson que Therese Brown deseja falar com ele, agora – interrompi incisivamente.
A loira me fitou por mais um instante e, pacientemente, esticou uma das mãos e pegou o telefone. Disse algumas palavras no bocal e levantou-se em seguida.
- Por favor, me acompanhe – murmurou, seguindo para uma enorme porta negra de orvalho. Acompanhei-a e parei quando ela também cessou os movimentos. – Entre – ordenou, empurrando a porta para mim.
Fiz um aceno de cabeça e entrei na sala, caminhando com passos firmes e determinados. Assim que ergui os olhos e o vi sentado atrás de uma enorme mesa de madeira, com uma expressão séria no rosto, lembrei-me da primeira vez que nos encontramos, exatamente naquele mesmo lugar. Sentei-me diante dele e cruzei as pernas, vendo a secretária sair da sala e fechar a porta atrás de si. Por alguns instantes nossos olhares permaneceram fixos um no outro, se estudando com curiosidade e cautela, enquanto eu procurava as palavras certas para quebrar o incômodo silêncio que nos rodeava.
O filho da mãe continuava lindo. A idade acrescentara um charme a mais em sua aparência, mas o resto continuava igual. A mesma postura imponente, o mesmo rosto anguloso, os mesmos lábios avermelhados, os mesmos olhos negros e profundos. O perfume também era o mesmo; e invadiu minhas narinas apesar da distância em que estávamos, preenchendo o ar com certo teor de saudade e de nostaugia.
- É bom rever você – eu disse com tranquilidade. – Você não mudou muito. 
Ele me observou com uma calma calculada e inclinou-se um pouco para a frente.
- Você seria uma mulher morta se tivesse feito alguma coisa com o Blanket ontem – ele murmurou; e senti um enorme bem estar ao ouvir o som de sua voz. – Eu iria caçá-la, Therese. Eu iria caçá-la até mesmo no inferno e iria acabar com a sua vida.
- Que bela recepção – murmurei e sorri. – Seu filho é uma gracinha. Ele se parece com você.
O silêncio instalou-se na sala novamente e permanecemos apenas nos encarando por alguns segundos, olhar sustentando olhar. Michael se levantou, erguendo-se diante de mim, e fitou meus olhos de cima. Não estava intimidado, e eu não queria que estivesse. Sempre apreciei sua firmeza e, ao que parecia, ela também não havia mudado.
- Por que você voltou? – a voz dele soou clara e firme.
- Recebi alta – respondi para ele.
- Isso não responde a minha pergunta. Por que você voltou? – o tom foi ainda mais firme desta vez.
- Por que mais seria? – perguntei. – Senti sua falta, Michael.
Ele sorriu sem humor.
- Sentiu minha falta? – Suas mãos se fecharam em torno de alguns papéis em cima da mesa. - Você quase me matou, Therese. Lembra-se disso? Eu me lembro muito bem. Enxerguei a morte dentro da porra dos seus olhos, e tenha absoluta certeza de que não foi uma visão agradável. Como você pode ter a coragem de pisar aqui depois de tudo o que aconteceu?
Descruzei as pernas, detestando aquelas lembranças desagradáveis.
- Não guarde ressentimentos – murmurei com a voz suave. – O importante é o que aconteceu, não o que poderia ter acontecido. Foi você quem me deu um tiro. Eu é que deveria estar aborrecida.
Ele franziu os lábios, nitidamente irritado.
- Foi para isso que você voltou? Para infernizar outra vez minha vida?
Levantei-me e, com passos lentos, dei a volta na mesa e me aproximei dele. Michael me observou com atenção, sem me censurar nem recuar. Senti um formigamento na pele quando nossos corpos se encostaram e, mesmo com a roupa nos separando, pude sentir o calor que emanava dele.
- Temos assuntos pendentes – eu disse e toquei sua gravata. – Eles me trouxeram de volta.
- Não tenho assunto algum para tratar com você – ele disse e senti algo frio tocar minha garganta. Abaixei os olhos e notei que uma de suas mãos havia puxado um revólver prateado da gaveta. Mordi o lábio, sem conseguir acreditar. - Você vai sumir daqui, entendeu? Você irá sumir daqui, Therese, e isso não é um pedido. Garanto que se você tiver a audácia de tocar no meu filho ou na Melodie novamente, a porra da minha mira será mais certeira do que da última vez.
Madição, a idade também o tornara mais rápido do que nunca. Sorri e reclinei o pescoço, deixando a arma tocar livremente pela pele fria. Prendi o lábio forte entre os dentes e voltei a observar Michael, fitando-o com um brilho de admiração no olhar. Sentei-me em cima da mesa, sob sua mira, e o encarei sem me intimidar. A pequena cicatriz na minha barriga começou a vibrar abaixo da blusa, como se tivesse sido despertada pela recordação.
- Olha no que o destino te transfomou – murmurei. - Você está falando como um gângster... Portando-se como um verdadeiro fora da lei. De cada dez palavras que saem da sua boca, cinco são palavrões e onze são algum tipo de ameaça. – Sorri com malícia. - Vá devagar, Michael, desse jeito fica difícil manter o controle. Se eu já não estivesse apaixonada por você, iria me apaixonar agora. 
Michael apertou a arma um pouco mais, com a mão bem firme em volta dela.
- Você continua a ser uma cínica – ele observou. – Tenho pena de você, Therese. Tantos anos de internação e você parece não ter mudado nada. Continua a ser uma criatura deplorável. 
Toquei a ponta da arma e deslizei o dedo pelo cano dela, explorando-a com fascínio.
- Deveria ter pena da Melodie. Aliás, foi por isso que você se casou com ela, não foi? – eu disse e empurrei devagar o cano para baixo, forçando-o a deslizar por entre meus seios. - Por pena. Ela nunca foi mulher para você . – Afastei as pernas e fui forçando mais a arma, fazendo-a descer lentamente pelo meu corpo. Michael se deixou ser guiado, fitando o revólver enquanto ele ganhava espaço rumo ao sul. – Ela sempre foi uma cadelinha domesticada pronta para abaixar as orelhas e abanar o rabo – murmurei e senti o cano tocar o tecido da calcinha, por cima do clitóris. Mordi o canto da boca e o esfreguei ali, afastando lentamente o tecido. - Você fez uma péssima escolha, Jackson. Seu filho merecia uma mãe melhor.
Michael levantou os olhos até os meus e vi que eles estavam mais escuros do que nunca. Um nítido volume trasparecia pela calça do terno e sorri de triunfo quando o observei. Ele ainda me desejava. Muito. Havia entre nós uma ligação sexual grande demais para ser disfarçada, forte demais para ser refreada.
- Tire as mãos da arma – ordenou.
- Você sabe o quando me interesso por elas – eu disse e a empurrei contra o clitóris outra vez, com uma vontade enorme de colocar todo o cano dentro da calcinha. – Eu tinha a Pluma, você se lembra? Tiraram ela de mim.
- Chega, Therese – ele disse e puxou a arma com força. – Você é doente. 
Gargalhei e toquei a arma de novo, fitando-o enquanto guiava o cano para dentro da minha boca. Passei a língua pelo metal e mordi outra vez os lábios, tão excitada que me sentia prestes a explodir.
- Você acabou de perder uma chance incrível – eu disse e fechei as pernas, saltando da mesa.
- De foder você? – Michael perguntou com sarcasmo. Ele sabia que era isso o que eu queria.
- Também – respondi com um sorriso. – Teve a chance de atirar em mim, e não o fez. Você não me quer morta, Michael. Você não me quer longe. Admita que está feliz em me ver.
Ele jogou a arma dentro da gaveta e a fechou com força.
- Não se iluda – murmurou. – Quero você fora do meu caminho.
Levantei a saia e ajeitei a calcinha, colocando-a em seu devido lugar. Michael colocou as mãos na mesa e soltou um suspiro irritado, sem deixar de me fitar.
- Pode respirar agora – eu disse com um riso no canto da boca. Sua expressão deixava claro o quanto ele estava perturbado com meu comportamento. Desci os olhos para sua ereção e levantei uma das sobrancelhas: – Não tente esconder o que sente por mim. Sei que você me deseja. Está... tão... nítido.
Michael deu de ombros despreocupadamente, como se não desse a mínima para minhas palavras.
- Não posso ficar indiferente a uma mulher abrindo as pernas na minha mesa, por mais que ela seja uma louca – justificou. - Eu poderia partir sua calcinha em duas e fazê-la gemer meu nome em trinta tons diferentes.
Minhas mãos tremularam. O filho da mãe gostava de provocar.
- O que o impede, Jackson? – perguntei em tom de desafio.
Ele inclinou-se na minha direção, deixando sua boca a poucos centímetros da minha. Pude sentir o hálito quente roçando meus lábios enquanto ele respirava.
- Se eu fizesse isso, estaria agindo como um animal incapaz de refrear seus impulsos – disse fitando meus olhos. - Depois de alguns minutos, o que me restaria? Meu corpo estaria satisfeito e você, Therese Brown, teria sido apenas mais uma transa rápida e insignificante. Não estou disposto a jogar meu casamento no lixo por algo tão medíocre. Você não vale tanto.
Ergui as mãos e bati palmas lentamente. Os olhos de Michael se estreitaram.
- Um discuso tão moralista... – eu disse, com um sorriso nos lábios. – Eu deveria me sentir comovida ou ofendida com suas palavras?
- Deveria se sentir uma dissimulada – ele respondeu. – É o que você é.
Fiz um meneio com a cabeça, afastando-me dele. Coloquei as mãos na mesa e o fitei.
- Não tente enganar a si mesmo. Por favor, não tente. Pode até estar sendo divertido brincar de pai dedicado e marido exemplar, mas conhecemos bem a sua natureza. Você gosta de perigo e adrenalina, Michael Jackson. Sabemos que não há ninguém melhor do que eu para lhe oferecer os dois.
Ele levantou as sobrancelhas, cheio de determinação.
- Recuso a sua oferta. 
- Não pense que conseguirá fugir de mim – murmurei e dei uma piscadela. – Eu lhe darei tempo, mas não lhe darei alternativa. Espero que você se lembre de usar toda essa firmeza quando estiver de volta a minha cama. Você sabe que eu aprecio muito isso.
Michael estreitou os olhos, cheio de irritação, e me observou ir na direção na porta, sem dizer mais uma palavra. Ele continuava gostoso e explosivo, da forma como eu sempre admirara. Reencontrá-lo me fez muito bem; e eu sabia que muitas outras oportunidades para vê-lo se seguiriam em breve. 
Tínhamos, sim, muitos assuntos pendentes e importantes para tratar. Eu já podia contabilizar mentalmente quantas noites ele ficaria sem dormir, de olhos vidrados, andando de um lado para o outro em sua casa, esmurrando as paredes e bradando palavrões. Sua cama e seu travesseiro se tornariam seus piores inimigos. E eu estava absolutamente satisfeita por saber disso.


Capítulo 7

Melodie já estava na cama quando Michael retornou do escritório, tarde da noite. Ele retirou o paletó, desafrouxou a gravata, tirou os sapatos e aproximou-se da cama a passos lentos, evitando fazer barulho para não acordá-la. Melodie era uma mulher maravilhosa, e a cada dia tinha mais certeza disso. Ela lhe dera Blanket, lhe ajudara a crescer ainda mais profissionalmente, lhe dera amor, carinho, tudo o que um homem poderia desejar para si. Não conseguia entender por que diabos Therese Brown ainda era capaz de mexer tanto com ele. Ela colocara a vida de seu filho em risco e, no passado, dera provas mais do que suficientes de que era absolutamente doente mentalmente. Therese poderia tê-lo matado, e quase o fez, em mais de uma oportunidade. Deveria odiá-la. Odiá-la com todas as suas forças. Mas apesar de tudo, sentia-se inexplicavelmente ligado àquela mulher. Ela emanava perigo e isso o excitava. Sabia que deveria mantê-la longe, mas uma parte de si – uma parte idiota e inconsequente – gostara de saber que ela estava de volta.
- Você demorou – Melodie disse abrindo os olhos. 
- Eu te acordei? – ele perguntou e deitou-se ao seu lado. 
- Eu não estava dormindo – a mulher respondeu e repousou um beijo em seu queixo. – Como foi o trabalho?
“Mais movimentado do que o habitual”, Michael pensou, mas não ousou tocar no assunto. “Therese subiu na minha mesa e se masturbou com o cano da minha arma.”
- O de sempre – ele respondeu. – E no hospital?
- Nada de novo – murmurou e riu. – Apenas uns braços quebrados, umas costelas fraturadas, nada de bom, nem de interessante.
Melodie pegou um dos braços de Michael e o enlaçou em seu quadril, aconchegando-se contra ele. Deveriam se abraçar e dormir, mas Michael estava excitado demais para simplesmente pegar no sono. Inspirou o aroma dos cabelos fartos e escuros da esposa e, insensatamente, sentiu o cheiro que Therese espalhara pelo ar quando entrou à tarde em sua sala. Passou os dedos pela alça da camisola dela e beijou seus ombros, fazendo-a gemer baixinho em aprovação. Puxou-a para si e olhou em seus olhos escuros, enxergando dentro deles os olhos astutos e enigmáticos de Therese Brown. Precisava possuí-la. Deus... enlouqueceria se não a fizesse ser sua outra vez. Beijou seus lábios com sede e rasgou a fina camisola de rendas na pressa de atirá-la para longe do seu corpo. Livrou-se da própria calça e, sem parar de beijá-la, enfiou as mãos em seus cabelos e os puxou com força, fazendo a mulher gemer e arfar em sua boca.
Apertou seus seios, sem delicadeza, deixando pela pele as marcas de seus dedos fortes, ágeis e desejosos. Desceu a boca pelo pescoço, mordendo-a por todo o caminho, e usou-a acompanhada pelos dentes para chupar e acariciar os mamilos enrijecidos. Colocou um deles na boca, sugando-o com avidez, e Melodie apertou os olhos por puro deleite.
- Delícia, Michael. Mais... – ela gemeu, e em sua cabeça preenchida por Therese Brown ouviu: “Delícia, Jackson. Mais...” 
A excitação era tão grande que já não conseguia controlá-la. Virou a mulher de costas e, com as mãos bem agarradas aos seus cabelos, colocou-a de quatro e a penetrou até o fundo de uma só vez. Ela gritou e agarrou-se à cabeceira, movendo-se em seu ritmo e pedindo por mais. Michael moveu-se com força e vigor, apertando os cabelos dela em suas mãos e puxando-a para trás para beijar-lhe a boca com pressa e desejo. O orgasmo de Melodie foi tão intenso que seu corpo inteiro pulsou e tremeu, comprimindo-se contra o de Michael. Ele arremeteu mais algumas vezes contra ela e também se deixou levar ao clímax, gemendo e rosnando em seu ouvido. Preencheu-a com seu prazer e caiu sobre a cama, suado e ofegante, mas não completamente satisfeito. Faltava alguma coisa ali. Faltava Therese. Faltava a porra da desequilibrada da Therese. 
- De volta aos velhos tempos – Melodie comentou e sorriu, relembrando a forma apressada e cheia de paixão que se amavam assim que se casaram. – Você, meu amor, é maravilhoso.
Ele a beijou, com calma dessa vez, e não teve coragem de fitar seus olhos quando o beijo foi interrompido.
- Você é maravilhosa – ele disse, e aquilo era verdade. Melodie era uma mulher incrível em todos os aspectos. Era sua mulher, sua companheira. Era aquela com quem prometera dividir todas as alegrias e tristezas durante o resto de sua vida.
Enlaçou as mãos em torno da esposa e repousou a cabeça em seu pescoço, perguntando-se em que espécie de filho da mãe havia se tornado. Não deveria desejar outra mulher. Não deveria fazer sexo pensando em outra mulher. Mas a cada vez que fechava os olhos pensava em Therese; e naquela noite, o calor do corpo dela era tudo o que queria sentir. 

 
* * * * *


O jantar com Christopher na noite seguinte não foi tão ruim quanto eu imaginava. Passamos a maior parte do tempo calados, o que era ótimo, pois dessa forma não havia espaço para que ele fizesse aquelas suas piadinhas pouco interessantes. Jantamos, bebemos, bebemos mais um pouco... e mais um pouco, até que decidimos fechar a noite em um hotel. O tira realmente achou que eu estava interessada nele, o que provava definitivamente o quanto ele era idiota. Quando ao nosso destino final ele estava tão bêbado que nem precisei fazer muito esforço para evitar que suas mãos encontrassem as minhas roupas. Entre algumas massagens no ombro e mais copos de whisky duplo, o agente começou a dizer ainda mais besteiras, mas consegui descobrir algumas coisas importantes e úteis, que poderiam ser usadas a meu favor.
- Festa? – perguntei e tirei sua jaqueta, apertando seus ombros com delicadeza. Estávamos sentados na cama do hotel, e o cheiro de bebida que vinha dele estava começando a me nausear. – E o Michael também vai?
Ele fechou os olhos, satisfeito com o toque suave das minhas mãos. Por um momento pensei que tivesse dormido sentado, mas quando balancei seu braço, ele voltou a abrir os olhos.
- Hã? – perguntou.
- O Michael também vai? – repeti, reunindo todo o meu estoque de boa educação e paciência.
- Vai – ele confirmou, de olhos quase fechados outra vez. – No sábado. Uma despedida de solteiro. 
- E quem vai se casar? – continuei, porque todos os detalhes eram importantes.
- Lee, aquele cachorrão velho. Ele é meu parceiro. Vai se casar no domingo e estamos organizando uma festinha para que ele possa se divertir.
- Beba mais, agente – incitei com a voz suave e enchi um pouco mais o copo dele. – Será uma festa só para homens?
- Eu não estou em serviço, Tess – reclamou com a voz quase falha. – Me chame de Chris.
- Tudo bem, Chris – disse e abri meu melhor sorriso. – A festa é só para homens?
- Sim, sim. As únicas mulheres lá serão as strippers – murmurou e sorriu. – E as esposas dos convidados, com os advogados e os pedidos de divórcio, se desconfiarem do que seus maridos estarão fazendo. 
- O Michael disse a verdade para a Melodie? – questionei.
- Ela sabe que é uma despedida de solteiro – Christopher respondeu e colocou o copo na mesa de cabeceira. - E sabe que apesar do ambiente, ele não irá traí-la. 
Revirei os olhos. Pelo visto Michael também estava fazendo o papel do marido dedicado e fiel.
- Como ela pode ter tanta certeza?
- Michael a ama e ela é completamente segura disso – murmurou e repousou as costas na cama, me puxando pelos pulsos. - Agora vem aqui, gracinha. Ainda estamos com roupa demais, Therese Black. Grey. Brown?
Saltei da cama e peguei o copo dele, enchendo-o novamente até a borda.
- Onde vai ser a festa?
Ele se apoiou nos cotovelos e semicerrou os olhos pequenos e vermelhos.
- O quê?
- Onde vai ser?
- A festa? – indagou.
- Sim, a maldita festa! – murmurei sem nenhuma paciência.
- Em um bar na Seven Road. “Pepper alguma coisa”. – Esticou o braço e me puxou debilmente, sem conseguir colocar força nos pulsos. - Vem aqui.
- Só depois que você esvaziar esse copo – eu disse, entregando o copo para ele novamente. – Pagamos muito caro por essa garrafa. – Ele revirou os olhos e entornou o líquido novamente, devagar, empurrando tudo com dificuldade. – Isso, Chris, não desperdice... – incentivei com minha voz mais doce e persuasiva, fazendo-o secar completamente o copo.
Christopher sorriu para mim e, ao esticar os braços para me agarrar, caiu para trás novamente, espatifando-se pesadamente sobre a cama de olhos fechados. O coitado estava tão bêbado que só acordaria na manhã seguinte, sozinho na cama de hotel, com uma terrível ressaca de brinde. Após tirar toda sua roupa, procurei uma caneta e um pedaço de papel na mesa-de-cabeceira e deixei para ele o seguinte recado:

“Não se sinta mal quando acordar, Chris. O que aconteceu (ou seria o que não aconteceu?) é absolutamente normal. Não precisa me ligar para dizer que isso nunca tinha acontecido antes, tá? (Ah... As pílulas azuis podem se tornar suas melhores e mais fiéis amiguinhas). Fique bem. Therese. 

Era melhor fazê-lo acreditar que, apesar da nossa tentativa, ele não havia conseguido uma maldita ereção. Aquele bilhete iria passar como um trator por cima do seu ego masculino; e essa seria uma mentirinha cruel e absolutamente divertida. Coloquei o papel em cima do travesseiro, cuidadosamente dobrado, e em seguida dei o fora dali, rindo comigo mesma e assobiando baixinho. 

Capítulo 8
 Dar um jeito de participar da festinha masculina no sábado à noite foi mais fácil do que imaginei. Com cinquenta dólares, um sorriso persuasivo, as pernas de fora e um decote profundo, o dono do bar me deixou entrar no estabelecimento sem fazer nenhuma pergunta. Consegui me infiltrar no pequeno grupo de strippers e e garanti livre acesso ao bar durante toda a despedida de solteiro. Com a música, a pouca luz e o clima de descontração, ninguém se daria conta de que eu não deveria estar ali. Logo pude ver o grupo enstusiasmado de homens bebendo e gritando pelas garotas, pedindo que elas começassem logo a tirar as roupas. Um cara com traços orientais estava no centro do palco improvisado, com as bochechas demasiadamente coradas e um ar de acanhamento, sendo apalpado por duas jovens garotas seminuas. Quando ouvi Christopher atirar um sutiã em sua direção e chamá-lo de “Lee“, deduzi que ele era o noivo.
Levei algum tempo para identificar Michael naquela pequena multidão que cheirava a álcool e testosterona. Ele estava lindo, absolutamente lindo. Vestia calça preta e camisa vermelha de botões, além de uma escura jaqueta de couro que caía no seu corpo maravilhosamente bem. Estava com um copo na mão, sentado com um ar despreocupado, rindo a cada vez que as bochechas do recatado Lee ficavam vermelhas. 
Quando as garotas finalmente terminaram de acariciar o pobre noivo, ele estava trêmulo e tão vermelho quanto uma framboesa madura. As strippers se misturaram pelo grupo de homens, esfregando-se neles e chamando-os para dançar. Michael permaneceu sentado bebendo, e recusou o convite quando uma ruiva de lingerie sorriu e se aproximou. Puxei uma pequena máscara sobre os meus olhos e caminhei em sua direção, com o olhar bem fixo nele. Chegara o momento de fazer o meu convite. E eu não aceitaria uma negativa com resposta.
- Vamos dançar – eu disse mais alto que a música e segurei sua mão.
Ele levantou a cabeça e estreitou os olhos para me observar com mais atenção. A máscara não cobria muita coisa, mas estava escuro suficiente para que ele não me reconhecesse com muita facilidade.
- Não, obrigada – Michael respondeu. – Eu estou bem aqui. 
- Ficará melhor ainda quando estiver na pista de dança – insisti e puxei sua mão mais forte, fazendo-o ficar de pé. Ele colocou o copo em cima do balcão e se deixou guiar por mim. 
- É sério, eu não estou a fim de dançar – murmurou, mas a negativa saiu sem nenhuma firmeza.
Aproximei-me dele e enlacei os braços em seu pescoço, puxando-o para perto de mim. Senti seu perfume e tive que me controlar para não beijá-lo ali, na frente de todo mundo. Sorri para ele e comecei a me mover no ritmo da música, fazendo-o abrir um pequeno sorriso também.
- Está vendo? Eu disse que você ficaria ainda melhor quando estivesse dançando.
Ele apertou as mãos na minha cintura e me acompanhou na dança, movendo-se com extrema habilidade. As outras strippers faziam o mesmo com os outros convidados; a diferença é que os outros homens – com exceção do noivo - estavam apertando suas bundas ou com os rostos enfiados bem no meio dos seus seios.
- Qual é o seu nome? – Michael perguntou. A música estava alta, mas estávamos próximos o suficiente para nos escutarmos sem muita dificuldade.
- Lady Shadow – sussurrei no seu ouvido. – E o seu? Você tem cara de Jackson.
Mesmo com a pouca luz, pude ver um brilho estranho em seus olhos por alguns segundos. Ele me girou devagar em seus braços e sorriu, na certa achando que alguém havia me informado seu nome com antecedência.
- Acertou – ele murmurou. – Sou Michael Jackson. – Girou-me outra vez e parou abruptamente, com o rosto a poucos centímetros do meu. - Qual dos dois mandou você até aqui? O Chris ou o Lee?
- O destino – eu disse e sorri. – Que tal? 
Michael sorriu, divertindo-se a resposta.
- É uma explicação um tanto imprecisa, mas posso aceitá-la - disse e segurou ainda mais forte minha cintura, puxando-me contra ele. Arfei e a música terminou, dando lugar a um som mais lento. Michael passou os dedos pelos meus cabelos e fixou os olhos nos meus por alguns segundos. Tive a impressão de que iria arrancar a minha máscara, mas seus dedos permaneceram imóveis atrás do meu pescoço. – Foi uma ótima dança, Lady Shadow – murmurou e me soltou. – Agora voltarei para meu copo de whisky.
- Posso lhe fazer companhia? – perguntei.
Ele pensou por um instante, depois sorriu.
- Será um prazer.
Caminhamos de volta até o balcão e Michael pediu um copo de bebida para mim também. Sentamos um ao lado do outro e ficamos observando os homens uivarem como lobos no cio e se esfregarem-se nas prostitutas.
- Eles estão se divertindo bastante – eu disse e tomei o primeiro gole.
Michael assentiu e me olhou, erguendo uma das mãos para tocar delicadamente o meu rosto.
- Não vai tirar a máscara?
- Ela faz parte do personagem – respondi e sorri. – Estava incluída quando me contrataram.
- Interessante. O que mais estava incluído no contrato?
Bebi mais um gole e mordi lentamente o canto da boca. Meu Deus. Ele estava facilitando as coisas. Ali, naquele canto escuro do bar, ele voltou a ser o bom e velho Michael Jackson. Aquele que não perde tempo, nunca.
- Disseram que eu devia garantir a diversão dos convidados – murmurei e corri os dedos pelos botões da sua camisa, descendo-os pelo abdômen por cima do pano. – Acho que é minha obrigação deixá-lo tranquilo e relaxado, sabe? Esse tipo de coisa.
Ele me fitou e colocou a mão por cima da minha, apertando-a entre seus dedos. Empurrou-a lentamente para baixo e me fez tocar na sua calça, deixando-me perceber o quanto ele estava duro. Suspirei quando senti sua ereção e ele encostou os lábios no meu pescoço, fazendo um arrepio lento cruzar minha espinha. Pude sentir o enorme contorno do seu sexo na plama da minha mão, e não fiquei alheia a tamanha provocação.
- Pode lidar com isso, Lady Shadow? – perguntou quando seus lábios encostaram no meu ouvido, pressionando minha mão contra seu membro rígido.
- De mil maneiras diferentes – eu disse, excitada, e o apertei de leve.
Michael sorriu e soltou minha mão, levantando-se bruscamente.
- Espere um minuto – disse para mim. – Eu já volto.
Assenti e o observei ir na direção dos outros homens, abrindo espaço pelas garotas quase nuas. Puxou Christopher dos braços de uma morena e falou algo em seu ouvido. Provavelmente estava dando uma desculpa para dar o fora dali.
Terminei de beber o whisky e logo vi Michael voltar a se aproximar. Ele encheu nossos copos mais uma vez e voltou a se sentar ao meu lado. 
- Antes de sairmos, proponho um brinde – Michael disse quando me entregou o copo.
- Ao quê? – perguntei para ele.
- À nossa noite – ele murmurou. – Ao destino. Que tal?
Sorri e inclinei a mão, fazendo nossos copos se tocaram de leve. Levei o copo até a boca e sorvi um grande gole, sentindo o álcool descer como brasa pela garganta. O gosto estava um pouco diferente... ou seria apenas uma impressão?
- Por quê “Lady Shadow”? – Michael perguntou para mim.
Apertei os olhos em sua direção, sentindo um torpor desconfortável tomar conta dos meus sentidos. O whisky era mesmo forte. Forte demais.
- Gosto das sombras – respondi, e percebi que as palavras saiam com dificuldade. – Elas são sorrateiras, são versáteis, e podem... – apertei os olhos antes de continuar - podem assumir a forma que nós desejarmos.
- Oh sim. Sorrateiras como você – Michael disse e segurou a máscara, puxando-a lentamente para baixo. Pensei em impedi-lo, mas meus braços não tinham força nenhuma. – Acreditou mesmo que eu não iria reconhecê-la? Conheço seu corpo, Tess. Conheço seu cheiro. Conheço a forma como você se move. E conheço o toque das suas mãos também.
Mesmo com os sentidos completamente amortecidos, gostei de saber que ele me conhecia assim tão bem.
- O que você colocou na porcaria da bebida? – perguntei com um fio de voz, notando que o mal estar não havia sido causado apenas pelo álcool.
Ele deslizou os dedos pelas minhas bochechas, afastando os cabelos do rosto.
- Quer mesmo saber?
- Diz logo – insisti. 
Michael suspirou e fitou meus olhos. 
- Dois comprimidos de Valium dissolvidos. – Sorriu. – O suficiente para fazer você ficar bastante calminha.
Retorci os lábios, chocada e irritada ao mesmo tempo.
- Não me diga que você anda com essas merdas no bolso – murmurei, vendo o rosto dele multiplicado em dois na minha frente. – Você usa isso para apagar quando a Melodie te enche de tédio?
- Cheia de veneno como sempre – ele murmurou e sorriu outra vez. Estava se divertindo com a situação. - Festas como essa são regadas por todo tipo de coisa, sabia? Alguns desses caras irão tentar fazer o mesmo com essas meninas. É uma das formas de não precisarem pagar a conta amanhã de manhã. 
- Mas o noivo é um policial – consegui dizer, incrédula, me sentindo ainda mais fraca.
- E quem se importa? – Michael disse e deu de ombros. – Eles irão tentar, mas provavelmente nem dará certo. As strippers são espertas demais para se deixarem cair nesse tipo de truque. – Acariciou a minha bochecha com a ponta dos dedos. – São bem mais espertas do que você.
- O que você vai fazer comigo? – perguntei. Ele ficou em silêncio e fiz esforço para encará-lo. 
- Nada demais – murmurou com a voz calma. – Irei deixá-la aqui jogada quando a festa terminar, só isso. Sozinha, no escuro, sem conseguir se levantar. Você gosta mesmo das sombras, Lady Shadow? Haverá muitas ao seu redor daqui a algum tempo.
- Você não pode fazer isso – eu disse, perturbada com a possibilidade de ficar ali naquele estado. – Você não vai fazer isso, Jackson.
- Por que eu não faria?
Estiquei a mão e empurrei seu braço, mas o impacto não teve força nenhuma. Eu o mataria se ele me deixasse no bar. Ele estava gostando de brincar de gato e rato, mas aquele jogo não tinha a mínima graça para mim. Ele não era o dono da situação, e tinha que saber disso de uma vez por todas.
- Porque... porque você não deixaria a mãe do seu filho aqui, drogada e sozinha – murmurei reunindo toda a força que ainda possuia. – Ouviu bem? – Sorri e fechei os olhos. – Ouviu o que eu disse?
As veias na testa de Michael tensionaram e ele me sacudiu, forçando-me a abrir os olhos outra vez.
- O quê? Você não pode estar falando sério – disse com a voz firme.
- Estou, sim – confirmei, e uma nuvem de névoa percorreu meus pensamentos.
Ele me fitou com os olhos nublados e impenetráveis.
- Sobre qual filho você está falando, Therese? – perguntou, pronunciando devagar cada palavra.
- Sobre aquele que você quase matou quando enfiou a porra daquela bala na minha barriga – sussurrei baixinho em um último esforço. O rosto chocado de Michael foi a última coisa que vi, antes de cair em um profundo sono sem sonhos.

Capítulo 9

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Sanatório San Pedro, Glendale, sete anos antes

A noite estava fria e chuvosa quando ela se levantou. O silêncio era quase absoluto, rompido apenas pela sua respiração alta e o som da chuva batendo contra o teto. Começou a andar devagar, com as mãos bem fixas na barriga protuberante, sentindo uma dor lancinante se espalhar pelas costas e pelo ventre. Respirou fundo, puxando o máximo de ar, e percebeu que as contrações não duravam mais do que cinco segundos, em um espaçamento de trinta segundos entre uma e outra. Tateou a parede e segurou a maçaneta, atravessando a passos lentos o corredor sem iluminação. Não poderia fazer barulho, mas estava cada vez mais difícil segurar a dor calada. Vez ou outra o clarão de um relâmpago jogava luz para dentro através das janelas engradeadas, mostrando o caminho que ela deveria percorrer. 
- Oh meu Deus – alguém murmurou baixinho, fazendo-a estacar no corredor. – Maria Anna, aonde você está indo? Sua cama está ensopada! Não me diga que o bebê já vai...
Therese olhou para trás e viu sua companheira de quarto parada no batente da porta.
- Isso é assunto meu, Lorna – respondeu com rispidez, fazendo muito esforço para falar. – Fique aí. Não venha atrás de mim.
- Só quando você me disser para onde está indo – insistiu, caminhando até ela. 
- Volta para o quarto – ordenou, encarando-a com os olhos mais ameaçadores que a interna já vira. – Saia daqui! Agora.
A interna pensou por alguns segundos, apreensiva, e então entrou novamente no quarto e encostou a porta, assustada demais para tentar chamar algumas das freiras. Therese continuou a caminhar, agarrada nas paredes, sentindo a dor aumentar cada vez mais; arfando e dizendo para si mesma que não se permitiria ser interrompida por mais nada e nem ninguém. 

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Acordei na minha cama, vestida com as roupas da noite anterior, com uma terrível confusão mental e uma dor lacinante do lado esquerdo da cabeça. O relógio na mesa de cabeceira marcava 3:49 da manhã. 3:49! Aquela maldita dose cavalar de Valium poderia me fazer dormir até a manhã seguinte, mas sempre tive um organismo desobediente para os remédios. Fiz força para apoiar as costas na cabeceira e senti uma mão pesada tocar meus ombros de repente, obrigando-me a permanecer deitada.
- Não. Você não vai se levantar – ouvi uma voz de homem dizer em tom ríspido, e logo o rosto de Michael se materializou na minha frente. – Você não vai fazer nada, absolutamente nada, antes de me explicar aquilo que disse no bar, entendeu?
Revirei os olhos e afundei a cabeça no travesseiro, relembrando toda aquela história de Lady Shadow na despedida de solteiro. Michael deveria estar puto da vida com meu corportamento. E maldição, ele ficava sexy demais quando estava bravo. Eu não tinha forças nenhuma para lidar com aquilo. Era absolutamente excitante para mim.
- Pode me explicar como eu vim parar aqui? – perguntei, mas só por ironia. Certamente ele encontrara minhas chaves dentro do carro e me trouxera de volta para casa. – Pensei que você tinha dito que me deixaria lá naquele bar. Jogada, sozinha, sem forças nem para me mover. Lembra-se de ter dito que faria isso?
Ele franziu os lábios. Sua expressão irritada deixava transparecer alguma preocupação.
- Diga que aquela história de filho foi um efeito colateral do remédio. 
Eu sorri para ele. 
- E se não tiver sido?
- Isso não é uma resposta – ele murmurou com a voz firme. – Quero a verdade. Seja franca, Therese, uma vez na porra da sua vida.
- Você mesmo disse que eu sou uma criatura deplorável – relembrei, sentando-me na cama, ainda um pouco grogue e sem foco. – Sou um ser vil, medíocre e detestável, não sou? É isso o que você pensa de mim, então pare de esperar que eu seja franca com você.
Os punhos de Michael se cerraram e as veias de sua testa pareceram adquirir vida própria.
- Precisamos ter uma conversa séria – resmungou de má vontade. – Você disse que a Melodie não foi a única mulher que eu engravidei. Sobre o quê você estava falando?
Fitei firmemente seus olhos, cheia de segurança e determinação, apesar de ainda ter aquela merda dopante correndo nas veias.
- Você pensa que vai ser assim tão fácil saber dessa história? – Sorri com sarcasmo. – A vantagem aqui é minha, Michael. Eu sou a única pessoa que posso lhe dar as respostas, então é melhor você engolir a droga do seu orgulho e admitir que precisa de mim.
Ele arqueou as sobrancelhas.
- O que você quer? – perguntou.
- Você – foi a minha resposta. – Eu quero você.
- Esquece – disse balançando a cabeça negativamente. - Não há a mínima possibilidade de...
- Claro que há – interrompi. – Esse é o preço das respostas que você tanto quer. Quero você, Michael, e em cada noite que você ficar comigo, posso lhe revelar uma parte da história
- Você é louca - ele disse me fitando. - Completamente insana. Não é tão simples assim. Eu tenho a Melodie.
Revirei os olhos. Aquele papo estava começando a fazer minha cabeça doer ainda mais.
- Claro, sempre a Melodie – murmurei com um suspiro de tédio. Fitei seus olhos e arranquei os sapatos que ele nem se dera ao trabalho de retirar dos meus pés ao me colocar na cama. - Quer saber de uma, Michael Jackson? Eu não dou a mínima. De verdade, eu não dou a mínima. Eu já odiei a enfermeirinha, da mesma forma que já odiei você por se importar tanto com ela, mas hoje simplesmente não me importa mais. Se você quer fazer o papel ridículo de marido modelo, o problema é seu, apenas seu. Contanto que você pague o preço que eu estou pedindo, a cadelinha domesticada da sua esposa não precisa ficar sabendo de nada. 
Sua expressão continuava impassível. Era uma troca justa, mas ele parecia não concordar com isso.
- Eu não vou trair a Melodie.
- Não? Ótimo, então. Não lhe contarei absolutamente nada. – Joguei os sapatos no chão. - E não pense que irá descobrir de outra forma. Pode ir no sanatório, fuçar o quanto quiser. Eles não lhe darão informação alguma.
Ele ficou em silêncio por alguns segundos, provavelmente colocando os prós e os contras na balança. 
- Você acha mesmo que pode comprar amor, Therese? – eu o ouvi perguntar, estreitando os olhos para mim.
- Não, claro que não. Eu teria comprado o amor do meu pai, se pudesse. – Dei de ombros. – Mas posso comprar um pouco de sexo, já que você está resistindo tanto em fazê-lo por conta própria.
- Procure outro para satisfazer a porra do seu ego, então. Eu não vou compactuar com suas insanidades.
Eu sorri, vendo a culpa encurralá-lo. Aquele papel de homem correto não combinava com ele. Não que ele fosse um canalha, mas priorizar sua fidelidade naquele momento não era nada inteligente. Seu casamento podia significar muito; mas um filho desconhecido perdido em algum lugar do mundo significava ainda mais.
- Oh... você está parecendo um garoto inocente. Sem essa, está bem? Eu sei muito bem que você também está a fim de matar a saudade. Tente se convencer de que é por uma causa nobre. Talvez isso faça você se sentir menos culpado.
O bipe baixo do relógio na mesa de cabeceira preencheu o silêncio por um momento. 4:00. Michael pegou a jaqueta na poltrona da penteadeira e a jogou por cima dos ombros.
- Eu vou embora – anunciou, como se o bipe tivesse lhe trazido para o mundo real; aquele mundo em que ele era pai, marido, e tinha hora para chegar em casa. - Mas essa conversa não terminou.
- Claro que não – concordei. – Nós podemos continuar essa conversa hoje à noite. Eu irei esperar por você às sete, certo? E é melhor você aparecer.
Michael me fitou uma última vez e caminhou até a porta, com passos firmes e expressão irritada. Não ouvi uma afirmação dos seus lábios; mas eu tinha certeza de que ele estaria de volta ao apartamento antes mesmo da hora marcada. 

Capítulo 10

A residência estava completamente escura e silenciosa quando Michael pegou as chaves e destrancou a porta. Colocou-se para dentro, evitando ao máximo fazer barulho, e seguiu para o quarto, onde viu Melodie deitada, dormindo pesadamente. Aquela havia sido uma noite infernal. Absolutamente infernal. Therese Brown sentira um prazer sádico em esfacelar sua tranquilidade. Que porra de história maluca era aquela sobre gravidez?
Não poderia tê-la engravidado. Quer dizer, biologicamente era absolutamente possível, mas não poderia tê-la engravidado. O destino não tinha o direito de ser tão cruel assim. Um filho era algo maravilhoso, mas não em tais circunstâncias, não com uma mulher doente e desequilibrada como Therese. Tinha quase certeza de que aquilo era uma mentira para manipulá-lo, uma invenção para submetê-lo a fazer qualquer coisa que ela quisesse, mais uma de suas tantas e tantas loucuras. O currículo de insanidades daquela mulher era bastante longo; e ele sabia que não podia confiar em nenhuma sequer das palavras que saíam da sua boca.
Michael caminhou de volta até a sala e jogou a jaqueta sobre o sofá, tomado por uma confusão mental que fazia as veias vibrarem em sua testa como se estivessem decididas a estourar e saltar dali. Serviu-se de uma generosa dose de whisky e se sentou entre as almofadas, forçando o álcool a descer sem interrupções pela garganta. Sentia vontade de voltar ao apartamento de Therese e esganá-la até que ela cuspisse de uma vez toda a verdade; mas conhecendo-a da forma como conhecia, sabia que o mais provável é que a filha de uma mãe tivesse um orgasmo por ter suas mãos bem firmes em torno do seu pescoço. Louca. Mil vezes louca! Aquele se tornara um jogo absolutamente excitante para ela, e nada a pararia. 
Recostou-se no braço do sofá e amaldiçoou a si mesmo por ter se envolvido com aquela mulher. Ela nunca o deixaria em paz, nunca. Estaria sempre por perto, rondando e sondando, mentindo e confabulando, fazendo de tudo para deixá-lo maluco. E ela estava conseguindo. A maldita o excitava. Deus... o excitava muito. Não sabia ao certo se esse sentimento era causado pelo ar misterioso, pela iminência de perigo, ou se pelo fato de saber o quanto e o quão intensamente ela o desejava. Ele estava mesmo ficando louco, definitivamente. Entraria naquele jogo perverso? Não deveria, claro que não. Mas uma centelha de curiosidade o instigava, incitando-o a se deixar levar.
Levantou-se e encheu o copo com whisky outra vez, relembrando a proposta que Therese lhe fizera. Levá-la para a cama, mesmo em tais circunstâncias, era o que mais queria desde o episódio em sua mesa. Queria a boca dela sobre a sua, as unhas ágeis apertando suas costas, a voz sussurrando em seu ouvido, as pernas abrindo-se para recebê-lo... 
Céus, o que diabos estava dizendo? Tinha uma mulher e um filho dormindo no andar de cima; e desta vez não colocaria apenas a si mesmo em situação de risco. Deveria proteger sua família, afastar Therese o mais rápido possível e em definitivo; esse era seu dever como pai, marido e homem de princípios. 
Mas a possibilidade de ter um filho desconhecido o desestabilizou por completo. Sabia que precisava de Therese. Sua angústia só seria amenizada quando descobrisse exatamente o que aconteceu naquela clínica, sete anos atrás. 
Deveria ter medo da resposta? 
Sua intuição estava gritando a plenos pulmões que sim.
* * * * *

Melodie viera até o sofá assim que o dia começara a amanhecer. Estava vestida com um robe preto, com os olhos injetados de sono, e cruzou os braços assim que viu Michael deitado entre as almofadas, ainda vestido com a roupa da festa, com uma garrafa de whisky quase vazia repousada no tapete.
- Por que você não subiu? – perguntou para ele.
Michael a fitou com olhos inexpressivos. Sentia as pálpebras pesadas, mas não conseguira dormir um minuto sequer. Nem sequer o álcool fora capaz de fazê-lo cair no sono.
- Eu não queria acordar você – respondeu, sentando-se no sofá e abrindo espaço para que ela também pudesse se acomodar. – Acabei chegando tarde e fiquei aqui bebendo um pouco.
Melodie o observou, perguntando-se o que acontecera. Os cabelos dele estavam revoltos, a camisa amassada com três botões abertos, e os olhos que a fitavam estavam nublados e insondáveis.
- Você está péssimo, Michael – murmurou, sabendo que algo o estava incomodando. – Vai me contar o que aconteceu?
Ele repousou a cabeça no sofá e fechou os olhos.
- Não.
Melodie comprimiu os lábios e arqueou as sobrancelhas. Percebeu que algo o perturbava, e o conhecia o suficientemente bem para saber que, fosse o que fosse, ele não estava disposto a dividir com ela naquele momento. Era um direito dele, não era? Mas após uma noite fora de casa, curtindo com os amigos enquanto ela dormia, achou que contar o motivo que o levara àquele estado era o mínimo que Michael poderia fazer.
- Ok – ela disse com certa irritação e levantou-se, dando de ombros em seguida. Pegou a garrafa de whisky e a balançou, disposta a não deixá-lo se entupir com mais algumas doses em pleno domingo de manhã. – Eu fico com isso.
Michael soltou um suspiro de frustração, sem saber o que fazer. Droga. Como poderia deixá-la alheia a tudo o que estava acontecendo?
- Melodie... – Michael disse segurando uma de suas mãos, fazendo-a olhar para ele. Sabia que ela estava preocupada, mas não podia simplesmente bombardeá-la com a hipótese levantada pelas palavras de Therese algumas horas antes. – Desculpe, baby. O dia mal começou e não estou em um momento bom. Conversamos depois, tudo bem?
Melodie Jackson assentiu, com a expressão fechada e pensativa. Seu marido estava nitidamente fora dos eixos; e ela não precisava de confirmação alguma para saber que Therese Brown tinha alguma coisa a ver com aquilo.
* * * * *

Estava decidido. Michael iria em busca das respostas de que tanto precisava. Ainda estava convencido de que Therese mentira, ou que estava tendo devaneios por conta do maldito Valium que ele lhe dera, mas ela conseguira plantar em sua cabeça a maldita semente da dúvida. Passara o resto da madrugada em claro, pensando em todas as possibilidades, e agora a angústia se transformara em um terrível sentimento de impotência. Therese dissera que ninguém na clínica lhe daria informações, e ele sabia que todos os dados sobre os pacientes eram confidenciais, mas uma ligação para o sanatório San Pedro seria seu ponto de partida. Talvez conseguisse descobrir alguma coisa... Um mínimo detalhe que pudesse lhe fornecer alguma pista.
Recostou-se na confortável poltrona do seu escritório residencial e teclou os números no telefone, notando que suas mãos estavam mais trêmulas do que gostaria. O ar estava pesado e bastante escasso; mas fez o possível para ignorá-lo.
- Orfanato San Pedro – uma voz de mulher disse quando a ligação foi atendida.
- Boa tarde – murmurou, procurando as palavras certas para começar. Colher informações era um de seus deveres como advogado, e fazia aquilo com astúcia e experiência, mas o fato de estar sondado sobre um assunto que lhe afetava tão diretamente estava fazendo as palavras agarrarem-se à parede interna da garganta. – Estou precisando checar algumas informações sobre uma ex-paciente, e gostaria de saber se posso falar com alguém da direção.
- Quem deseja? – a voz perguntou.
- Michael Jackson – respondeu simplesmente, sem mais referências. Sabia que qualquer pessoa do outro lado da linha reconheceria o seu nome.
- Michael Jackson. O advogado? 
- Sim, isso mesmo – confirmou.
- Irei conferir a disponibilidade da Madre Superiora, e se ela puder lhe atender, sua ligação será transferida. 
- Ok.
Os minutos que se seguiram pareceram durar uma eternidade. Michael passou o tempo praguejando pela demora e usando o bocal de uma caneta para fazer perfurações em uma folha inútil que estava em cima da mesa.
- Doutor Jackson? – ouviu uma voz feminina grave e firme murmurar, recobrando sua atenção. – Sou a diretora do internato, madre Katherine Melburn. Em que posso ajudá-lo?
- Boa tarde, madre Melburn – Michael murmurou, jogando o bocal da caneta em um canto qualquer da mesa, esforçando-se para parecer calmo e relaxado. – Eu gostaria de conversar com a senhora sobre Therese Brown, uma de suas ex-pacientes. Ela foi internada em 1996 e recebeu alta dias atrás. Recorda-se dela?
Um silêncio se fez do outro lado da linha; e por um momento Michael pensou que a madre havia desligado na sua cara.
- Sim, sim, eu me recordo, claro. Sei de quem está falando. Você está representando a senhorita Brown?
Michael pensou por um instante, bastante tentado a confirmar aquele engano. Se mentisse e se portasse como um profissional, as chances de descobrir algo seriam maiores.
- Sim, madre. Preciso de uma cópia do relatório com o progresso clínico da senhorita Brown. Sou o representante legal dela e...
- Doutor, veja bem, não estou autorizada a fornecê-lo arquivo algum – a madre interrompeu. - Se quiser informações sobre a sua cliente, faça um requerimento legal e recolha tudo nos autos do processo. Agora, se me permite, estou bastante ocupada, tenho que desligar.
- Madre Melburn...
- Não estou autorizada a lhe fornecer arquivo nenhum, informação alguma, e, por favor, não insista – disse rispidamente. - Tenha uma boa tarde, doutor. 
Michael recostou as costas na cadeira, incrédulo, e ouviu a ligação ser bruscamente interrompida. Que porra era aquela? Ou a madre também não estava em um dia bom... ou tinha algum motivo para ficar nervosa e perturbada. Colocou o telefone de volta no gancho e deu um murro na mesa, fazendo os papéis saltarem e as canetas tremularem. O que diabos faria agora? 
Cerrou os punhos e lembrou-se do brilho que vira nos olhos de Therese enquanto ela murmurava: “Eu sou a única pessoa que posso lhe dar as respostas, então é melhor você engolir a droga do seu orgulho e admitir que precisa de mim.”
Suas veias tensionaram quando a decisão foi tomada. Engolir seu próprio orgulho seria algo demasiadamente indigesto: mas naquele momento não conseguia enxergar outra alternativa.

Capítulo 11

Ouvi a campanhia soar antes da sete da noite. Passei em frente ao espelho para ajeitar os cabelos e retoquei o batom vermelho escuro dos lábios. O som da campanhia invadiu o apartamento outra vez e eu sorri para meu reflexo, passando as mãos pela cintura para moldar melhor o curto vestido preto ao corpo. Quando ouvi o som pela terceira vez, mostrando certa impaciência, caminhei calmamente até a porta e a abri, com um sorriso de pura satisfação no rosto.
Michael estava parado do outro lado; de cabelos soltos, terno e gravata, esperando por mim com uma cara irresistível de poucos amigos. Sua pressa deixava evidente que ele estava sendo corroído pela curiosidade, e decidi que iria elucidá-la por partes, lentamente, obrigando-o a se encontrar comigo quantas vezes eu achasse necessário. Desci os olhos pelo seu terno bem alinhado e tive certeza absoluta de que ele dissera a Melodie que passaria a noite de domingo em um tedioso jantar de negócios. Bom... se essa foi mesmo a desculpa, Michael não mentira por completo para sua digníssima esposa Sem Sal e Sem Açúcar. Ele realmente estava no meu apartamento para cuidar de interesses importantes... e eu seria a comida mais apetitosa do menu.
- Jackson, que bom te ver aqui – eu disse com meu tom de voz mais dissimulado e sorri, como se estivesse surpresa por vê-lo parado na minha porta. - Qual foi a desculpa que você deu para a Melodie? 
Ele me encarou com firmeza.
- Não é da sua conta.
Gargalhei, abrindo espaço para que ele pudesse entrar. 
- Você deveria me contar – insisti, vendo-o passar por mim com passos rápidos, deixando-me sozinha na soleira da porta. – Saber que você anda enganando aquela sonsa me deixa muito excitada.
Michael parou diante de mim e arqueou as sobrancelhas. Falar na sua mulher o deixava culpado e irritado; e eu simplesmente adorava essa combinação de sentimentos.
- Não toque no nome dela, Therese – ele disse com a voz firme. – Não permitirei que você a tripudie. Estou aqui, não estou? O que eu disse ou deixei de dizer para a Melodie não lhe interessa.
Fechei a porta e caminhei até ele, mordendo o canto da boca enquanto o observava. Corri os olhos pela seu corpo esguio e soltei um suspiro de aprovação. A elegância inata daquele homem ainda tinha o poder de me deixar impressionada.
- Tudo isso para mim? – perguntei e toquei a ponta da sua gravata azul, puxando-a lentamente. – Eu não sabia que merecia tanto. Você está simplesmente maravilhoso.
Ele cobriu minha mão com seus dedos e me fez soltar a gravata. 
- Sem rodeios, está bem? – murmurou, fitando-me com a expressão séria e fechada. – Você abre logo suas pernas, me recebe dentro de você, goza uma ou duas vezes... e depois me conta de uma vez por todas o que aconteceu naquele maldito internato.
Eu sorri e levantei uma das sobrancelhas, com os olhos perdidos dentro dos seus. Ele não queria dar o braço a torcer, mas eu sabia que ele estava contente em me ter ali, tantos anos depois, cheia de desejo por ele. Dei um passo para frente e me inclinei diante do seu rosto, deixando nossos lábios a apenas alguns centímetros de distância um do outro. Seu cheiro era inebriante, e precisei de certo esforço para formular bem as palavras.
- Tão simples assim? – murmurei e toquei sua gravata novamente, brincando despreocupadamente com o nó. Aquele ar superior realmente me tirava do sério. - Fiquei sete anos sem ver a sua cara, Michael. Tenha certeza de que gozar uma ou duas vezes será apenas o começo, o pré-aquecimento da nossa transa. – Deslizei o polegar pelo seu lábio inferior, traçando devagar o contorno da sua boca. - E coloque um sorriso sacana nesse belo rosto, porque eu sei que me foder não será sacrifício algum. Você quer isso tanto quanto eu. – Abri um sorriso e encostei a boca na dele, dando uma mordida de leve em seus lábios fechados. – Hm. Mal posso esperar para sentir o gosto da sua boca novamente.
Suas mãos se firmaram em torno dos meus pulsos e ele me afastou, caminhando lentamente até o sofá. Percebi que se ele não se afastasse, não conseguiria se controlar, e acabaria me agarrando mais rápido do que gostaria.
- O que você quer beber? – perguntei para ele, indo até o bar. – Whisky ainda é o seu preferido?
Como não obtive resposta, preenchi dois copos com whisky e coloquei duas pedras de gelo em cada.
- Aqui está – eu disse e estiquei o copo para ele, sentando-me ao seu lado no sofá. Apesar de contrariado, Michael aceitou o copo, sem fazer comentário algum. Cruzei as pernas e bebi um gole. – Não fique assim tão calado, baby. Facilite as coisas. Nós não somos dois inimigos.
Michael bebeu o primeiro gole, de olhos fixos no meu vestido. Era curto o suficiente para deixá-lo perturbado; e foi justamente com essa intenção que fiz a minha escolha. 
- E também não somos dois amigos.
Ignorei o tom sarcástico da sua voz.
- Claro que não. – Sorri e estiquei uma das mãos, passando-a por sua coxa – Acho que somos dois amantes.
Ele desceu os olhos até minha mão, mas não a afastou de lá.
- Quando você irá me contar sobre aquela suposta gravidez?
Estreitei os olhos com diversão.
Suposta? – murmurei e parei de mover a mão. - Você acha que eu estava mentindo quando disse aquilo?
- Eu não sei, Therese – disse e me fitou. – Eu não sei de porra nenhuma. Você está se divertindo muito com isso tudo, não está?
Assenti e bebi mais um gole. Claro que eu estava!
- Sim, eu estou – admiti. – A Madre Melburn foi muito grossa com você?
Um vinco se formou em sua testa e seus olhos semicerraram.
- Como você...
- Estava óbvio que você iria ligar para lá – interrompi. – Aquela velha nojenta é uma megera. Você poderia ter evitado esse aborrecimento. Eu avisei que não lhe dariam nenhuma informação.
- Eu preciso da verdade – ele disse, e quase me comoveu. Eu sabia o quanto aquela história o estava preocupando. – Mas não posso confiar em você. Quero provas, provas incontestáveis.
- Ok, senhor advogado, eu lhe darei quantas provas você quiser – murmurei sorrindo e subi um pouco mais a mão, começando a brincar com seu zíper. – Mas não agora. As respostas podem esperar. Meu corpo, não.
Michael me fitou e tocou meu queixo suavemente. Procurei algum resquício de raiva ou ódio em seu olhar, mas não consegui encontrar nenhum dos dois. Havia desejo ali... desejo do mais puro e incontrolável. Olhando dentro dos seus olhos negros, percebi que ele a um passo de jogar no lixo todo seu autocontrole.
- Você não deveria ter voltado – ele disse para mim, segurando meu queixo. – Não deveria, Therese.
- Deveria, sim – murmurei, sentindo seus dedos firmes na minha pele. – Pare de se enganar, Michael. Admita que eu fiz bem em ter voltado. Você sabe que nenhuma outra mulher é capaz de te fazer sentir o que eu faço. 
Ele mordeu o lábio e soltou meu queixo. Não havia como tentar negar algo que estava tão óbvio.
- Eu não gosto do que você me faz sentir – ele murmurou, descendo os olhos para a minha boca e deixando-os fixos ali. – Você desperta o que há de pior em mim. Você me transforma em um canalha. Um canalha filho da mãe que consegue te desejar mesmo sabendo que você é uma mulher doente e insana.
Subi a palma da mão pela sua barriga e a repousei em seu peitoral.
- Você ainda não entendeu que é isso o que você mais gosta em mim? – perguntei e sorri. - Você, Jackson, é tão louco quanto eu. Mesmo querendo me odiar, você só consegue pensar em mim gemendo no seu ouvido, enlaçando seu quadril com as minhas pernas, pedindo pra você me foder forte, do jeito que eu gosto. Eu não te transformo em um canalha, apenas alimento sua verdadeira natureza. É a Melodie quem desperta o que há de melhor em você, não é? E o melhor, meu caro, é simplesmente um tédio. Você não foi feito para se contentar com um larzinho feliz, uma mulherzinha domesticada e uma transa meia boca todo final de noite. Essa droga de vida nunca, nunca será capaz de te satisfazer.
- Ela me satisfazia – ele disse e virou o copo de whisky. – A minha vida era ótima, Therese, até você reaparecer e ferrar com tudo. 
Sorri e peguei o copo da sua mão, colocando-o em cima da mesa de centro. Eu tinha o suficiente para satisfázê-lo, sempre tive, sempre teria. Afastei as pernas e me sentei deliberadamente em seu colo, enlaçando os braços atrás do seu pescoço. Michael me observou atentamente e permaneceu imóvel, desta vez sem me evitar.
- Eu não sei o que existe entre nós, Michael - murmurei para ele, com toda a sinceridade. – Nem os anos de terapia no internato conseguiram me dar essa resposta. Não sei se é alguma espécie de amor, de paixão, de loucura ou de doença, sei apenas que quero fazer você se arriscar outra vez. – Levantei uma das sobrancelhas e beijei levemente seu pescoço, traçando uma linha reta com os lábios até chegar ao maxilar. – Vamos, me dê a sua mão.
Ele recostou a cabeça no encosto do sofá.
- Therese...
- Me dê a sua mão – insisti.
Mesmo hesitante, Michael estendeu a mão direita para mim. Segurei seus dedos entre os meus e os guiei para debaixo do meu vestido de tecido fino. Afastei a calcinha devagar e os repousei ali, deixando-o notar minha umidade. A mão era tão grande que cobriu minha intimidade inteira. 
- Veja o quanto eu estou molhada para você – incentivei, segurando seu pulso e movendo sua mão. O toque era quente, e me fez arfar. – Meu corpo está gritando pelo seu. Você me deixa tão excitada que fico até mesmo dolorida. 
Ele suspirou, movimentando a mão por minha intimidade. Um dos seus dedos encontrou o clitóris – sem ser guiado por mim - e ele o pressionou devagar, esfregando-o de um lado para o outro. 
Como esperei para sentir seu toque outra vez! Mesmo depois de todos aqueles anos, meu corpo ainda respondia ao seu como se nenhum dia sequer tivesse se passado. Minha intimidade pulsava, cheia de excitação, e aproximei nossos lábios enquanto seu dedo se movia lentamente pelo clitóris, massageando-o com habilidade.
Inclinei-me sobre ele e pemiti que nossos lábios se tocassem. Arfei entre seus lábios quando sua língua invadiu minha boca, forçando-se com pressa para dentro dela. Nossas línguas se chocaram e pareceram duelar uma com a outra, tornando o beijo extremamente quente e intenso. A mão desocupada de Michael encontrou os meus cabelos e ele pressionou meu rosto contra o dele, explorando cada canto da minha boca com a língua. O desejo dele por mim era nítido, e ficava mais evidente a cada vez que ele puxava meu corpo contra o dele, apertando-me forte entre seus braços. Quando nossos lábios se separaram, com muita relutância, estávamos arfando alto, absolutamente cientes dos efeitos devastadores que causávamos um no outro. 
- Seus beijos continuam maravilhosos – sussurrei baixinho, mordendo o seu queixo. Sorri com malícia e suspirei, sentindo sua enorme ereção pressionar minha intimidade, enquanto dois dos seus dedos ainda brincavam com o clitóris. A calcinha estava posta de lado, e se não fosse pelo maldito pano da sua calça, nossos sexos estariam em contato direto. Mesmo com sua ereção presa dentro da roupa, comecei a me mover lentamente em cima dele. – Posso apostar que sua língua ainda é capaz de me fazer gozar loucamente, Jackson. Eu adoraria tirar a prova.
Os dedos de Michael pararam de se mover abruptamente e logo senti suas mãos na minha cintura, tirando-me com pressa de cima dele. Soltei um suspiro de frustração, acreditando que ele desistira de prosseguir, mas fui surpreendida quando ele me colocou em cima da mesa de centro, ajoelhando-se diante de mim.
- Que se dane – eu o ouvi praguejar, enquanto arrancava meu vestido e afastava as minhas pernas. - Eu vou fazer você gemer como nunca antes, Therese Brown – murmurou e puxou minha calcinha com força, rasgando-a entre os dedos. – Quanto eu terminar, sua garganta vai estar tão ferrada que você não vai ter mais voz para me provocar dessa forma. 
Apoiei os cotovelos na mesa para observá-lo e gemi quando seus dentes agarraram a parte interna das minhas coxas. Maldição! Doeu! Suas mãos repousaram nos meus joelhos e ele abriu bastante as pernas, inclinado-se para dar outra mordida forte na virilha. Puta que pariu. Estava claro que ele não seria delicado, e seus dentes já estavam começando a deixar marcas vermelhas e redondas nos locais por onde ele percorria.
Arqueei o corpo e senti sua boca correr pelos pequenos lábios, dando chupadas fortes, enquanto uma de suas mãos abandonava o joelho trêmulo e subia lentamente pelas minhas coxas. Toda minha intimidade pulsava, deseperada por mais, tão sensível que me faria chegar ao orgasmo com apenas mais alguns segundos de estímulo. Fechei os olhos e coloquei as mãos nos cabelos de Michael, prendendo os dedos entre os fios da nuca, afastando as pernas ao máximo para recebê-lo entre elas. Ele mordeu a virilha outra vez e gritei, satisfeita com o formigamento que seus dentes causavam quando prendiam a pele. Sua língua massageou o local a pós a mordida, dissipando um pouco da dor, e olhei fixamente para ele, deixando-o enxergar a total aprovação estampada nos meus olhos.
Sua boca era absolutamente deliciosa. Eu sabia que não suportaria ser provocada por ela durante muito tempo. A mistura entre dor e prazer me excitava muito, e o brilho feroz que eu via nos olhos de Michael despertava algo também animal dentro de mim. A língua dele deslizou pelo clitóris pulsante, contornando-o e pressionando-o com força, deixando-o ensopado com sua saliva. Gemi alto e senti seus lábios em cima dele, sugando-o com força para dentro da boca, fazendo-o estremecer entre os dentes. Apertei os dedos em seus cabelos e abri os olhos, sem parar de gemer, disposta a gozar olhando bem dentro dos olhos dele. Michael começou a chupar o clitóris com vontade, em um ritmo alucinante, usando o dedo médio e o indicador para massagear as paredes internas da vagina. Mais alguns segundos daquilo e eu enlouqueceria. Como diabos ele conseguia fazer algo tão gostoso daquele jeito? A sensação não se assemelhava a nada que outro homem tenha me feito sentir na vida.
Mordi o lábio inferior e meu corpo inteiro tremeu, contraindo e retraindo, enquanto eu me contorcia embaixo da sua boca. O orgasmo foi tão longo e intenso que passei alguns segundos com a mente suspensa, desprovida de pensamentos, apenas gemendo e arfando, sem conseguir formular palavra alguma. Gritei “Oh Jackson, isso, mais!” quando consegui dizer alguma coisa, puxando seus cabelos com as mãos descordenadas, sentindo-o dar chupadas ainda mais fortes e demoradas. Quando minha intimidade parou de pulsar, sua língua continuou em cima do clitóris, subindo e descendo devagar, sem usar força alguma dessa vez. Tentei recuperar o fôlego e percebi que minha garganta seca doía, ardendo como se estivesse em carne viva. Eu estava rouca, fodidamente rouca. O filho da mãe sempre cumpria as suas promessas.
- Volta, Michael, eu não consigo mais – gemi com dificuldade, sentindo sua língua ainda correndo pelo clitóris. O orgasmo fora muito intenso, e eu estava muito sensível, precisava de alguns minutos antes de continuar. Ele sorriu e tirou os dois dedos molhados de dentro de mim, mas não saiu do meio das minhas pernas.
- Cale-se – disse, levantando uma das sobrancelhas. – Eu ainda não acabei.
Puta. Merda. 
Prendi o lábio inferior entre os dentes e ele recomeçou a chupar, com calma e paciência, correndo a ponta quente da língua pelos pequenos lábios úmidos. O contato doía um pouco, causava um pequeno desconforto, mas logo a excitação começou a fazer meu clitóris pulsar novamente. Firmei os cotovelos na mesa e observei a boca de Michael movendo-se devagar, dando sugadas leves, acariciando-me com a delicadeza que não se fizera presente minutos atrás. Arqueei o corpo e senti sua língua descer do clitóris até a entrada, contornando-a e forçando-se para dentro. Enfiei as unhas em seus pulsos e gemi alto quando a senti abrindo espaço, entrando fácil por conta da umidade. Meu corpo ainda não havia se refeito totalmente do primeiro orgasmo, mas ao sentir sua língua me penetrar, gozei desesperadamente mais uma vez. Forcei meus pulmões a procurarem um pouco de ar e vi Michael se levantar rapidamente, retirando o terno com uma falta de cuidado que certamente o deixaria todo vincado e amassado. Para minha surpresa e satisfação, ele não usava nenhuma cueca, e sua incrível ereção se libertou assim que ele começou a descer a calça.
Ele tinha ido ao meu apartamento... sem cueca... e ainda tinha a cara de pau de fingir que estava irritado e insatisfeito com nosso encontro? Se eu não o tivesse forçado a me encontrar ali, ele com certeza viria por contra própria, seria apenas uma questão de tempo. 
Vi uma cicatriz em uma de suas coxas e me senti culpada por saber que eu havia causado aquilo. Em minha barriga também havia uma pequena cicatriz, contrastando com a pele branca, algo que certamente não me trazia lembranças das melhores e mais confortáveis. Qual de nós dois era o mais louco? Eu não saberia responder. Com minha volta, ou nos entenderíamos muito bem ou nos mataríamos de vez - um dos dois extremos, porque tanto eu como ele éramos intensos demais para nos contentarmos com o meio termo.
Inclinei-me para a frente e analisei seu sexo com atenção enquanto ele terminava de se livrar do sapato, das meias e da calça. Era de dar água na boca, definitivamente. O membro estava absolutamente ereto e molhado, com as veias salientes pulsando e saltando pelas beiradas. Eu queria tê-lo apreciado por mais tempo, mas Michael ajoelhou-se no chão outra vez e puxou uma das minhas pernas até o seu quadril, preparando-se para me penetrar. Seus lábios encontraram os meus e ele se encaixou em um único movimento, alcançando-me até o fundo com uma forte estocada. Gemi na sua boca e ele começou a se movimentar, preenchendo-me por completo com sua extensão, entrando e saindo rapidamente. Enterrei as unhas nas suas costas e fixei os olhos no rosto dele enquanto ele se mexia com pressa e urgência, me arremessando em direção a um prazer incapaz de ser mensurado com palavras.
O orgasmo veio para nós dois ao mesmo tempo desta vez. Agarrei-me contra ele, deixando meu corpo pulsar, e o ouvi gemer meu nome, derramando-se em jatos quentes no meu interior. O suor brotava em abundância de sua testa, sua repiração estava descompassada e, mesmo depois de gozar, seu membro continuou ereto. Ele se retirou de dentro de mim, e para minha total, completa, absoluta, surpresa, repousou um beijo na minha testa.
- Quero sua boca aqui, Therese – ele disse e tocou no próprio membro, sentando-se no sofá. – E depois, se você ainda tiver voz, quero que me conte tudo o que preciso saber.
Eu sorri para ele, indo na sua direção. Ajoelhei-me entre suas pernas e coloquei a mão na base do seu membro.
- Teremos tempo suficiente para tratarmos dos assuntos pendentes depois – murmurei e dei uma piscadela. – Agora, feche os olhos e relaxe, está bem?
Ele se permitiu abrir um sorriso, olhando fixamente para mim. Toda sua seriedade havia desparecido, e ele finalmente estava percebendo o quanto me queria por perto.
- Vamos logo, Tess – apressou-me com um sorriso contido, acariciando os meus cabelos.
Eu teria me levantado e cantarolado ao ouvir sua voz bem humorada; se não estivesse com a oitava maravilha do mundo moderno erguida diante dos meus olhos, pingando de umidade, esperando pela minha boca. Fechei uma das mãos na base do membro e me inclinei um pouco, começando-o a esfregá-lo por entre meus lábios. Michael soltou um gemido profundo e corri minha língua por toda sua extensão, abocanhando-o logo em seguida. Forcei-o na direção da garganta e voltei a retirá-lo, dando uma pequena sugada na glande molhada e alterada. Ele mordeu o lábio inferior e passou a empurrar o quadril para cima enquanto guiava minha cabeça para baixo, fazendo-me engoli-lo até o meu limite.
Seus gemidos invadiram a sala, cada vez mais altos e profundos, soando como música para os meus ouvidos. Continuei chupando forte, sem parar de masturbá-lo, e logo senti seu membro enrigecer ainda mais, ficando mais duro a cada segundo. As costas de Michael se arquearam e ele empurrou o quadril com mais força, apertando os olhos de prazer enquanto liberava os jatos quentes e generosos na minha língua. Engoli tudo, gota por gota, deixando-o completamente limpo antes de tirá-lo da minha boca.
- O tempo o deixou mais gostoso ainda – eu disse para ele e dei uma última sugada. – Acabo de crer que você é como o vinho, Jackson. Melhor a cada ano, delicioso quando saboreado, e muito eficiente para matar a minha sede. – Sorri e subi até o sofá, dando um suave beijo em seus lábios. – A Melodie não merece uma safra com tamanha qualidade. É um desperdício inadmissível.
Michael me fitou, ainda com a respiração pesada, e colocou uma mecha de cabelo atrás da minha orelha.
- Você ainda vai ser a destruição da minha vida, senhorita Brown – disse com a voz calma, como se estivesse conformado com esse fato. - Eu irei me amaldiçoar por ter sido tão idiota, praguejar por ter permitido que você se aproximasse de mim outra vez. Mas agora, nesse exato momento, eu só consigo pensar em deixar você o mais próximo de mim que quiser ficar. Meu subsconsciente já está gritando que isso vai dar merda, mas quanto a isso não há problema. Por ora, posso mandá-lo calar a boca, contanto que você me mostre um bom comportamento.
Sorri e contornei o vermelho das suas bochechas com a ponta dos dedos.
- Você não está sendo um idiota, Michael. Estava sendo, quando acreditou que conseguiria me evitar. Talvez seu subconsciente esteja redondamente enganado. Mas, deixando essa discussão pessimista de lado, acho que tenho uma parte do nosso trato para cumprir agora.
Michael anuiu, recolhendo nossas roupas do chão, e vi um brilho intenso de curiosidade iluminar seu olhar novamente. Chegara a hora de começar a deixá-lo ciente dos fatos, e, por uma maldição dos sete infernos, eu estava bastante incomodada em relembrar aquele assunto. Qual seria sua reação quando soubesse de tudo? Eu sabia o quanto aquele homem desejava as respostas, mas não tinha absoluta certeza de que ele estava pronto para lidar com elas. 


Capítulo 12

Levantei-me do sofá e caminhei na direção do quarto, completamente nua, vendo os olhos escuros de Michael me seguirem com atenção. Ele soltou um palavrão, provavelmente por conta da minha falta de vergonha em um momento tão sério, e recolheu sua calça no chão, começando a vesti-la. Movi os quadris o mais sensualmente que consegui, sabendo que seus olhos estavam sobre minhas costas, e conti um risinho baixo de satisfação. Ele estava gostando da vista, eu tinha absoluta certeza, portanto, usaria aquilo para provocá-lo. 
Abri a última gaveta de dentro do guarda roupa e espalhei alguns papéis, procurando um evelope fechado que eu guardara ali dentro alguns dias atrás. Quando o encontrei, puxei-o para fora e passei ao lado da cama, pegando um robe preto de tecido fino para cubrir o meu corpo desnudo. Na verdade, ele era curto, transparente, e não cobria muita coisa.
- Isso é tudo o que posso lhe oferecer hoje – eu disse ao voltar para a sala, esticando o envelope e sentando-me no sofá. Michael também estava sentado, sem camisa, com uma dose generosa do meu whisky na mão direita.
Ele observou o envelope por alguns segundos e o pegou, abrindo-o cautelosamente em seguida. Tirou uma fotografia de dentro dele e me encarou com uma expressão de censura quando percebeu que aquela era a única coisa que estava guardada ali dentro.
As sobrancelhas de Michael se arquearam enquanto ele analisava a fotografia. Era uma imagem minha, sete anos antes, sentada em um banquinho de madeira ao lado de uma pequena plantação de camélias. Eu estava sorrindo, sem maquiagem e vestida com simplicidade, ao lado de uma mulher magra e muito pálida. Havia uma enorme protuberância na minha barriga, bastante visível, evidenciando uma gravidez de no mínimo sete meses.
- Onde essa fotografia foi tirada? – Michael perguntou, aproximando mais a foto para observá-la melhor.
- No San Pedro, claro – respondi, brincando com a ponta do envelope. – Esse é o jardim que nós cuidávamos para ocupar um pouco do tempo. Quer dizer, que as outras internas costumavam cuidar. Eu não tinha muita paciência para regar as flores, e as mudas que eu plantava nunca nasciam. – Relembrei e dei de ombros. – Acho que não levo muito jeito.
Os olhos de Michael ainda estavam fixos na imagem, absorvendo todos os detalhes.
- E quem é essa mulher com você?
- A Lorna – murmurei. – É uma demente completa, coitada, mas uma boa companheira. Dormíamos no mesmo quarto.
Michael soltou um suspiro de frustração e jogou a foto em cima do sofá.
- Essa porcaria não prova nada, Therese. Isso não é uma prova, muito menos uma prova concreta.
- Claro que é – murmurei e peguei a foto, apontando para minha própria imagem. – Porra, Michael, você está cego? Não está enxergando a minha barriga? Se você conhece mesmo a forma como me movo, o toque das minhas mãos, e até mesmo o meu cheiro, como disse naquele bar, deve saber que a barriga da foto é a prova concreta de uma gravidez.
Ele balançou a cabeça negativamente, irritado.
- Pode ter algo abaixo da roupa – murmurou. – A pele não está exposta. Além do mais, essa imagem pode ter sido manipulada. Ela não prova nada, absolutamente nada.
Estreitei os olhos. Que filho da mãe cético e dificil de se convencer.
- Posso lhe dar cada detalhe da gravidez, Michael – murmurei. – Posso lhe contar o quanto os médicos se dedicaram em uma mesa de cirurgia para retirar aquela bala sem terem que tirar o bebê. Você quase o acertou, sabia? Os médicos da equipe cirúrgica disseram que eu era uma mulher de sorte, apesar de eu não ter concordado muito com isso naquele momento. Na verdade, eu queria mesmo que você o tivesse matado. – Sorri e voltei a guardar a foto no envelope. – Como você faria para carregar essa culpa o resto da sua vida?
Michael me fuzilou com o olhar. Creio que era bastante doloroso para ele pensar nessa possibilidade.
- Você garantiu que me contaria o que aconteceu, Therese – murmurou. – Pare com esses jogos estúpidos. Se você realmente estava grávida, algo de que ainda não estou convencido, onde diabos essa criança está agora? 
- Lembra-se bem do que eu disse? – perguntei para ele. – “Em cada noite que você ficar comigo, contarei uma parte da história.” A fotografia está mais do que suficiente por hoje. Se você quiser saber mais alguns detalhes, é melhor se preocupar em marcar logo nosso próximo encontro.
Seus olhos se estreitaram, deixando evidente o quanto aquilo o estava deixando irritado, mas ele sabia que não tinha outra alternativa. 
- Não posso esperar – ele disse. – Simplesmente não posso. 
- Já esperou sete anos – murmurei com um leve dar de ombros. – Acredite em mim: alguns dias a mais não irão fazer diferença. A sua parte está sendo a mais fácil. Difícil mesmo seria sentir aquele ser crescendo dentro de você, modificando seu corpo inteiro, dando chutes horríveis na sua barriga. – Levantei as sobrancelhas. A experiência não tinha sido muito agradável. - Você iria contar os segundos para colocá-lo logo para fora.
Ele me encarou, parecendo perturbado com minhas palavras. Esticou a mão para pegar sua camisa e começou a vesti-la, levantando-se logo em seguida.
- No nosso próximo encontro, Therese, eu quero provas, entendeu? Provas de verdade, não relatos feitos por você ou a porcaria de uma foto. Não confio em fotografias e não acredito nas suas palavras, portanto, continuamos na estaca zero. 
- Faça por merecer as informações – eu disse e sorri. – Como hoje. Se você continuar fodendo tão gostoso, logo ficará sabendo de toda a verdade.
- Trocar sexo por informações não me agrada – ele respondeu com certa má vontade. – Eu me sinto manipulado, cacete. Sei que preciso de você para saber dessa história, mas não permitirei que você me use como um fantoche, entendeu?
- Entendi – respondi assentindo. – Então o faça por conta própria – sugeri. – Pare de tentar se controlar e se enganar, porque sei o quanto você me quer. Está tudo nas suas mãos, Michael. A decisão é sua e apenas sua.
Seus olhos me fitaram mais uma vez, enquanto ele voltava ao silêncio, analisando minhas palavras. Eu não queria manipulá-lo, apenas fazê-lo perceber que sua vida estava toda errada sem a minha presença. Eu poderia oferecer-lhe tudo, resgatar o Jackson audacioso de sete anos atrás; e ele parecia bastante tentado a mudar o rumo de sua tediosa vida tão correta e aceitar a minha oferta.

Capítulo 13

Levei o cliente para conhecer um bar qualquer após o jantar, repetiu consigo mesmo, atravessando a sala silenciosa e escura, olhando o relógio de pulso pela segunda vez nos últimos cinco minutos. É a primeira vez que ele vem a Los Angeles, não conhece absolutamente nada aqui. Estava completamente perdido. Você sabe como são os ingleses.
Oh Deus. 
Que droga. “Você sabe como são os ingleses?”
O que diabos pensava que estava fazendo?
Michael parou no meio da sala e sentiu vontade de socar a própria cara. Não podia acreditar que estava ensaiando a mentira deslavada que contaria para Melodie. O relógio marcava três horas da manhã, e, apesar de já parecer ruim o suficiente, esse nem era o seu maior problema. Estava com o terno amarrotado, com o cheiro de Therese Brown grudado em sua pele, mais perturbado do que estava quando saíra, além de uma cara pós-foda que certamente o entregaria. A situação era incômoda, e fazia com que se sentisse bastante desconfortável. Jurara no altar que seria fiel à sua mulher; e teria mantido os votos se as circunstâncias não o tivessem obrigado a seguir por outro caminho. Precisava descobrir o que Therese lhe escondia, e se precisasse trair Melodie outra vez para obter toda a verdade, ele o faria; mesmo sabendo que a culpa o sufocaria a cada vez que olhasse nos olhos de sua esposa.
Ou não. E era isso que o preocupava. 
Não estava se sentindo culpado. Seu corpo ainda encontrava-se entorpecido pelo prazer que sentira, e a noite havia sido simplesmente maravilhosa. Boa parte das suas incertezas se desvaneceram no instante em que possuiu Therese Brown. Não ficava satisfeito em admitir, mas era exatamente como se sentia. Talvez Therese estivesse certa, afinal de contas. Passara os últimos anos negando sua verdadeira natureza, tentando ser um marido fiel e dedicado, quando na verdade apenas se acomodara com aquela vida tranquila e tentara se convencer de que estava sendo feliz. O casamento lhe dera Blanket, a quem amava com todo o coração, mas nunca vivera nenhuma outra grande emoção além da paternidade. A vida com Melodie era calma, tranquila, organizada, e embora tivesse apreciado tudo isso no início, com o tempo as coisas acabaram se tornando estáticas demais, pacatas demais, previsíveis demais. 
Era como se estivesse vivendo em um rascunho medíocre, permanecendo de braços cruzados enquanto assistia a vida passar diante dos seus olhos. Therese disse que queria fazê-lo se arriscar. E o antigo Michael sempre gostara de correr todos os riscos.
Subiu as escadas e surpreendeu-se quando encontrou boa parte das luzes acesas, além de ouvir o barulho de passos lentos que vinha do quarto de Blanket. Apressou-se pelo corredor iluminado e parou em frente a porta do quarto do filho, subitamente preocupado, tentando imaginar o que poderia ter acontecido. Entrou com passos silenciosos, apesar da pressa em aproximar-se da cama, e viu Blanket deitado de lado, de olhos fechados e respiração pesada, com a testa quente ensopada de suor. Melodie estava em pé, ao lado da cômoda, colocando o termômetro de volta dentro da maleta branca onde costumava guardar curativos e remédios.
- O que aconteceu com ele? – Michael perguntou para Melodie, esticando a mão para tocar a testa do filho. 
- Febre – respondeu secamente, sem a mínima intenção de dar mais explicações.
Michael a fitou, querendo se sentir o maior canalha de todo o universo, mas sem conseguir fazê-lo.
- Muito alta?
- 39 graus – a esposa disse, fechando a maleta com um único puxão no zíper. 
Ele secou a testa de Blanket e o observou, enquanto seu instinto protetor de pai o fazia querer colocar o filho no carro apressadamente e levá-lo para o pronto socorro mais próximo. Apesar da preocupação, o suor em abundância indicava que a febre já estava começando a sair do corpo repousado.
– Talvez seja melhor levá-lo ao médico – sugeriu.
- Sou enfermeira, Michael – Melodie o interrompeu com a voz firme e o semblante fechado, deixando claro que sabia as medidas a serem tomadas. – Prince irá ficar bem. Se houvesse a necessidade de consultar um médico, tenha absoluta certeza de que ele já teria sido atendido por um. 
Michael captou o tom frio de sua voz, mas tentou ignorá-lo.
- Precisamos saber a causa. Providenciar exames. Você não pode fazer isso aqui, por mais alta que seja a sua competência.
Ela caminhou até a janela, conferindo se estava mesmo fechada. Não queria olhar nos olhos de Michael. Tinha medo do que poderia encontrar dentro deles.
– Já o mediquei – ela murmurou com seriedade. – A febre está abaixando. Ele vai estar bem quando acordar, e não preciso de exame algum para ter certeza disso. Sou mãe, além de enfermeira. Conheço o meu filho. Você também deveria conhecer.
O tom cortante da voz o fez estremecer. Ela estaria colocando em dúvida sua dedicação de pai? Melodie sabia melhor do que ninguém o quando ele era um pai presente e responsável. Mesmo com o trabalho, que tomava boa parte do seu tempo e necessitava de muito empenho, ele sempre colocara sua família em primeiro plano, acima de todo o resto.
- O que quer dizer, Melodie? – ele perguntou.
A mulher o fuzilou com o olhar duro, tentando esconder as lágrimas que derramara.
- Ainda pergunta? 
Michael continuou calado, esperando a resposta que certamente ainda viria.
- Você anda distante e perturbado – Melodie prosseguiu. - Está se preocupando loucamente com algo que nem sequer deseja dividir comigo. Não percebe que isso está afetando a criança?
Então era esse o ponto da discussão. Ela não aceitara bem o seu silêncio.
- Tenho todo o direito de ter os meus problemas – Michael disse com firmeza, mas sem perder a gentileza da voz. – Não sou obrigado a compartilhá-los com ninguém, Melodie. 
- Pensei que os problemas eram nossos – ela rebateu. 
Meus – corrigiu ele. - Mesmo sendo casado com você, tenho direito à minha privacidade, meus assuntos e minhas preocupações.
Ela riu baixo, sem humor algum. Estava controlando a raiva que sentia, e não fazia questão alguma de esconder esse fato.
- Sempre tivemos cumplicidade. Sempre. Pensei que você soubesse que pode contar comigo em todos os momentos. Não confia em mim? É isso?
- Não estamos discutindo sobre confiança – ele murmurou.
- Ah, não? – perguntou com ironia. - Uma coisa leva a outra. O Prince chamou o seu nome a noite inteira, Michael. A noite inteira! – Fuzilou-o com o olhar outra vez. - O que eu deveria ter dito para ele? 
Michael ficou com as palavras presas na garganta seca, sem conseguir formular uma justificativa plausível para lhe dar. Não usaria a desculpa que programara. O olhar dela deixava claro que ela sabia onde, como e com quem ele estivera até as três horas da madrugada. Ele deveria estar preocupado com isso, não deveria? Mas não conseguia se importar o suficiente; e estava cada vez mais assustado consigo mesmo.
- Deveria ter me ligado – ele murmurou, ainda sem encontrar a culpa que procurava. Se ele soubesse do estado do filho, não teria pensado duas vezes antes de deixar Therese e voltar às pressas para casa. 
O olhar de Melodie tornou-se ainda mais firme. 
- E você acha que eu não tentei? – disse, aproximando-se dele. – O celular caiu na caixa postal em todas as tentativas. Onde você estava?
O tom acusatório da pergunta o fez estremecer de leve. Negaria o que fizera? O que poderia fazer? Diria que estava em um bar com um cliente... ou assumiria que a traíra, pediria perdão e prometeria que aquilo jamais voltaria a acontecer? Qualquer uma dessas alternativas seria uma mentira. E ela não merecia ser tão enganada.
- Tudo bem, eu posso responder – ela disse respirando fundo, diante do seu silêncio. – Você... Você estava na cama com aquela desgraçada que voltou do inferno pra nos atormentar. – A frase soou tão clara, tão cheia de certeza, que ele soube que, desde o instante que Therese ressurgira, Melodie já sabia que aquilo iria acontecer. - Agora diga que estou ficando louca, que estou imaginando coisas, que isso não está acontecendo conosco. Diga, Michael, por favor.
Não, ele não poderia dizer. Apesar da voz trêmula, Melodie estava com o olhar firme, determinado, parecendo lutar contra as lágrimas que a fariam parecer uma mulher frágil e fraca, que cai em prantos e se desespera quando percebe que  foi traída. Poderia dizer que não estava necessariamente na cama, e sim no sofá e na mesa de centro, mas isso obviamente não ajudaria em nada. Meu Deus. Como poderia estar tão calmo em uma situação como essa?
- Não vamos falar sobre isso aqui. Não na frente da criança – Michael a censurou, segurando seu braço. Mesmo febril, Blanket poderia acordar a qualquer momento, e ele não precisava nem deveria ser envolvido naquela discussão. - Vamos para o quarto.
Ela puxou o braço com força e rispidez, soltando-se das mãos dele. 
Eu vou para o quarto – ela disse, cuspindo as palavras trêmulas. – Você, fica! Durma na sala, se quiser, ou no quarto de hóspedes, ou no raio que o parta em três e o faça desaparecer das minhas vistas. 
Seu coração se compadeceu com a evidente angústia que ela sentia. Como teve a coragem de fazer aquilo com ela? E por que não conseguia tocar sua mão, apertá-la em seus braços e dizer “sinto muito”?
- Melodie... 
- Não sei em quem você se transformou, Michael – ela interrompeu. - Como se deixou levar por aquela mulher depois de tudo que ela fez?! 
Ele não tinha a resposta. Simplesmente não tinha. Então franziu os lábios e manteve o silêncio.
- E você nem sequer tem a decência de me pedir desculpas?! – A fúria brilhou nos olhos de Melodie, enquanto ela empurrava o peito de Michael com força, sem conseguir mais segurar as lágrimas. Ele não se desvencilhou e não segurou seus braços, apenas deixou-a descontar toda sua raiva ali. – Eu não o reconheço mais – ela disse quando desistiu de empurrá-lo, fitando-o com uma mistura de raiva e decepção. - Aquela doente irá acabar com sua vida, Michael. Ela irá destruí-lo, reduzi-lo a pó, e não quero estar por perto quando isso acontecer. Você estará sozinho, sozinho, e então vai se arrepender de toda essa merda em que está se metendo.
Michael apoiou a cabeça na parede, praguejando consigo mesmo enquanto deixava Melodie ir, com o rosto vermelho coberto de lágrimas. Ele sabia a gravidade do que fizera. Sabia que aquilo poderia custar o seu casamento. Sabia também que deveria ir até ela e tentar consertar todo aquele erro que cometera; mas não tinha certeza alguma de que aquilo realmente fora um erro. Estava metido em uma confusão sem tamanho. Perdera completamente a noção do bom e do mau, do melhor e do pior, do certo e do errado. 
Melodie estava coberta de razão, ele sabia que estava. 
Therese Brown realmente poderia acabar com sua vida. 
Mas pensando bem e analisando todos os aspectos... 
Deixá-la acabar com aquela vida seria tão ruim assim?


Capítulo 14

Depois da discussão com Melodie, Michael recolheu novamente as chaves do carro e dirigiu até a casa de Chris. Não havia o menor clima para que ele permanecesse em casa aquela noite sabendo que sua esposa estava trancada no quarto, provavelmente chorando, sofrendo por culpa sua. Não conseguia entender como sua vida poderia ter mudado tanto em tão pouco tempo. Nem sequer sabia se ainda era um homem casado. Melodie não mencionara pedir o divórcio, mas ele sabia que ela não perdoaria fácil uma traição. Para ter sua confiança de volta ele precisaria pedir perdão, tentar se redimir de alguma forma, cobri-la com flores e presentes, fazer novas juras de amor; e definitivamente, ele não se sentia tão disposto assim a salvar seu casamento. Sabia que poderia estar sendo um idiota, que jogar sete anos de cumplicidade no lixo poderia ser o maior erro de sua vida, mas estava apenas seguindo seu coração. Ou seguindo sua natureza, como a própria Therese gostava de lhe lembrar.
Entrou no prédio de Chris e pegou o elevador até o terceiro andar, rezando aos céus para que seu amigo não estivesse acompanhado por alguma garota. Chris raramente conseguia companhia para aquecer seus lençóis, provavelmente por conta da sua falta de jeito com o universo feminino, mas vez ou outra, com a ajuda de algumas doses de bebida, seu charme se tornava irresistível para garotas semi-bêbadas que acabavam acreditando que ele era o cara mais bonito e inteligente de toda Los Angeles. Michael saiu do elevador e seguiu até a porta do seu apartamento, tocando a campainha e esperando que aquela estivesse sendo uma madrugada típica para Chris.
- Você está sozinho? – foi a primeira coisa que Michael perguntou quando Christopher abriu a porta e o encarou com olhos injetados, vestido apenas com uma cueca amarela e meias brancas, enrolado em um lençol azul. 
- Oh não. Eu e Pâmela Anderson estávamos transando loucamente até você tocar a maldita campainha e nos atrapalhar – respondeu com a voz sonolenta e irônica. – Você sabe que horas são, cara? O que você está fazendo aqui? Bebeu e errou o caminho?
Michael entrou no apartamento, caminhando pela sala escura e procurando o interruptor.
- Eu e a Melodie brigamos – disse e acendeu a luz. Franziu a testa quando percebeu que não havia sido bem assim. – Quer dizer, ela brigou comigo. 
Chris bocejou, jogando-se no sofá e fazendo o lençol cair em torno do seu corpo.
- Como é? – perguntou com incredulidade, sentindo-se um pouco mais disperso. – Tem alguma coisa errada aqui. Vocês são o casal perfeito. A típica família de comercial de margarina. Vocês não brigam... nunca.
Michael sabia daquilo. E esse também era um dos problemas.
- Essa é a questão, Chris – Michael disse, caminhando até a cozinha e abrindo a geladeira. – Não tem nada para comer aqui? – perguntou, sentindo o vapor frio no rosto e notando que ela estava quase deserta.
- Tem alguns enlatados no armário – ele disse, cutucando um fiapo de linha que estava se desprendendo da meia. – Segunda porta à esquerda.
Só picles? – Michael gritou de volta, depois de abrir o armário.
- É, cara! O que mais você queria? Você me acorda às quatro da manhã e ainda reclama da minha comida? 
Michael caminhou de volta para a sala, com um pote de picles na mão. Sentou-se no sofá ao lado e abriu a tampa, fisgando um picles lá de dentro.
- Sabe, Chris, você disse que eu e a Melodie somos um casal perfeito – ele murmurou. - Mas acho que nós nunca fomos exatamente um casal. Somos dois amigos que se apaixonaram em algum ponto da vida, trocaram alianças, tiveram um filho... e continuaram casados mesmo quando a paixão se transformou em amizade outra vez.
Os olhos de Chris o fitaram, grandes e confusos dessa vez.
- O que temos aqui? – ele perguntou com um suspiro impaciente, jogando uma almofada em cima de Michael. – Uma crise dos 44 anos? A essa hora da madrugada? Você precisa de um terapeuta, cara. De tratamento. Que conversa é essa de ser um amigo da sua mulher?
- Não tem nada a ver com idade – Michael murmurou, mastigando o picles. – Só estou percebendo que me acomodei com a vida de casado e passei os últimos anos mentindo descaradamente para mim mesmo.  
- Esse foi o motivo da briga?
Michael balançou a cabeça negativamente, estendendo o pote para Chris.
- Não. Eu a traí.
O amigo o encarou, com um vinco enorme na testa, com os olhos arregalados quase pulando do rosto surpreso. 
- O quê? Você traiu a Melodie? 
Michael assentiu.
- Traí. Horas atrás.
- Cacete... E quando você pretendia me contar? 
- Estou contando agora – Michael murmurou, já conhecendo o drama desnecessário de Chris. – Tudo aconteceu essa noite. O que você queria, informações em tempo real?
- Estou chocado, cara - Chris disse, comendo um pouco do picles. – Chocado. Nunca pensei que você pudesse trair a Melodie. Me diga, a garota era muito gostosa?
- Você não vai acreditar – ele murmurou, apoiando a cabeça no sofá. – Foi com a Therese.
Chris levantou-se em um salto, ainda mais surpreso.
- Oh meu Deus... com a Theresa? Porra, Michael. Aquela mulher... – Conteve-se de repente, sem a mínima intenção de mencionar a noite que tentara passar com ela. Pílulas azuis? Aquela criatura de olhos claros era ácida e perversa, agora tinha certeza. – Aquela mulher... sequestrou seu filho. Ela estava internada porque tentou matá-lo, cara. Você deveria ter medo dela.
- Eu sei o que a Therese fez. Sei melhor do que ninguém. Fui obrigado pelas circunstâncias a transar com ela – murmurou, mas nem ele mesmo continuava a acreditar seriamente naquilo.
Christopher gargalhou.
Obrigado? Ah, Michael, conta outra. 
- É sério – tentou justificar. – Ela está dizendo que tivermos um filho, Chris. Um filho. Não sei se posso acreditar nisso... e é tudo bastante assustador... mas não posso simplesmente ignorar essa possibilidade levantada por ela. Eu posso mesmo tê-la engravidado há sete anos e isso tem acabado comigo. 
- Ela lhe mostrou alguma criança? – Chris perguntou. – Abra os olhos, Mike. Se essa mulher realmente é tão louca como você sempre me disse que era, ela pode muito bem ter conseguido algum pivete por aí para pousar de filho dela e apontar você como pai. Daqui até sair o resultado de um exame de DNA, todo o estrago já terá sido feito em sua cabeça.
- Não, ela não me mostrou criança alguma – Michael disse. – E isso, Chris, me deixa ainda mais preocupado. Ela pode ter entregado o bebê para a adoção, o que é o mais provável, e se isso tiver mesmo acontecido, talvez eu nunca tenha a chance de conhecê-lo.  
- Ela não disse onde a criança está? Supondo que essa criança realmente exista, claro.
Michael balançou a cabeça em negativa.
- Não. Ela irá me contar por partes. Uma parte da história para cada transa.
Christopher franziu a testa, indignado com aquilo.
- Por que ninguém me faz uma proposta dessas? – disse com evidente chateação. – Eu posso ter tido uma dúzia de moleques antes de entrar para a polícia, mas nenhuma mulher apareceu para me propor algo desse tipo. E, por favor, Michael, não me diga que isso será um sacrifício. Se eu entendi direito, seu casamento já está descendo pelo ralo, então aproveite. Só não deixe essa tal de Theresa arrancar o seu pinto fora, doida como ela é, porque isso sim seria um problema dos grandes.
Michael sorriu, levando um picles à boca.
- Sei lidar com ela. Sempre soube.
- Sabe tanto que ela deixou uma cicatriz enorme na sua perna e quase tingiu seus miolos com pólvora.
- Acidentes de percurso – Michael se defendeu. – Therese se excede às vezes. Tem um temperamento bastante conturbado. Tudo o que tenho que fazer é mantê-la na linha.
- E a Melodie? Vocês irão se divorciar?
- Eu e a Melodie precisamos conversar – ele disse, passando a mão nos cabelos. – Podemos nos resolver civilizadamente com uma boa conversa. Decidiremos o que for melhor. Tudo o que sei agora é que ela está com raiva de mim e não forçarei a barra aparecendo por lá por enquanto. – Michael deu um suspiro e levantou-se. – Vou tomar um banho, está bem? Deixarei um recado para a minha secretária pedindo que ela compre algumas roupas e peça para entregarem aqui, mas ela só deve fazer isso quando amanhecer.
- Tudo bem, Mike – Chris disse. – Não precisa se preocupar. Pode até pegar algumas roupas minhas emprestadas, se quiser, elas devem servir em você.
Michael levantou uma das sobrancelhas e sorriu ao pensar nos ternos de cores estranhas de Chris, além das gravatas grandes demais e das camisas cheias de listras ou estampas malucas. Oh não. A acolhida de seu amigo era muito bem vinda, mas com certeza suas roupas não serviriam nele.

Capítulo 15

A última coisa que eu esperava ver em plena segunda-feira de manhã era Michael Jackson parado na soleira da minha porta, tão gato como de costume, tendo uma expressão ligeiramente amistosa estampada no rosto quase sorridente. Não tínhamos combinado encontro algum; e a ideia de vê-lo ali por conta própria me deixou muito satisfeita Fiz o possível para esconder a surpresa e abri espaço para que ele pudesse entrar, curiosa para saber o que teria motivado sua visita. 
- Espero não tê-la acordado – ele murmurou, descendo os olhos discretamente pelo baby doll branco que eu vestia. 
- Não, eu já estava acordada – eu disse sorrindo e fechei a porta, me encaminhando outra vez para a mesa onde o café da manhã interrompido esperava o meu retorno. – Junta-se a mim?
- Não, obrigado – ele disse com a mesma expressão simpática no rosto e enfiou as duas mãos no bolso da calça jeans, sentando-se em uma cadeira ao meu lado. – Acabo de comer uma das especialidades do Chris. Pão francês de ontem e café preto com gosto de água fervida. 
Eu sorri diante do bom humor em sua voz, pegando uma maçã em cima da mesa. Então ele tinha tomado café da manhã na casa do agente atrapalhado? Algo ali estava fora do lugar.
- A Melodie também não anda suprindo suas necessidades alimentares? – perguntei, levantando uma das sobrancelhas, tentando não me mostrar muito curiosa. – O caso é mais grave do que eu imaginava.
Michael tirou o chapéu e o colocou em cima da mesa, com extrema naturalidade, como se estar em minha presença não o incomodasse. Agora eu tinha certeza, algo muito estranho estava acontecendo. Ele não havia me insultado, não mostrara mau humor, tinha até me oferecido um meio sorriso na porta, o que fugia completamente da maneira como ele vinha me tratando desde que voltei a procurá-lo. Além do mais, naqueles quase quatro minutos, ele ainda não havia mencionado as palavras: “filho”, “criança”, “suposta”, “gravidez” e “pista”, o que me deixava ainda mais desnorteada.
- Você está aqui para saber mais sobre o nosso filho? – perguntei, porque aquela era a única coisa que poderia tê-lo trazido até mim tão cedo. – Se for, não adianta. Tudo ao meu tempo, ok? Não adianta me pressionar.
Ele balançou a cabeça negativamente, sem rispidez alguma, o que também era bastante estranho.
- Estou aqui para dizer que a Melodie já sabe – ele disse, levantando os olhos para fitar os meus.
Mordi um pedaço da maçã e deixei as palavras pairarem pelo apartamento. Ele não parecia preocupado. Na verdade, pronunciou a frase em um tom tranquilo, como se aquilo não significasse tanto quanto deveria. 
- Hm – eu disse e terminei de mastigar. – Sobre a criança?
A pergunta pareceu o perturbar um pouco, o que era natural, afinal de contas, ele ainda não tinha certeza de que a criança realmente existia - ou que tivesse existido em algum momento - e ele sabia que eu estava usando aquela informação para incitar ao máximo sua angústia. Vê-lo preocupado com aquele assunto era muito divertido, e eu estava usando aquilo como uma pequena vingança depois de ter sido traída por ele. Porque sim, sete anos atrás eu havia sido traída por ele, mesmo sem termos namorado oficialmente. Ele me jogara para escanteio, colocara aquela sonsa em meu lugar em uma rapidez surpreendente; e fora o responsável por todos os anos que eu passei internada naquele inferno. Ele merecia um pouco de suspense, merecia de verdade.
- Sobre nós – ele disse. – Sobre a noite de ontem.
Soltei a maçã e peguei uma uva. Gostei muito do “sobre nós ”. Aquilo soava muito bem aos meus ouvidos.
- E isso é um problema, Jackson? – perguntei fitando-o, cruzando as pernas. 
Seu olhar seguiu o movimento, e vi um brilho malicioso dançando em seus olhos.
- Não sei – ele disse, enquanto seus olhos passeavam por mim. - Deveria ser.
Eu abri um enorme sorriso, prestes a levantar daquela cadeira e gritar “bingo!” uma centena de vezes. Meu Deus, meu Jackson estava ali. Eu podia vê-lo e senti-lo em cada detalhe. Michael sabia que não conseguiria continuar se enganando por muito mais tempo. Estava nítido que seu casamento já não era tão importante. Descruzei as pernas e me obriguei a manter certa prudência, lembrando a mim mesma que aquele homem era bom na lábia e que eu não podia confiar nas aparências, por mais certas e seguras que elas me parecessem. Na despedida de solteiro, quando ele me olhou cheio de malícia, eu também acreditei que o antigo Michael estava ali, e Lady Shadow terminou a noite com uma dose de sedativo nas veias.
- Você se cansou, estou certa? – perguntei, atenta a cada reação sua. – Percebeu que a vida pode ser bem mais interessante do que tem sido. E é por isso que você está aqui.
- Estou aqui porque quero saber a verdade – ele ponderou, sem tirar os olhos da minha boca.
- Sei que quer – eu disse e me inclinei, aproximando nossos rostos, sabendo que ele realmente queria as respostas, mas não tinha tanta pressa. – Tanto quanto quer me levar para o quarto, tirar toda a minha roupa, e me foder como na noite de ontem.
Ele mordeu o lábio, tocando meu queixo com os dedos.
- Tenho uma sugestão melhor – respondeu, e pude sentir sua respiração quente contra minha boca. – Levante-se.
Puta merda. Maldição. Seu jeito autoritário sempre estava ali, evidenciando o homem seguro e controlador que ele era. Levantei-me, sem questioná-lo, e suas mãos tocaram minha cintura, enquanto ele também se levantava e me virava de costas. Sua ereção tocou minha bunda e suas mãos encontraram minha nuca, massageando suavemente a pele.
- Abra as pernas – ele sussurrou e me empurrou para frente, pressionando minha barriga contra a mesa. Afastei mais os joelhos e ele sorriu, abrindo o zíper em seguida. – Você sabe ser obediente quando quer, Therese.
- Sei ser obediente quando me convém – respondi e soltei um suspiro pesado, enquanto minha intimidade vibrava de expectativa, umedecendo toda a calcinha. – E não preciso pensar duas vezes para saber que ter você dentro de mim me convém muito. 
Ele levou uma das mãos ao short do baby doll, abaixando-o acompanhado pela calcinha, sem parar de pressionar o corpo contra o meu. Senti seu membro molhado tocar minhas nádegas e soltei um gemido abafado, arrebitando ainda mais a bunda em sua direção.
- Então peça – ele murmurou, dando uma mordida de leve em meu pescoço, fazendo meu corpo inteiro se arrepiar. – Peça para ser fodida por mim.
Ele esfregou o membro em minha entrada, pincelando-o pelo clitóris, e agarrei a mesa, arfando alto. Eu poderia pedir qualquer coisa que ele quisesse. Aquele homem acabava com minha sanidade e tinha consciência disso.
- Me fode, Jackson – murmurei com a voz clara, apesar de entrecortada. – Me fode agora.
- Assim? – ele perguntou e moveu o quadril para frente, penetrando-me em um só golpe.
- Oh sim – gemi e apertei os olhos, absorvendo a deliciosa sensação de estar toda preenchida por ele. 
Ele firmou as mãos na minha cintura, começando a me puxar lentamente de encontro a ele, enquanto movia o quadril para frente em um ritmo lento, só para me torturar.
- Mais, eu preciso de mais – pedi gemendo baixo, e ele atendeu ao meu pedido, intensificando as estocadas. Cerrei os punhos e comecei a mover os quadris também, tentando acompanhar os movimentos. – Mais – pedi outra vez, sentindo suas mãos me apertarem forte. – Mais forte e rápido. Me faça gozar com você inteiro dentro de mim.
Ele curvou-se, sem parar de se mover, e seus dentes prenderam minha nuca, enquanto ele gemia alto em meu ouvido. Eu sentia o orgasmo próximo, muito próximo, e a sensação aumentava ainda mais a cada vez que ele pressionava o corpo contra o meu e me apertava contra a mesa.
- Você é muito gostosa, Therese – grunhiu ao meu ouvido e levou dois dedos aos meu clitóris, começando a me masturbar. – Sempre foi, e, porra, o tempo a deixou melhor ainda. Vamos, goza pra mim – incitou, mordendo minha nuca.
Prendi o canto da boca entre os dentes e fechei os olhos, enquanto a sensação aumentava em ondas rápidas até me fazer explodir em um orgasmo intenso e avassalador, enquanto meu corpo inteiro tremia e pulsava sem controle. Gemi alto, pronunciando um monte de frases desconexas, e Michael arremeteu com mais força, arfando e gemendo enquanto liberava seus jatos quentes dentro de mim.
Apoiei a cabeça na mesa e sorri, vendo-o dar uma última mordida nos meus ombros e se retirar de dentro do meu corpo. Virei-me de frente para ele e coloquei as mãos em torno do seu pescoço, levando os meus lábios até os seus.
- Eu quero mais – sussurrei em sua boca, contornando seu lábio com a língua.
Ele abriu um meio sorriso e tirou a parte de cima do meu baby doll, usando a ponta dos dedos para acariciar os meus seios. Joguei o pescoço para trás e ele levou a boca até um dos mamilos, sugando-o com avidez enquanto voltava a afastar minhas pernas e me colocava sentada em cima da mesa.
- Você faz um jogo covarde comigo – ele disse em voz baixa e me fitou outra vez, acariciando as minhas costas.
- Faço um jogo justo – corrigi, abrindo sua camisa preta e dando um beijo de leve no seu peito. – Um jogo que nós dois podemos sair ganhando. Eu sei que você tem todos os motivos do mundo para duvidar de mim, mas estou sendo sincera quando digo que quero apenas o melhor para você.
Ele repousou uma sequência de beijos no meu pescoço e colocou seu membro em minha entrada outra vez, mostrando-me que sua ereção ainda permanecia. Moveu-se para frente e o levou todo para dentro de mim, parando para me olhar nos olhos quando alcançou o fundo, deixando-o lá dentro.
- E esse melhor se chama Tess? – perguntou, enquanto eu corria as mãos por suas costas, puxando-o ainda mais para mim. – Sua sinceridade é bastante tendenciosa.
Eu sorri e beijei seus lábios de leve enquanto ele se movia outra vez, lentamente, tirando o membro duro e encaixando-o de novo. 
- Eu posso te dar tudo, Michael – respondi, gemendo baixo. – E você não é homem de meios termos. A linha entre o melhor e o pior é tênue demais para nos preocuparmos com ela. Posso te dar mil motivos para você me ter ao seu lado, mas não tenho condições de expor meus argumentos agora. Tudo o que eu quero é você.
Seus dedos correram pelo meu rosto, afastando uma mecha de cabelo, e ele me beijou, aumentando o ritmo dos movimentos. Enlacei as pernas atrás dele e gemi alto, sentindo todo meu corpo começar a ebulir outra vez.
Agarrei-me a ele, beijando e mordendo todos os lugares que estavam ao meu alcance, e logo o orgasmo me atingiu novamente, fazendo-me tremer e enfiar as unhas em suas costas. Michael movimentou-se mais algumas vezes, com os lábios pairando sobre o meu queixo, e também me agarrou com mais força, gozando outra vez dentro de mim.
Ele afastou-se lentamente e me fitou, com o rosto quente e vermelho, vendo seu líquido escorrer pelas minhas coxas enquanto respirávamos pesadamente.
- Estou cometendo o mesmo erro pela segunda vez – ele disse, descendo-me da mesa.
- Por ter voltado a transar comigo? 
- Por isso aqui – ele disse arqueando a sobrancelha, usando a parte de cima do baby doll para limpar as minhas coxas. – Eu gozei dentro de você, duas vezes. Eu não deveria ter feito isso.
Eu sorri, ajudando-o a me limpar.
- Não se preocupe. Está com medo de me engravidar? Dizem que o raio não cai duas vezes no mesmo lugar.
Ele parou de mover o pano, voltando a fitar meus olhos.
- Tess...
- Só estou dizendo a verdade, Michael – eu murmurei, notando a dúvida que ele ainda tinha, mesmo depois de ter visto aquela foto. - Não menti para você. Eu realmente fiquei grávida de um filho seu há sete anos. 
- Eu tenho o direito de saber de tudo – ele disse. – Quando você vai me contar?
- Ainda não quero falar sobre o assunto – eu disse, pegando sua camisa no chão. – Respeite o meu tempo e eu contarei tudo a você. Prometo.
Ele assentiu.
- Está bem. – Repousou a mão no meu braço. - Então nosso acordo está mesmo desfeito?
- Acho que sim – respondi e sorri. – Não preciso mais persuadi-lo a me encontrar, preciso? Não trocarei mais sexo por informações. Se quiser voltar aqui mais tarde, e eu tenho certeza de que você quer, estarei te esperando, mas não espere informação alguma em troca. Quando eu me sentir bem o suficiente para falar, contarei tudo, sem esconder absolutamente nada. Preciso ver você sofrer um pouco mais – eu disse e segurei seu queixo, dando um beijo de leve em seus lábios. - Você muito sexy quando está curioso e perturbado.
Michael colocou a camisa de volta, dando-se por vencido. Eu sabia que ele não iria mais insistir naquele momento.
- Tenha certeza de que já estou perturbado o suficiente.
- E quanto à Melodie? – perguntei. – Vocês irão se divorciar?
- Não sei, creio que sim – ele murmurou. – Ela não vai me perdoar. E não sei se quero ser perdoado.
- Oh meu Deus, coitada dela – eu disse e sorri satisfeita. – Aquela sons... – Michael lançou um olhar de censura em minha direção e eu procurei reformular a frase: - Ela deve estar com os olhos inchados de tanto chorar. Deve ter passado a noite inteira revendo o álbum de casamento de vocês, chorando e se perguntando o por quê. Como ela ficou sabendo de tudo tão rápido?
- Não sei. Deve ter sentido o seu cheiro na minha roupa – Michael arriscou adivinhar. – Cheguei tarde em casa e ela só precisou juntar as peças. 
Poxa, então ela teve a capacidade usar a dedução. Ela não era tão sonsa quanto eu imaginava.
- O que ela fez? – perguntei, querendo mais detalhes. - Rasgou as suas roupas e acordou a bairro inteiro com um escândalo? – Era demais acreditar que ela realmente tinha feito isso, mas milagres acontecem.
- Não, ela nunca faria isso – Michael disse com indignação. - A Melodie tem classe. Ela discutiu comigo e fez questão de dizer que você vai acabar com a minha vida.
Eu gargalhei, sabendo que daria qualquer coisa para ter assistido a cena. Uma briga medíocre para terminar um casamento medíocre com uma mulher medíocre. Michael merecia muito mais que isso.
- Eu salve a sua vida – murmurei. – Você deveria me agradecer. Com sete anos de casamento, qualquer outra mulher teria vindo me procurar para olhar nos meus olhos e dizer “fique longe do meu homem”, ou teria acabado com a sua raça quando você chegou em casa. Sei lá, qualquer coisa mais emocionante. Jackson, aquela mulher não merece um homem como você. O melhor que ela pode fazer agora é secar as lágrimas, pegar a bíblia, ir seguir a Jesus Cristo, e se convencer de que a vida continua. 
- As minhas responsabilidades no trabalho continuam também – Michael disse, depois de ajeitar a camisa. – Tenho que ir no escritório. Nos vemos depois.
- Depois quando? – perguntei.
- À noite – ele murmurou, olhando no relógio de pulso.
- Esperarei por você – eu disse com uma piscadela. – Bom trabalho.
- Obrigado – ele disse e sorriu, inclinando-se para me dar um beijo nos lábios.
Balancei a cabeça com incredulidade, tentando adivinhar o que diabos estava acontecendo aqui. Então Michael estava prestes a se divorciar de Melodie, sem se sentir culpado por isso, além de estar me tratando bem, com sorrisos, beijos e abraços. Eu não sabia o que tínhamos nos tornado, sabia apenas que não iria criar expectativa alguma em torno da nossa relação – se é que eu poderia chamar a ligação que tínhamos de relação. No passado eu havia criado incontáveis expectativas e as coisas acabaram muito, muito mal. 
Dessa vez um passo seria dado de cada vez... e, se no fim do caminho, estivéssemos um ao lado do outro, finalmente teríamos a chance de viver o futuro que ficara esquecido em nosso passado.


Capítulo 16

Depois de um dia inteiro de trabalho, Michael realmente apareceu à noite em meu apartamento. Trouxe consigo uma garrafa de vinho tinto e um disco de Louis Armstrong, que ouvimos enquanto jantávamos uma saborosa comida tailandesa que pedi às pressas pelo telefone. Quando terminamos o jantar, depois de jogar bastante conversa fora, o disco ainda tocava, e Michael, empolgado com as taças generosas de vinho, levantou-se e me tirou para dançar. 
- Não sou tão boa com a dança – eu disse e ele agarrou minha mão.
- A modéstia não combina com você, Tess – ele murmurou, puxando-me contra seu corpo. – Além do mais, Lady Shadow era uma ótima dançarina.
- Você nunca irá esquecê-la? – perguntei rindo, deixando ele me guiar ao som de Moon River.
- Claro que não. Você estava bastante sexy de máscara. – Rodopiou de leve e me fez cair em seus braços. – Pensou mesmo que eu não iria reconhecê-la?
- A luz estava fraca – argumentei. – Eu sabia que você iria me reconhecer, mas não sabia que seria tão rápido.
- Desculpe-me pelo Valium– murmurou, com uma das mãos bem firmes em minhas costas. – Eu não iria deixá-la sozinha no escuro, como prometi. 
- Iria cuidar de mim? – perguntei com uma pontada de satisfação.
Ele balançou a cabeça negativamente.
- Não. Na verdade, o dono do bar iria ficar de olho em você até você acordar. Eu só queria lhe dar uma pequena lição. Você estava merecendo, admita.
- Não, não estava – discordei. – Fui educada com você desde que recoloquei os pés em Los Angeles. Educada, simpática, paciente, quase uma Melodie.
Ele estreitou os olhos em censura. Não gostava quando eu tocava no nome dela.
- Você me chantageou – relembrou. – Além de ter sumido com o Blanket.
- Só te dei um pequeno empurrão – eu disse, girando suavemente segurando sua mão e voltando para ele. – Eu sabia que você estava com saudade de mim, mas ainda não tinha enxergado isso, então tive que ajudá-lo. – Mordi o lábio. – Sabe, Michael, nos últimos sete anos, não houve um só dia que eu não pensasse em você. Com raiva no inicio, com certa decepção depois, mas eu sabia que as coisas ainda não haviam sido resolvidas. E depois... quando... – Fiquei em silêncio por um instante, cheia de lembranças, deixando a música preencher o ambiente. – Venha, vamos para o quarto. Tenho uma coisa para lhe mostrar.
Eu o puxei pela mão, levando-o através do corredor para dentro do meu quarto. O mesmo quarto onde, no passado, ele já tinha entrado dezenas e dezenas de vezes. Nada havia mudado na decoração durante aquele tempo; e o ambiente causou certa nostalgia, não só para mim como para ele também.
- Lembro bem daqui – ele murmurou, olhando em volta.
Fui até o guarda roupa, com um pequeno sorriso no rosto.
- Se essas quatro paredes falassem, Jackson, com certeza o relato seria proibido para menores de dezoito anos. – Agachei-me diante da última gaveta e tirei um envelope lá de dentro. Desta vez, a imagem teria que ser suficiente. – Aqui. Abra.
Ele analisou o envelope e o abriu, retirando as folhas que estavam lá dentro. Era uma ultrassonografia, com todos os dados correspondentes a mim, além da assinatura e o carimbo de um médico. Michael observou atentamente as imagens em preto e branco e sentou-se na minha cama, conferindo todos os dados.
- É uma prova suficiente? – perguntei para ele.
Seus olhos continuavam fixos na imagem, e suas mãos, antes tão firmes, agora estavam trêmulas.
- Quantos meses? – ele perguntou com a voz embargada, procurando no papel a informação.
- Seis – respondi, sentando-me na cama também.
Ele mordeu o lábio inferior, com a expressão séria, e levantou os olhos para mim.
- Oh Deus, Therese – murmurou, ainda focalizado na imagem. – Estava completamente formado.
- Estava, sim – confirmei, fazendo com o dedo o contorno do feto no papel. – Um menino, está vendo?
Ele assentiu devagar, aproximando mais os olhos para ver os detalhes.
- Você precisa me dizer onde ele está, Tess - insistiu, tocando minha mão. – Precisa me dizer o que aconteceu com ele. Por favor. Eu tenho que saber.
- Eu prometi que iria lhe contar, e irei, confie em mim – murmurei. – Mas não agora. 
Engoli em seco, sem vontade alguma de prosseguir com as lembranças. Talvez ele não quisesse mais olhar para a minha cara quando soubesse de tudo; e isso poderia destruir todo o nosso progresso dos últimos dias.
- Apenas me diga se... Se ele está vivo. Por favor, isso é o mínimo que você pode me dizer – voltou a insistir, me entregando outra vez os papéis. 
Levantei-me rapidamente, sem querer aprofundar o assunto.
- Não me faça perguntas agora – eu disse, colocando os papéis no envelope novamente. – Vamos deixar isso para depois. – Voltei a guardar o envelope e me sentei na cama de novo. – Nesse momento, tenho outros planos para nós. Poderíamos aproveitar um pouco mais a noite. O que você acha?
Segurei sua mão, tentando dissipar um pouco a tensão do quarto. Empurrei-o lentamente, fazendo-o deitar na cama, e me coloquei em cima dele.
- Acho que ainda estou bastante confuso com isso tudo, mas irei respeitar o seu tempo – ele disse e segurou minha cintura, levantando meu vestido e jogando-o sobre a cama. – Quero que saiba que eu acredito em você, Tess. Você deveria ter me mostrado esse ultrassom ontem, acompanhado por aquela foto no San Pedro.
- Você não estava se comportando tão bem ontem – relembrei. – Ainda estava bastante arredio. – Abri o zíper de sua calça e a retirei, com a meia e os sapatos, deixando-o apenas com a camisa e a boxer vermelha esticada por uma bela ereção. Levantei uma das sobrancelhas e o observei com atenção, deixando um sorriso transparecer nos meus lábios. – Hm Jackson, com essa visão, eu poderia lhe mostrar qualquer coisa que você quisesse. Você é absolutamente gostoso, sabia?
Ele sorriu, colocando-me sentada bem em cima do seu membro rígido. Segurou meus quadris e me moveu ali em cima, ainda sobre o pano, fazendo minha intimidade se esfregar nele.
- Então tire a calcinha – ele sugeriu. – Ela está escondendo a delícia que eu quero ver.
Desci a calcinha ao seu comando e a deslizei pelas minhas pernas, jogando-a no chão. Abaixei a sua boxer, fazendo seu membro enorme e pulsante saltar diante de mim, e me sentei nele outra vez, agora sem nenhum empecilho, deixando-o entrar fundo em mim. Michael gemeu, fitando os meus olhos, e um longo gemido também escapou da minha garganta, enquanto eu começava a me movimentar em cima dele.
A sensação de tê-lo dentro de mim não se assemelhava a nenhuma outra que eu já pudesse ter experimentado. Era simplesmente maravilhosa. Comecei em um ritmo lento, me inclinando para beijar seus lábios, e aumentei o ritmo a medida que vi o prazer se intensificar em sua expressão. Meu corpo inteiro pulsava, pedindo mais dele, e não demorei a alcançar o orgasmo, trazendo Michael comigo. 
O suor começava a descer pelas minhas costas quando desabei sobre seu peito, repousando beijos ali, enquanto ele acariciava os meus cabelos. Inspirei o cheiro da sua pele, levando um pouco de ar para os pulmões, e puxei o lençol sobre nós, entrelaçando minha perna na dele. Tudo o que eu queria era permanecer no calor dos seus braços até o amanhecer.
- Você não precisa ir – eu disse para ele, detestando estar parecendo uma adolescente tola, mas percebendo que eu estava agindo como uma. – Não precisa dormir no Christopher. Fique aqui comigo.
Seus dedos acariciaram minha pele com suavidade, em um toque calmo e delicado.
- O dia vai ser longo amanhã – ele murmurou, sem me dar uma resposta para o convite. - Irei procurar a Melodie e visitar o Blanket.
- Ele deve ter sentido sua falta hoje – observei, lembrando-me do garoto de feições bonitas que enxergava o fiel reflexo do pai a cada vez que se olhava no espelho. - A Melodie também. Mas por ela eu não me comovo nem um pouco. Espero que ela esteja sofrendo, não só pelo fato de estar perdendo você, mas pelo fato de estar perdendo você para mim.
Os dedos dele se moveram por minha pele, com suavidade. Se Michael ficou incomodado com minha observação, não deixou transparecer. Havia questões femininas sobre ego que ele nunca conseguiria compreender.
- Ligarei para ela e perguntarei se podemos conversar – Michael disse. - Ela já deve estar com menos raiva.
- E se ela perguntar sobre mim? Sobre eu e você?
- Direi a verdade.
Mordi o lábio. Verdade? Que estávamos apenas transando, com frequência, ou havia algo mais ali?
- E qual é a verdade? – perguntei.
Ele pensou por alguns instantes.
- Não sei – murmurou e sorriu para mim. – O que você arriscaria?
Acariciei seu peito, levantando a cabeça para olhá-lo nos olhos. 
- Que estamos fazendo muito bem um ao outro – murmurei mordendo suavemente o seu queixo, sentindo-me estranhamente leve. - E acho que isso, Jackson, é um ótimo recomeço. 

_____________________________________________________Sanatório San Pedro, Glendale, sete anos antes

A noite estava fria e chuvosa quando ela se levantou. O silêncio era quase absoluto, rompido apenas pela sua respiração alta e o som da chuva batendo contra o teto. Começou a andar devagar, com as mãos bem fixas na barriga protuberante, sentindo uma dor lancinante se espalhar pelas costas e pelo ventre. Respirou fundo, puxando o máximo de ar, e percebeu que as contrações não duravam mais do que cinco segundos, em um espaçamento de trinta segundos entre uma e outra. Tateou a parede e segurou a maçaneta, atravessando a passos lentos o corredor sem iluminação. Não poderia fazer barulho, mas estava cada vez mais difícil segurar a dor calada. Vez ou outra o clarão de um relâmpago jogava luz para dentro através das janelas gradeadas, mostrando o caminho que ela deveria percorrer. 
- Oh meu Deus – alguém murmurou baixinho, fazendo-a estacar no corredor. – Maria Anna, onde você está indo? Sua cama está ensopada! Não me diga que o bebê já vai...
Therese olhou para trás e viu sua companheira de quarto parada no batente da porta.
- Isso é assunto meu, Lorna – respondeu com rispidez, fazendo muito esforço para falar. – Fique aí. Não venha atrás de mim.
- Só quando você me disser para onde está indo – insistiu, caminhando até ela. 
- Volta para o quarto – ordenou, encarando-a com os olhos mais ameaçadores que a interna já vira. – Saia daqui! Agora.
A interna pensou por alguns segundos, apreensiva, e então entrou novamente no quarto e encostou a porta, assustada demais para tentar chamar algumas das freiras. Therese continuou a caminhar, agarrada nas paredes, sentindo a dor aumentar cada vez mais; arfando e dizendo para si mesma que não se permitiria ser interrompida por mais nada e nem ninguém.
Trêmula, parou no meio do caminho e mordeu o lábio com força para não gritar. O portão de acesso ao lado exterior do sanatório estava trancado, portanto ela não conseguiria ir até lá. Atravessou o corredor e arrastou os pés até o pátio interno, um espaço quadrado que servia como divisória entre os quartos, e que podia ser livremente frequentado pelas internas. O pátio, munido com três bancos, um chafariz e um pequeno jardim, era pequeno e sem cobertura. A chuva ensopou a roupa de Therese enquanto ela caminhava, mas esse era o menor e mais insignificante dos seus problemas. Segurou em um dos bancos e ajoelhou-se diante de uma bem cuidada plantação de camélias, tocando com os dedos a terra úmida e macia.
Suas costas se arquearam quando a dor aguda voltou, mas ela continuou com os dentes fixos nos lábios, convencida a não gritar. Seus joelhos, assim como suas mãos, estavam completamente sujos de terra, e ela sabia que estaria perdida se alguém acordasse no meio da madrugada e a avistasse ali. Puxou mais ar até os pulmões e tentou trabalhar mais depressa, cavando a terra com ambas as mãos. Apertou os olhos com força e sentiu algo mover-se em sua barriga, abrindo espaço, querendo ser expulso de seu corpo, ansiando, insensatamente, vir a esse mundo terrível. Colocou-se de cócoras e se pôs a colocar força para expeli-lo, rindo descontroladamente a cada vez que a dor tentava ser mais forte que ela.
Levou as mãos enlameadas até a parte interna das coxas e continuou a empurrar, com cada vez mais força, preparada para segurá-lo quando ele começasse a sair. Tocou algo com a ponta dos dedos e esperou, respirando pausadamente, sabendo que aquilo estava perto de terminar. Levantou o rosto para a chuva e sorriu com os lábios ensanguentados, dizendo a si mesma que para sempre guardaria os pequenos traços em sua memória; mas, por uma questão prática e justa, não lhe daria tempo nem sequer para chorar. 

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Capítulo 17

Acordei sobressaltada, com a respiração irregular e o corpo banhado de suor. Sentei-me na cama rapidamente e puxei os lençóis até encobrir os joelhos, esperando que a onda interminável de tremores de abandonasse. Minhas mãos não tinham coordenação alguma, e minha garganta estava seca, quase fechada, tornando a simples passagem de ar difícil e desconfortável.
Era sempre daquela forma. Sempre. Sempre. Desde o internato. 
Aquele sonho se tornara tão habitual que eu já memorizara cada detalhe. Sempre o mesmo. O choro da criança irrompia em meus ouvidos, claro e assustador, enquanto eu terminava de arrancá-lo de dentro de mim e o jogava em uma cova no jardim, usando montes de terra úmida para calar a sua boca. O sono sempre era interrompido depois disso, e eu ficava trêmula e ofegante, molhada de suor, apertando os olhos para tentar exterminar aquela cena horrível da cabeça. O terapeuta do San Pedro tentou acabar com esses pesadelos, ajudando-me a tentar compreendê-lo, mas, após várias sessões exclusivamente para tratar desse assunto, os resultados foram insignificantes. Eles sempre voltavam. Cada vez mais reais. E com cada vez mais frequência.
Desviei os olhos para o lado e vi Michael me observando, em silêncio, aparentemente confuso com aquele comportamento tão estranho e repentino. Sentou-se na cama também, apoiando as costas nuas na cabeceira, e tocou os meus cabelos revoltos e molhados pelo suor.
- Está tudo bem – sussurrou para me tranquilizar, mas nem ele mesmo tinha certeza disso. – Estou aqui, Tess. 
Puxei um pouco de ar e usei a língua para umedecer os lábios trêmulos e secos. Fechei os olhos e inspirei profundamente.
- Foi só um pesadelo, sim? – ele disse, quando percebeu que eu não falaria nada. – Já passou.
Balancei a cabeça, ainda tentando expulsar aquelas imagens, e esforcei-me para controlar a respiração. Mantenha-se firme, murmurei para mim mesma. Michael estava ali, testemunhando toda aquela angústia, e parecer uma garotinha trêmula em sua presença seria a última coisa que eu poderia desejar.
- Gostaria de falar sobre isso? – ele perguntou para mim após alguns minutos de silêncio.
- Sobre isso o quê? – perguntei, jogando o lençol para o lado e levantando-me da cama. As pernas estavam hesitantes, mas eu não poderia deixá-lo perceber, então caminhei nua até o espelho, com o máximo de firmeza. – Como você mesmo disse, foi só um pesadelo. Apenas isso. Um pesadelo insignificante.
Ele estreitou os olhos em minha direção.
- Tem certeza?
Eu não tinha nenhuma. Aquele pesadelo poderia ser tudo, menos insignificante. Ele estava carregado de uma angústia tão grande e tantas complexidades que eu não poderia simplesmente esquecê-lo. Algo dentro de mim dizia que era aquilo que eu deveria ter feito, sete anos antes, para acabar de uma vez por todas com aquilo. Uma parte de mim realmente queria ter jogado aquele bebê dentro de um buraco, o enterrado e fingido que ele nunca havia existido. Essa parte de mim mesma era realmente horrível; e não era nada fácil lutar contra ela. Meu coração tinha uma parte podre, uma maldita parte podre, corroída por sentimentos cruéis e mesquinhos que poderiam me arrastar para um abismo sombrio e sem fundo.
- Thesere? – A voz de Michael recobrou minha atenção. – Tem certeza?
Revirei os olhos, olhando meu reflexo pálido diante do espelho.
- O que é isso agora? – perguntei, dando de ombros. – Um interrogatório? Prefiro sua voz me fazendo outro tipo de perguntas, caro Jackson – murmurei de forma sugestiva, tentando quebrar aquela tensão. – Estou indo pro banho. Você poderia providenciar o nosso café da manhã, o que acha?
Preferi não esperar uma resposta. Eu estava me esforçando para parecer tranquila e relaxada, mas por dentro eu estava completamente desestabilizada pelo maldito sonho. Caminhei até o banheiro e deixei Michael ali em cima da cama, curioso e pensativo, com a cabeça pendida no travesseiro. 

* * * * *

Era difícil pensar sobre o assunto. 
Falar sobre ele, transformar as lembranças em palavras, era ainda pior para mim. A gravidez trouxe consigo toda uma carga de novas experiências, com as quais não lidei da forma como deveria. Talvez as coisas tivessem sido diferentes se Michael não tivesse se envolvido com Melodie, se eu não tivesse sido mandada para o internato, se tivéssemos permanecido juntos, se tudo não tivesse terminado de uma maneira tão terrível entre eu e ele, se eu não tivesse sido tão egoísta... se, se, se. Os últimos anos tinham sido uma sucessão de “ses”, de possibilidades frustradas, de planos que não deram certo. Pensar nisso não me fazia muito bem.
Depois do banho, enfiei-me na primeira roupa que encontrei no armário e segui para a cozinha, onde Michael estava terminando de fazer torradas. Preenchi uma xícara com o café preto recém preparado que estava em cima da pia e sentei-me em uma das cadeiras, fixando o olhar no vapor subia lentamente, espalhando um agradável aroma pela cozinha.
- A gravidez foi terrível – eu disse sem tirar os olhos do vapor, sabendo que se não falasse sobre aquilo naquele momento, iria morrer engasgada com as palavras presas na garganta. Respirei fundo e me preparei para contar o que eu havia guardado tanto tempo. – Absolutamente terrível. Tive dores insuportáveis, que apertavam minhas entranhas como se o feto estivesse dando nós dentro de mim. E também tive muito ódio. Ódio de você, por ter preferido ficar com a Melodie, ódio daquele bebê, por estar crescendo mais e mais a cada dia, ódio das circunstâncias, por aquela gravidez completamente indesejada não ter sido interrompida com o tiro que você me deu. Eu não queria mais nada, nada de você. Depois daquela noite no seu apartamento, eu queria vê-lo morto, Michael. 
Ouvi uma cadeira sendo arrastada e deduzi que Michael havia sentado ao meu lado. Seus olhos deviam estar sobre mim, mas eu não iria fitá-los, não se quisesse concluir toda a história. Minhas mãos apertaram ainda mais a xícara, enquanto as lembranças começavam a fluir, e ele apenas esperava, sabendo que eu iria prosseguir.
- Eu queria vê-lo morto – repeti, colocando a xícara na mesa e passando a ponta dos dedos lentamente pelas bordas. - Mas por ironia do destino, você estava mais vivo do que nunca através daquele filho. Nosso filho. Ele me fazia recordar de você todos os malditos dias, e o que eu mais desejava, Michael, dia após dia, era matar aquela parte de você.
“Pensei em fazer um aborto. Essa foi a primeira ideia, mas não consegui levá-la adiante. Naquele lugar abortar não seria tão fácil, e a criança já tinha se mostrado forte desde a mesa de cirurgia, quando mesmo com a hemorragia provocada pela bala alojada no tórax, ele tinha se mantido no útero. Ele queria nascer. Então percebi que seria mais fácil me livrar dela depois do parto. Tive mil e uma ideias durante todos aqueles meses. Eu me divertia muito calculando uma forma de acabar com ela. Parece terrível, eu sei. Mas era o que eu sentia. Era o que eu pretendia fazer, com plena convicção... até o dia do parto.
“O parto foi tão terrível como todo o resto. Quando tive as dores, alguns dias antes do previsto, não chamei ninguém, absolutamente ninguém. Fui para o banheiro e a Lorna me encontrou, caída ao lado do vaso sanitário em uma poça de água e sangue, terminando de expelir o bebê. E ele não chorou, nem sequer soltou um grunhido. Pensei que estava morto. Era pequeno e mole, mas quando o peguei nos braços, percebi que estava respirando. A Lorna gritou pelas freiras, apavorada, e em menos de um minuto elas estavam no banheiro, querendo a todo custo me tirar o bebê. Foi então que ele começou a chorar, aos berros, apertando os olhos e se debatendo. Reservei minhas últimas energias para apertá-lo contra mim... enão o soltei. Não sei que tipo de força foi aquela que me fez segurá-lo, sei apenas que ela estava lá, me obrigando a mantê-lo perto. Ele parecia tão... frágil. Tão dependente de calor, tão dependente do afeto que eu nunca, nem sequer um minuto, tinha lhe dado durante aqueles nove meses. Olhando para aqueles traços pequenos ele parecia tão puro que eu não conseguia entender como um ser como aquele tinha saído de dentro de mim. E naquele momento, Michael, naquele exato momento, olhando para aquele rosto, com o choro dele ecoando pelo banheiro, eu só pensei na pessoa verdadeiramente horrível, egocêntrica e egoísta, extremamente egoísta, que eu era. Uma pessoa que nunca, nunca foi capaz de amar ninguém. Naquele instante, com aquele bebê no colo, eu conheci algo que sempre achei patético e inútil, chamado amor de mãe. Amor pela sua cria, sabe? Um sentimento absolutamente instintivo Algo que eu nunca recebi, já que Angeline vivia entupida de remédios, e que nunca pensei que poderia sentir. Um amor enorme e inexplicável, que o Donald me ofereceu desde o meu próprio nascimento, mas que eu nunca achei suficiente, nunca fui capaz de reconhecer. Eu tive dimensão de que o problema não eram as pessoas, o problema era eu, eu e a pessoa de merda que sempre fui. Desde criança, eu tinha a capacidade de me colocar no centro do mundo e esperar que todos girassem ao meu redor. Eu não sabia o que era amar outra pessoa. Nem sequer você, que é o único homem por quem eu me deixei envolver de verdade, havia me ensinado isso, Michael. Eu conhecia a paixão, esse sentimento súbito que nos faz se sentir atraído por alguém, mas que também é egoísta, porque nos faz querer ter posse sobre alguém. O amor, esse sentimento que liberta, eu não conhecia até aquele momento.
“Eu tinha o direito de ficar com o Woody por seis meses, enquanto durasse a amamentação. Depois disso, ele seria encaminhado para um abrigo onde ficaria sob a tutela do Estado... ou seria encaminhado para você, se eu tivesse contado que ele tinha um pai. Mas eu não contei. Disse que éramos apenas eu e ele, ninguém mais. Eu sabia que você iria cuidar dele, que iria aceitá-lo em sua casa, em seu lar feliz, dar a ele todo o amor e carinho, criá-lo com a Melodie, enquanto eu apodrecia naquele internato, sem saber exatamente quanto tempo levaria para ter de volta minha liberdade. Era o certo, eu sabia, mas no fim das contas meu egoísmo falou mais alto outra vez. Meu egoísmo não permitiu que o Woody fosse cuidado por você, o pai dele, odeie-me se quiser. Eu também não poderia deixá-lo ir para um abrigo qualquer do estado, porque eu tinha medo de que o maltratassem ou coisa parecida. Então, a Lorna me deu a solução. Os avós dela, que costumavam visitá-la sempre, se propuseram a cuidar do bebê até a minha saída definitiva do internato, ou até mesmo depois disso se eu concordasse. Ainda tenho alguns meses de terapia antes da sentença final, e então veremos como as coisas irão ficar. Eles moram em Glendale mesmo, e no período de internação, eu conseguia visitá-los duas vezes por ano. Agora tenho ido todas as semanas. O Woody é uma criança incrível, Michael. Incrível. E o senhor e a senhora Oliver são duas pessoas simplesmente maravilhosas. Nunca terei o suficiente para agradecê-los por esses sete anos, nunca.”
Levantei os olhos até Michael e finalmente me permiti fitá-lo. O vapor havia desaparecido da xícara e o café estava gelado, intragável provavelmente. Empurrei a xícara e Michael colocou a mão sobre a minha, prendendo meu olhar no seu. Havia lágrimas em seus olhos e percebi que também havia nos meus. Não me importei em parecer fraca. Puxei-o para perto de mim e ele me abraçou forte, deixando minha cabeça repousar em seu ombro, enquanto eu chorava sem censura alguma a meus próprios sentimentos. Ensopei sua camisa com as minhas lágrimas, apertando-o contra mim, sem saber ao certo por que eu chorava, apenas dando vazão aquela sensação horrível, aquele buraco dentro do meu peito, aquele certeza de que tudo poderia ter sido diferente. Mas lá estava o “se” novamente, mostrando que as coisas nem sempre – na verdade quase nunca – acontecem da forma como nós desejamos.
- Woody – Michael disse afagando suavemente minha cabeça, fazendo certo alívio tomar conta de mim. – Woody. Tenho um filho chamado Woody. – Ouvi um riso baixo em sua voz. – Oh meu Deus, Therese. Sei que as coisas terminaram de uma forma absolutamente desastrosa entre nós. Eu atirei em você, forçado pelas circunstâncias claro, mas não posso me eximir da minha parcela de culpa nessa história. Depois que você foi internada, eu procurei riscá-la da minha vida, como se nunca tivesse existido, casei-me e construí uma família enquanto você passava por tudo isso. Nunca pensei que você pudesse estar grávida. Nunca me importei com as consequências do nosso relacionamento. Woody – repetiu. – Meu Deus.
Apertei meu rosto contra os seus ombros e apertei os olhos, esforçando-me para conter as lágrimas. Respirei fundo, ainda agarrada a ele, e mordi o canto da boca, sem conseguir dizer mais nada.
- Tess, preciso de mais algumas respostas – Michael disse e tocou meu queixo, fazendo-me fitá-lo. – Você não poderia simplesmente ter entregado a criança para os avós da outra interna – murmurou, com toda a certeza de um advogado. - Um longo processo deveria ter sido aberto para saber com quem a criança iria ficar no caso de uma adoção.
Eu também sabia disso. Limpei o rosto e repousei as mãos na mesa.
- A vaca da Madre Melburn – murmurei. – Ela autorizou a adoção sem qualquer requisito legal.
Michael levantou as sobrancelhas. Estávamos diante de um crime ali.
- Por quê? – quis saber. – Ela gostava tanto assim de você? – indagou com dúvida.
- Oh não. - A pergunta me fez sorrir. – Ela sempre me detestou. Ela detesta todo mundo, na verdade. Falta de sexo. – Levantei as sobrancelhas. – Ou não.
- É sério, Tess – Michael insistiu. – Não brinque.
- O que quero dizer é que talvez o mau humor dela não seja por falta de sexo, porque sexo é algo que não falta na vida dela. – Observei a expressão confusa de Michael e tentei ser mais clara. – Os padres e bispos, Michael. Eles sempre apareciam lá para supervisionar o trabalho que estava sendo realizado no San Pedro. Você pode imaginar o que acontecia lá. Não com todos, porque muitos eram honestos, nem com todas as freiras, mas acontecia frequentemente. Alguns deles até mesmo forçavam as internas, aquelas que eram suficientemente loucas para não saberem o que estava acontecendo. Tentaram fazer isso com a Lorna. E quando eu descobri, prometi a Madre Melburn que jogaria toda a merda no ventilador se ela se negasse a me ajudar. Foi assim que consegui entregá-lo para os Oliver e visitá-lo duas vezes por ano.
- Esses filhos da puta tentaram fazer algo desse tipo com você? – perguntou com firmeza.
Sorri. Ele parecia bastante preocupado.
- Não sou suficientemente louca para não saber o que estava acontecendo – murmurei. – Comigo não aconteceu.
- Tenho que conhecer meu filho – ele disse me fitando. – Você precisa me levar até ele.
- Tudo bem, podemos ir até lá – concordei. – Diremos que você é meu namorado e quis me acompanhar na visita.
- Não – discordou balançando a cabeça negativamente. – Não. Diremos que sou o pai dele. Chega de mentiras, Therese.
- Não podemos simplesmente jogar uma informação como essa no colo do garoto – eu disse, tentando dissuadi-lo daquela ideia absurda. – Ele não sabe, Michael. Ele não sabe, ok?
Michael franziu a testa e endureceu os olhos em minha direção, compreendendo minha negativa em dizer a verdade.
- Você está querendo me dizer que ele não sabe que você é mãe dele? – murmurou. – Ele acha que é filho dos avós da Lorna? Você permitiu que mentissem para ele esse tempo todo? É isso?
- Não é bem assim – eu disse colocando a mão em seus joelhos e fitando seus olhos. – Ele sabe que é adotado, mas não sabe que é meu filho. – Michael balançou a cabeça negativamente em desagrado e eu tentei me explicar. - Ele me adora, Michael. Fica muito feliz quando vou visitá-lo. Mas, porra, como eu poderia dizer a verdade? Eu não poderia, não posso, simplesmente chegar lá e dizer “oi Woody, eu sou sua mãe, mas ainda não posso ficar com você porque sou uma condenada da justiça. Mas não se preocupe, querido, porque quando eu estiver completamente livre irei tirá-lo desse lar cheio de amor e levá-lo para morar comigo, mesmo não tendo a mínima ideia de como se cuida de uma criança.”
- Quando você pretende contar para ele? – Michael perguntou com a voz firme, ignorando meu pessimismo. Correu os olhos pelo meu rosto e estreitou os olhos em dúvida e censura quando permaneci em silêncio. – Não, Therese. Não. Não me diga que você não pretende contar a verdade para a criança. Pretende esconder isso dele para sempre?
- Eu não sei, tá? – murmurei me levantando, odiando o tom de acusação em sua voz. – Coloque-se no meu lugar, Michael. Acha mesmo que eu tenho alguma condição de cuidar de uma criança? Pelo amor de Deus, olhe para mim. Sou como o rei Midas, mas tenho o poder de transformar em merda tudo aquilo em que coloco as mãos. Eu destruo tudo ao meu redor, sempre foi assim. Deixei que meus pais morressem, quase acabei com a sua vida, meti um tiro na Melodie, até a minha licença para advogar eu consegui mandar para o espaço. E o pior, eu não consigo me arrepender! Não consigo. O Woody não merece uma mãe como eu. Eu o amo, o amo com todo o meu coração, mas não posso dizer a verdade para ele. Não me peça isso, por favor.
Os olhos de Michael estavam nublados quando ele também se levantou, aproximando-se de mim. 
- Pare – murmurou e segurou meus braços, puxando-me com força. – Pare com isso, Therese. Não vê o mal que está fazendo para si mesma? Você colocou na cabeça que é essa mulher horrível, incapaz de se arrepender das coisas que faz, mas eu sei que esse não é o único lado do seu coração. Eu acredito em você. Acredito que você pode, sim, ser uma mãe maravilhosa. – Ele me apertou contra si e me abraçou forte, preenchendo-me com aquele calor que só ele me fazia sentir. Colocou uma das mãos atrás da minha cabeça e sorriu contra os meus cabelos. – Oh meu Deus, Tess. Oh meu Deus. Você tem medo. Medo de descobrir que no fundo é uma mulher frágil que adoraria assistir filmes de romance e colecionar papéis de carta – murmurou, fazendo-me lembrar que tinha dito exatamente aquilo na primeira noite que passamos juntos. 
- Frágil? – eu disse e empurrei seu peito de leve, com força suficiente apenas para fazê-lo rir ainda mais. – Não me confunda com a Melodie. Ela que gosta desse tipo de coisa. Qual é o filme preferido dela; Casablanca?
Michael segurou meu rosto e me obrigou a fitá-lo, repousando uma sequência de beijos nas minhas bochechas molhadas.
- Você me levará até o Woody – murmurou com a voz decidida. – Não vamos fazer planos agora, quero apenas conhecê-lo. Leve-me até ele e conversaremos sobre o resto depois. Leve-me até ele. Ainda hoje.
Assenti, achando aquele um acordo justo.
- Está bem, mas tenho que ligar para os Oliver antes. Maldição, Jackson, você está me deixando nervosa também. Acalme-se. Preciso de um tempo para avisá-los da nossa visita.
- Ok, mas lembre-se de que tenho pressa – murmurou. – Preciso mesmo conversar com a Melodie, ela já deve estar esperando por mim. E preciso ver o Blanket. – Sorriu outra vez. - Ele vai amar saber que tem um irmão.
Repousei um beijo em seus lábios e também consegui sorrir, ainda presa em seus braços. Eu já não sabia quem era Therese Brown, sabia apenas que, fosse como fosse, talvez ela realmente merecesse uma segunda chance.


Capítulo 18

Era estranho para Michael voltar para casa e sentir que já não fazia mais parte daquele lugar. As coisas haviam mudado tão rapidamente que ele ainda não conseguia acreditar que aquilo estivesse realmente acontecendo. Vivera momentos felizes ali, que sempre seriam lembrados com muito carinho, mas estava na hora de fechar aquele capítulo da sua vida. Nunca pensou que seu casamento terminaria daquela forma – com ele se deixando envolver outra vez por Therese Brown – e essa era mais uma prova de que nunca podemos prever quantas voltas o mundo dará; nem onde ou como estaremos em cada uma delas.
Foi recebido por uma das empregadas na porta e encontrou Melodie na varanda da sala de estar, observando o jardim pela janela entreaberta. Ainda tinha as chaves da casa, claro, mas não se sentiu nenhum pouco confortável em fazer uso delas. Aquele lugar parecia pertencer a Melodie agora, e mesmo tendo morado ali por tanto tempo, já não sentia que aquele era seu lar.
- Olá – ele disse e aproximou-se, sem saber ao certo o que dizer. Não era uma situação agradável, e ambos sabiam disso.
- Michael – Melodie disse e virou-se em sua direção, sem lhe oferecer lágrimas e nem sorrisos. Analisou-o com o olhar, perscrutando seu rosto lentamente. – Você parece... muito bem.
A observação o deixou mais desconfortável ainda. Deveria parecer triste? Acabara de descobrir que realmente tinha outro filho, e mesmo que sua vida estivesse uma completa bagunça, não conseguia esconder sua felicidade.
- Você também parece – murmurou. E parecia mesmo, apesar de bem mais fechada do que o habitual. – Onde está o Blanket? 
- Foi dar uma volta no parque – ela disse e saiu da varanda, caminhando até o sofá. – Pedi para a Emma levá-lo até lá, assim podemos conversar melhor. Espero que ninguém resolva sequestrá-lo outra vez.
A acidez da frase fez Michael morder o lábio. Sabia que ela se referia a Therese.
- Como ele está?
- Bem – disse e se sentou. – A febre não voltou. – Cruzou as pernas e colocou as mãos sobre os joelhos. Michael percebeu que a aliança não estava mais ali. – Bom... Presumo que você e a Therese...
Melodie o fitou, sem completar a frase. Michael sentou-se ao seu lado e anuiu suavemente. Havia uma certeza nítida em seu tom de voz, Michael logo percebeu. Ela já sabia a resposta antes mesmo de perguntar.
- Pois bem, vamos fazer o que deve ser feito – Melodie murmurou. – Pode providenciar os papéis, assinarei o que for necessário. Quanto ao Prince, teremos que conversar a respeito. Não permitirei que aquela mulher se aproxime dele. Faça o que quiser da sua vida, mas não envolva nosso filho nisso.
Michael podia compreender sua angústia suficientemente bem, levando em conta a forma como Therese sempre se comportara. Mas estava disposto a dar uma chance para ela, para os dois, e isso implicaria deixá-la próxima ao seu filho. Parecia loucura, mas ele sabia bem o que estava fazendo.
- Tem alguma objeção à guarda compartilhada? – Michael perguntou.
- Todas – Melodie respondeu com um levantar de sobrancelhas. – Não quero a Therese perto do nosso filho. Se decidirmos compartilhar a guarda do Prince, você permitirá que ela se aproxime dele, sei que vai. Não vou compactuar com isso, portanto, pretendo ficar com a guarda dele. Você poderá visitá-lo, sozinho, nas datas que o juiz estabelecer. 
Não, ela não poderia estar falando sério. Queria que ele tivesse data e hora marcada para visitar seu próprio filho? Jamais concordaria com isso. Sabia que o próprio Blanket detestaria essa possibilidade.
- Não, absolutamente não – discordou. – Mel, por favor, em consideração a tudo que vivemos juntos, vamos fazer isso de uma maneira amigável. Não quero entrar em uma batalha judicial com você. Você sabe melhor do que ninguém que eu nunca entro em uma para perder. 
Melodie franziu os lábios e endureceu o olhar. Estava lidando com o advogado ali, não com o Michael que vivera tantos anos.
- Brigaremos judicialmente – murmurou com firmeza. – Você pode ser um dos melhores advogados dessa maldita cidade, pode ter todos os contatos e todo conhecimento sobre o assunto, mas eu sei o que é melhor para o meu filho. Você conhece bem a Therese, Michael. Pelo amor de deus, está ficando louco? Ela pode fazer mal ao Prince e qualquer juiz concordaria comigo nesse ponto.
Michael inclinou-se para frente e tocou a mão de Melodie. Teria que fazê-la entender.
- Mel, me escute. Eu sou pai dele e o amo tanto quanto você. Se eu não acreditasse que a Therese é plenamente capaz de conviver o Blanket sem lhe fazer nenhum mal, eu seria a primeira pessoa a querer mantê-la o mais longe possível dele. Você não precisa confiar nela, apenas confie em mim. Por favor, confie em mim. A Therese precisa de uma chance, de um voto de confiança, e eu sei que isso parece absurdo, mas você precisa entender.
Sua expressão continuou impassível. Michael entrelaçou os dedos nos dela e se aproximou mais um pouco.
- Não. Absolutamente, não.
- Eu e a Tess temos um filho – ele murmurou, sem nem mesmo prepará-la antes. Sabia que não havia forma sutil de dar uma notícia com essa. – Ela estava grávida quando foi internada. 
- O quê? – Melodie perguntou chocada quando ouviu aquelas palavras. – Grávida? 
- Sim, ela estava grávida. 
- Oh meu Deus, Michael, você já sabia disso? – perguntou em tom de acusação. – Sabia disso o tempo todo?
- Não – apressou-se em lhe dizer. - Eu não sabia de nada, até ela voltar e contar o que aconteceu. Ela também é mãe, Mel, e pode dizer o que quiser dela, mas sei que ela ama essa criança. Não posso deixá-la sozinha nessa, não outra vez. Por muito tempo considerei Therese uma lembrança morta e enterrada, mas agora ela voltou e eu descobri que desconhecia uma parte importante da minha própria vida. Não sei se você consegue compreender.
A surpresa atravessou o rosto de Melodie, fazendo sua expressão se desanuviar. Deveria ficar arrasada com aquele fato, ou até mesmo com raiva daquele inesperado golpe do destino, mas sua primeira reação foi ficar feliz por Michael. Por Deus, como poderia se entristecer? Ele sempre quisera ter mais filhos e, mesmo com Therese sendo a mãe, podia se sentir contente com aquela notícia.
- Michael... Eu não podia imaginar. Um filho... Caramba. Tem certeza do que está me dizendo? Quero dizer, tem certeza mesmo? Certeza absoluta?
Ele assentiu, deixando um sorriso transparecer em seus lábios.
- Tenho – ele confirmou. – Mas ainda não o conheço. Ele vive com um casal de idosos em Glendale e segundo a Tess ele é um garoto incrível, e... e eu estou simplesmente apavorado. – Os dois sorriram baixo. - Pode me entender?
Ela apertou sua mão, sentindo-o tremer.
- Eu... Bom, acho que lhe devo parabéns. Isso é... maravilhoso. De verdade. Mesmo. Estou feliz por você.
Michael a abraçou, puxando-a para seus braços. Acariciou seus cabelos e a fitou, descendo uma das mãos para seu rosto.
- Eu sinto muito – ele disse. - Muito mesmo, Mel. Sinto muito pelas últimas semanas, por não ter sido honesto com você. Eu sempre a respeitei e sempre a amei, mas acho que era um tipo diferente de amor. Pode me entender? 
- Oh não, Michael, não me venha com essa – ela disse balançando a cabeça negativamente, sabendo que aquele era o típico discurso de consolação feito pelo homem quando queria se ver livre do casamento. – Não. Não preciso ouvir isso.
- Estou falando sério – Michael disse com sinceridade. - Lembre-se de quando nos conhecemos. Você foi a primeira mulher com quem eu queria muito mais que sexo. Eu adorava conversar com você, adorava a sua companhia, adorava você, simplesmente você. Eu a admirava muito, Melodie, e esse sentimento não mudou nada nos sete anos que ficamos juntos. Você é uma mulher incrível e muito especial, a quem eu devo muito. Não quero que nosso casamento termine com um mal estar. Não seria justo conosco. Não quero perder você, porque isso significaria perder uma parte maravilhosa da minha vida. Diga-me que podemos ser amigos. 
Ele a fitou, com os olhos marejados. Melodie acariciou sua mão e sorriu, abraçando-o mais uma vez. Permaneceram daquela forma por algum tempo, juntos, apenas sentindo o calor um do outro. Desde que se conheceram, os abraços sempre disseram mais do que os beijos, e isso devia significar alguma coisa.
- Você sempre foi dela, não e mesmo? – Melodie murmurou quando se afastaram. – Sempre. Eu nunca tive você de verdade, não da forma como deveria ter sido. Os últimos sete anos foram os melhores da minha vida, justamente pela maneira como sempre nos entendemos e nos apoiamos. Não darei lugar a ressentimentos, nenhum de nós dois merece isso. Nunca me lembrarei de você como meu ex-marido, Michael. Você significa muito mais, tenha absoluta certeza. 
Os dois sorriram um para o outro e ouviram passos apressados correrem pela sala, enquanto Blanket aproximava-se e se jogava no colo de Michael, deixando Emma parada na porta.
- Pai! – disse com empolgação.
Michael o abraçou e o apertou em seus braços, muito feliz em vê-lo ali. Estava morrendo de saudades do filho.
- Oh Blankie – murmurou e levantou-se, ainda com o filho nos braços. – Que saudades de você, garotão. Como você está?
- Senti sua falta – disse e apoiou a cabeça em seus ombros. – Você voltou para casa? Vai ficar com a gente de novo?
Melodie e Michael se entreolharam, sabendo que aquela seria mais uma etapa importante.
- O papai vai ter uma nova casa – Michael disse, sentando-se outra vez e colocando Blanket no colo. – A mamãe vai ficar aqui, o papai vai ficar nessa outra casa, e você vai ter dois lugares para morar. Você terá duas casas, dois quartos, e livros e brinquedos em dobro. O que me diz disso?
Ele estreitou os olhos.
- É legal. Mas como eu vou ficar nas duas casas ao mesmo tempo?
Michael sorriu.
- Não será ao mesmo tempo – explicou. – Você vai ficar um tempo lá e um tempo aqui. Entendeu?
- Ah – disse. – Entendi.
- E tem outra coisa – Michael murmurou.
- Diz.
- O papai descobriu que tem outro filho, Blankie. Ele é só um ano mais velho do que você. Vocês vão poder brincar juntos, vai ser legal. Você sempre me disse que queria ter um irmão, não é? Agora você tem um.
- Um irmão? – Ele sorriu, contente com aquilo. – Maneiro, pai. Onde ele está? Eu posso brincar com ele agora? – perguntou saltando do seu colo. – Quando a mamãe ficou grávida dele?
Michael apertou de leve a ponta de seu nariz.
- Hm... ele não é filho da mamãe – disse um pouco desconcertado. – A mãe dele é a Therese. Lembra-se dela?
Blanket assentiu.
- Lembro. Ela é estranha, pai. E o senhor disse que ela não era uma boa pessoa.
Michael sorriu.
- Sei que disse. Ela está melhorando agora. O papai irá ajudá-la. – Puxou Blanket para o seu colo outra vez. – Você ainda não pode brincar com seu novo irmão, mas poderá logo, logo. – Apoiou a cabeça de Blanket no peito e beijou sua testa, sentindo que as coisas começavam a entrar nos eixos. – Eu amo você, tá? Muito. Muito mesmo.
- Muito quanto? – Blanket perguntou.
- Muito do tamanho do céu – respondeu.
- Só isso?
Michael gargalhou.
- Tá bem, muito do tamanho do céu, com as estrelas, o sol, e a lua.
- E as nuvens?
- As nuvens também.
Blanket o fitou e deu um beijo em seu rosto.
- Eu te amo também, pai. Do tamanho disso tudo.
Michael puxou Melodie para perto deles e partilharam um abraço a três, sabendo que mesmo com a separação, nunca deixariam de ser uma família. As coisas mudariam, certamente, mas Melodie e Blanket nunca, jamais, em hipótese alguma, deixariam de ser duas das pessoas mais importantes e especiais de sua vida.


Capítulo 19

Naquela tarde, quando pegamos a estrada para Glendale, era bastante nítido que Michael estava muito mais nervoso do que eu. Fiz questão de dirigir até lá, o que era absolutamente sensato levando em conta toda sua ansiedade, e tentei acalmá-lo quando paramos em frente da casa dos Oliver. Eles moravam um pouco afastados da cidade, em uma casa branca rodeada por gramíneas verdes, com direito a cerca de madeira pintada de azul e branco. Os dois estavam na porta esperando por nós, com uma expressão amistosa no rosto, e quando eu e Michael descemos do carro para encontrá-los, quase tive que segurar suas mãos para ajudá-lo a disfarçar o quanto estavam tremendo.
Os avós da Lorna eram pessoas realmente especiais, ambos com pouco mais de sessenta anos. Em todos aqueles anos que cuidaram de Woody, nunca exigiram nada em troca, embora eu me preocupasse em mandar algum dinheiro para auxiliá-los no pagamento das contas e nas despesas em geral. Eram pessoas de bom coração que se apaixonaram por Woody desde a primeira vez que colocaram os olhos nele, em uma visita ao internato. E o sentimento era recíproco, a julgar pelo sorrisinho que ele abriu quando a senhora Oliver me pediu para pegá-lo no colo, quando ele não tinha mais do que cinco meses.
- Fique calmo – eu disse para Michael, enquanto caminhávamos até a porta, reprimindo um sorriso. – Lembre-se de que você é um advogado, Jackson. Mantenha-se firme. Na faculdade eles nos preparam para isso.
Michael ajeitou a aba do chapéu e desviou os olhos para mim, com uma fina camada de suor cobrindo a testa.
- Pode imaginar como eu me sinto? – perguntou com um sussurro. – Este é um dos momentos mais importantes da minha vida. Eu não conse... – Calou-se ao perceber que tínhamos chegado diante da porta, onde um casal sorridente de meia idade estava olhando diretamente para nós.
- Tess, minha filha – a senhora apressou-se, me dando um abraço. – É bom ver você.
- Digo o mesmo – respondi com um sorriso, abraçando o senhor Oliver também. - Como eu disse ao telefone, trouxe uma visita especial para o Woody. – Apontei para Michael e quase sorri outra vez pelo seu nervosismo. - Esse é o Michael.
- Oh Michael, prazer – a senhora Oliver disse e sorriu, apertando sua mão. – Hm... Conhecemos você da TV.
- Sim, sim – o senhor Oliver confirmou, cumprimentando-o também. – Aquele programa sobre investigação policial, já vimos uma entrevista sua nele, como é mesmo o nome, mulher? – perguntou virando-se para sua esposa.
- Criminal... Não. Investigação...
- Investigação criminal? – interveio o senhor Oliver outra vez.
- Ah não, com certeza não, mas não importa. – A mulher fitou Michael outra vez e sorriu. – É um prazer conhecê-lo.
- O prazer é todo meu – respondeu Michael.
- E o Woody? – perguntei, sabendo que os dois poderiam ficar o resto da tarde conversando sobre o tal programa. – Onde ele está?
- Oh sim, está lá dentro – a senhora disse. – Entrem, por favor. Ele está no quarto. Vou avisar que vocês chegaram.
Balancei a cabeça negativamente. 
- Não, não é preciso. Se nos permitirem, poderíamos ir até lá.
Os dois assentiram e, assim que eu e Michael nos colocamos para dentro, conduziram-nos educadamente até a porta do quarto de Woody. Estava entreaberta, revelando uma parede pintada de azul, e assim que dei o primeiro passo em direção ao quarto, senti um pequeno aperto na garganta. Apesar de estar controlando bem o nervosismo, eu estava tão ansiosa quanto Michael.
- Deixaremos vocês conversarem a só com ele – o senhor Oliver murmurou. – Mas Therese... Lembre-se do que falamos ao telefone. Não é o momento para...
- Eu sei – respondi assentindo, sabendo de toda apreensão a cerca daquela visita. Ainda não era hora de contar que éramos seus pais, e o próprio Michael concordava com isso. - Podem ficar tranquilos. Não tocaremos no assunto.
- Muito bem – murmurou a senhora Oliver. – Fiquem à vontade. 
Sorri e segurei a mão de Michael, procurando algum apoio nele. Estava fria, mas o conforto veio mesmo assim.
- Obrigada – murmurei. Olhei para Michael. – Vamos?
Ele balançou a cabeça positivamente e apertou minha mão quando empurrei um pouco mais a porta. Entramos no quarto a passos lentos e uma silhueta infantil se formou diante de nossos olhos, sentada no tapete, de costas para nós. Woody parecia bastante concentrado em algo, movendo as mãos de um lado para outro, tão atento em sua tarefa que nem percebeu nossa presença. Desviei os olhos para Michael e sorri, vendo-o sorrir também, enquanto nos aproximávamos um pouco mais.
O quarto era espaçoso e muito bem organizado. Havia um pôster do Homem Aranha pendurado em uma das paredes e uma estante repleta de carros e barquinhos em miniatura. A cama era de madeira branca, assim como o guarda-roupa, e em uma prateleira cheia de livros infantis, colocada logo ao lado do pôster, via-se um quadro recém pintado de um foguete pousando na lua, com os dizeres “eu sou o maior astronauta do mundo”.
Os dedos de Michael pressionaram ainda mais os meus e ele me fitou, ainda com aquele sorriso grande e bonito iluminando o rosto. Ele estava tão feliz que o sentimento se tornava palpável, mais nítido do que qualquer outra coisa dentro daquelas quatro paredes. Contei até três e soltei sua mão, caminhando até ficar poucos centímetros separada de Woody. Inclinei-me e toquei seu ombro, agachando-me ao lado dele.
- Woody? – eu disse com a voz mais natural que consegui pronunciar. 
Ao ouvir minha voz ele virou-se, interrompendo o a montagem do quebra cabeças no tapete e colocando-se rapidamente de pé. Jogou os braços em torno do meu pescoço e me puxou para ele, prendendo-me em abraço bem apertado. Eu sorri e coloquei as mãos em suas costas, sentindo o cheirinho bom de shampoo que vinha dos seus espessos cabelos negros, e dizendo para mim mesma que poderia ficar a vida inteira com ele em meus braços. 
- Tesse – ele disse e sorriu para mim, ajeitando o aro do óculos de grau que trazia junto aos olhos. – Você veio mesmo!
- Vim, claro – murmurei, passando a mão por seus cabelos. – E não vim sozinha. Trouxe alguém para você conhecer.
Ele me fitou com curiosidade e colocou-se ao meu lado, desviando os olhos para Michael. E quando o viu, sorriu, caminhando até ele e esticando a mão.
- Oi – Woody disse, com a mão parada no ar.
Fitei Michael e, já sabendo que aconteceria, vi a surpresa atravessar sua expressão. 
Ele não estava diante do que esperava ver. Os cabelos escuros e finos devem tê-lo surpreendido, assim como os dedos pequenos, as orelhas um pouco mais grossas, os olhos levemente próximos e amendoados. Todas as características nítidas que faziam de Woody um garoto especial, diferente dos outros garotos, mas não menos capaz do que qualquer outro de sua idade. Michael desviou os olhos para mim, com a expressão interrogativa, e, mesmo sem formular a frase, pude ver a pergunta “Cacete, Therese, por que você não me disse?” estampada com todas as letras bem no meio da sua testa.
Mordi o lábio inferior e me limitei a observar os dois.
Era visível que Woody tinha Síndrome de Down; assim como tinha machucados no joelho por conta do futebol na escola, assim como tinha paixão por astronomia, assim como tinha muita energia para pintar e desenhar, assim como tinha uma fonte inesgotável de carinho para oferecer a todos que estavam por perto. A síndrome não um defeito, muito menos um estorvo em sua vida, era apenas um detalhe, umas de suas tantas características, algo que fazia parte dele como tantas outras coisas importantes.
Eu sei que poderia ter contado para Michael com antecedência, mas preferi deixá-lo ver. Porque para mim, a Síndrome de Down nunca foi a maior característica de Woody, nunca foi algo que o diferenciasse a ponto de taxá-lo, de torná-lo menos normal do que qualquer menino de sete anos. Ele era uma criança incrível demais para que eu visse sua deficiência como um “mas”, um “porém” ou um “entretanto”. Aquele era Woody, simplesmente Woody, o filho que tive com Michael. E a palavra “filho” passara a significar tudo para mim. Eu o amava mais do que a qualquer outra coisa no mundo.
- Olá – Michael disse e, mesmo ainda surpreso, pegou delicadamente sua mão. Ajoelhou-se para ficar do seu tamanho e sorriu outra vez, passando a mão pelos seus cabelos. Não lhe ofereceu um sorriso qualquer, um sorriso de pena ou algo do tipo, mas o mesmo sorriso de felicidade que iluminava seu rosto quando entramos naquele quarto. Enlaçou as mãos em torno do corpo infantil e o abraçou, puxando-o para perto, apertando-o tanto que quase pude ver as bochechas de Woody ficarem vermelhas. – Foi você que pintou? – perguntou, apontando para o quadro do astronauta. Em seu olhar, através de algumas lágrimas insistentes, vi um brilho de completo orgulho duelando com a surpresa.
- Aham – ele respondeu com um aceno de cabeça. Tinha uma pequena dificuldade para falar, mas as palavras podiam ser entendidas com bastante clareza. – Pintei na escola. A professora pediu que a gente desenhasse um lugar que a gente quer ir um dia. 
- E você quer ir à lua? – Michael perguntou ainda segurando sua mão.
- Quero – confirmou. – Você quer ir comigo?
O sorriso de Michael alargou-se ainda mais, enquanto ele assentia e secava discretamente os olhos.
- Acho uma ótima ideia. Eu sempre quis ir lá também.
- Mas a Tesse tem que ir com a gente – Woody disse olhando para mim. 
- Eu vou adorar – murmurei e me ajoelhei ao lado dele também. – Onde estão seus outros desenhos? Você poderia mostrar para o Michael. Ele vai gostar de ver.
Ele assentiu e sorriu, indo na direção da mesa de cabeceira. Abriu a primeira gaveta e revirou algumas coisas lá dentro, tentando encontrar o que procurava. Michael olhou para mim, tirando a atenção de Woody por um momento. 
- Por que você não me disse? – perguntou baixo, transformando em palavras a pergunta que eu já havia visto em sua expressão. – Por que, Tess?
- Porque não faz diferença – respondi para ele. – Faz?
Ele olhou para Woody outra vez, ainda remexendo na gaveta, e balançou a cabeça negativamente.
- Nenhuma – sussurrou para mim. – Não faz diferença nenhuma. – Sorriu. – Deus, ele se parece comigo.
- Não, ele se parece comigo – corrigi. – A boca pode até ser como a sua, mas o queixo é igualzinho ao meu.
Ele sorriu outra vez e tocou minha mão. Estava rindo como um bobo, com os olhos negros brilhando, e aquele simples fato me fazia rir também. Ouvi o som de passos de aproximando outra vez e vi que Woody havia pegado um caderno de desenhos grande, com quase todas as folhas já usadas.
- Esses são os meus amigos – Woody disse para Michael, mostrando o desenho da primeira folha. Retratava quatro bonecos de palito muito bem desenhados, três meninos e uma menina, em pé ao lado de uma árvore. Michael sorriu ao ver aquilo. – E essa é você, Tesse – ele disse para mim, virando a página e mostrando uma boneca com os cabelos pintados de amarelo.
- É a cara dela – Michael murmurou rindo.
- Acho que não sou tão magra assim – eu disse com um sorriso, vendo as pernas de palito da boneca. – Mas adorei o desenho, querido. Ficou lindo. Você faz isso muito bem – murmurei, e era verdade. Apesar de não muito ornamentados, e de me retratar com cabelos cor de milho, os desenhos eram encantadores. 
- Tive uma ideia – Woody disse para Michael. – Vou desenhar você. Quer?
- Quero, claro que sim.
- Ótimo! – murmurei. – Fique em pé, Michael. – Ele obedeceu-me, com um sorriso no rosto. - O Woody precisa ter uma boa visão de você.
- Fique ao lado dele, Tesse – Woody instruiu. – Vou fazer vocês dois.
Eu assenti e me coloquei ao lado de Michael. Woody sentou-se na cama, diante de nós, e tirou uma caixa de lápis de cor de dentro de uma mochila, voltando a atenção para uma folha em branca do caderno.
Suas sobrancelhas se franziram enquanto ele pintava, olhando-nos de relance e voltando a fitar o papel. Os olhos de Michael procuravam os meus, alegres e sorridentes, em uma comunicação silenciosa que ambos éramos capazes de entender. Nosso filho era uma criança espetacular. Mesmo. E apenas um minuto era suficiente para que qualquer pessoa percebesse tal fato. 
- Pronto – Woody disse pouco tempo depois, esticando o caderno na nossa direção.
Michael pegou o caderno e sorriu ao observar o desenho, deixando-me olhá-lo também.


- Uau! – Michael murmurou. – Você manda muito bem, Woody. Olha só! A Tess continua idêntica.
- O Michael está ainda mais parecido do que eu – eu disse apontando para seu desenho na folha. – Veja bem. Parece fotografia.
- E esse coração? – Michael perguntou e me fitou de relance. – O que significa?
Woody sorriu para nós.
- Significa que você é namorado da Tesse – respondeu. – E que vocês se apaixonaram. Eu quis fazer assim porque você parece namorado dela. Você olha para ela de um jeito muito engraçado.
Michael sorriu e... ficou ruborizado com a observação. Gargalhei com aquilo. Era muito raro vê-lo daquela forma.
- Você está vermelho, Jackson – eu disse empurrando seu braço de leve. – Defenda-se.
Ele me fitou com olhos de quem diz “isso realmente me deixou sem saber o que dizer” e tirou os olhos de mim.
- Posso ficar com o desenho? –perguntou para Woody, mudando de pressa o foco da conversa. – Vou guardar com muito carinho.
- Pode, sim – ele disse e assentiu. – E se você voltar aqui, te desenho de novo. Eu gostei de você. Você é legal.
- Eu também gostei de você – Michael disse com aquele sorriso bobo dançando nos lábios outra vez. – Gostei muito, Woody. Da próxima vez trarei o Blanket. – Mordeu a boca e conteve-se, sem poder completar com “seu irmão.” – Meu filho. Vocês vão ser dar muito bem um com o outro, tenho certeza.
Woody assentiu e abraçou Michael, permanecendo em seus braços por um longo tempo. Quando se soltaram, os olhos de Michael estavam marejados, mas ele fez o possível para não deixá-lo perceber. O próximo abraço foi para mim, e depois disso, eu e Michael nos preparamos para ir embora. Poderíamos ter ficado lá por muito mais tempo, mas Woody tinha deveres da escola para fazer, então tivemos que nos despedir e prometer que voltaríamos em breve.
Conversamos com os Oliver durante um bom tempo e marcamos um encontro para os próximos dias, para que pudéssemos ver como as coisas ficariam. Eles estavam felizes por nós, pelas coisas estarem finalmente se resolvendo, mas disseram que muitas coisas teriam que ser acertadas se quiséssemos contar toda a verdade para Woody. Eu conseguia compreender aquilo suficientemente bem; e sabia que seria uma etapa decisiva para todos nós, afinal de contas, a vida de todos nós seria afetada com aquela revelação. Precisávamos de tempo, de cautela e de preparação, sempre pensando na felicidade de Woody e, consequentemente, no que seria melhor para ele.
- Obrigada, Tess – Michael disse para mim quando entramos no carro. Colocou sua mão sobre a minha. – De verdade.
- Por ter trazido você até aqui? – perguntei.
Ele mordeu o lábio e vi mais lágrimas surgirem em seus olhos. Virou o rosto e apoiou a testa no painel do carro, com os olhos fixados no chão.
- O que aconteceu? – perguntei, colocando um braço em torno dos seus ombros.
Por muitos segundos, ele não disse nada. Encostei minha cabeça em seu braço e apenas esperei, em silêncio, dando o tempo que ele precisava.
- Passei a minha vida inteira seguindo metas específicas, Tess – ele murmurou pouco depois, ainda sem me olhar. – Todo o tempo. Entrei para a faculdade de direito, me formei entre os primeiros da turma, me especializei em quatro áreas diferentes, montei meu próprio escritório antes mesmo dos trinta, defendi grandes causas, ganhei bastante dinheiro e... porra... o que significou isso tudo? Acabo de descobrir que, no fim das contas, ao longo da vida, as pessoas acabam se esquecendo daquelas pequenas coisas que realmente importam. O Woody... Ele... Meu Deus... ele... Ele é realmente muito especial. Não há o que pensar, Tess, nós precisamos contar toda a verdade para ele. Quero ouvi-lo me chamar de pai... e quero montar quebra-cabeças com ele... e quero vê-lo fazendo mais desenhos. Quero... fazer parte da vida dele. Entende?
Balancei a cabeça afirmativamente. Eu me sentia da mesma forma. Mas aquilo faria parte do meu – do nosso - futuro e, para conseguir vivê-lo, eu teria que exorcizar alguns fantasmas do passado. Era o primeiro passo, o passo mais importante, se eu realmente quisesse me abrir para uma nova vida. 
– Sei que você está pronto para isso, Michael. Você é maravilhoso, como homem, como pai. Quanto a mim... creio que preciso lidar com certas coisas antes – murmurei, fazendo-o finalmente voltar a me fitar. – Há algo que quero muito fazer. Ainda tenho um passado para enterrar, isso é muito importante para mim. Posso contar com você? 
Ele levou minha mão aos lábios e beijou o dorso dela.
- Claro que sim. – Passou o polegar lentamente por uma das minhas bochechas. – Por onde podemos começar?
- Seattle – respondi fitando-o. – Tenho que ir ao túmulo de meus pais.
- Estaremos lá amanhã – ele disse com determinação e colocou o cinto de segurança. – Pegaremos primeiro vôo. 



Capítulo 20

Mal tivemos tempo de nos preparamos direito para a viagem. O que eu tinha para fazer em Seattle era breve, porém indispensável. Eu e Michael pegamos o primeiro vôo do dia seguinte e, sem nem mesmo pararmos em um hotel para uma troca de roupas, seguimos em um táxi para a parte leste da cidade. Muita coisa mudara em Seattle desde a última vez que estive lá, mas não teríamos tempo para um passeio turístico, pois eu tinha bastante pressa em ir direto ao ponto. Segurei a mão de Michael quando o táxi parou e abri a porta com determinação enquanto ele dizia ao motorista que deveria nos esperar. Saímos do carro e fitamos o enorme portão de ferro que daria passagem a uma parte bastante sombria do meu passado.
Entramos em silêncio, de mãos dadas, ignorando o clima úmido e os vendedores que se apinhavam na entrada, oferecendo velas e ramalhetes de flores. Havia uma estrada de pedras que levava a uma grande ala arborizada, cheia de árvores frondosas e esculturas de pequenos anjos, transformando o local em um jardim silencioso. O chão era coberto de lápides em granito e mármore, com nomes e datas, a única coisa visível que restara das pessoas que estavam enterradas ali.
- Não sei onde meus pais estão – eu disse para Michael e mordi o lábio.
- Tente se lembrar – murmurou tirando os óculos escuros. 
- Estou dizendo que não sei – eu disse lançando um olhar ao mar de lápides à nossa frente. – Nunca estive aqui antes.
Michael me fitou, guardando os óculos no bolso da calça jeans preta.
- Nunca os visitou? – perguntou. – Em todos esses anos?
Balancei a cabeça negativamente. 
- Eu sei que deveria ter vindo – eu disse soltando sua mão. – Estou aqui agora, é isso que importa. Estar aqui é uma espécie de acerto de contas, entende? Nunca tinha sido importante. Até agora. 
Michael deu dois passos para frente e voltou a me fitar. Ele compreendia. Compreendia que estar ali, naquele momento, fazia parte de um projeto de mudanças. Eu estava me esforçando, tentando despertar o meu outro lado, aquele que eu ainda não conhecia muito bem, mas que podia passar a conhecer. O lado que se importava com as pessoas, que me deslocava do centro do mundo, que sentia a necessidade de tentar consertar certas coisas que eu havia feito; mesmo aquelas coisas que já não tinham mais conserto. 
- Vamos procurar – ele disse obstinadamente. – Fique por aqui, irei pelo outro lado.
Daria bastante trabalho. Mas ele estava bastante empenhado em ajudar, e esse simples fato me fez assentir e me aproximar dele para repousar um beijo de leve em seus lábios. Afastei-me dele e saímos andando, em caminhos opostos, sentindo a brisa fria nos envolver e o céu nublado anunciar uma provável chuva. Segui rumo a uma escultura de pedra que retratava uma ciranda de anjos melancólicos, e mantive os olhos no chão, atenta às lapides, lendo os nomes que elas traziam. Demorei uns vinte minutos até avistar duas lápides com os nomes “Donald Brown e Angeline Brown”, uma ao lado da outra, com as datas de nascimento e a mesma data de morte. 
Levantei a cabeça e vi que Michael estava a muitos metros de distância, dando a volta pelo outro lado. Balancei os braços e ele me fitou de longe, anuindo quando fiz sinal de que tinha encontrado.
- Estão aqui – eu disse quando ele estava se reaproximando. – Preciso de alguns minutos.
Michael assentiu e parou ao lado de uma das esculturas afastadas, sabendo que aquele momento era apenas meu; meu e de meus pais. Os pais que eu deixei morrer, uma voz completou em minha cabeça. Meu Deus. Em algum ponto dos últimos anos, algo em mim havia mudado, e agora eu já não conseguia evitar um nó enorme na garganta ao lembrar a forma como as coisas aconteceram. Ou como deixei que acontecessem, a voz voltou a murmurar antes que eu conseguisse afastá-la. Ajoelhei-me na grama e olhei fixamente para o chão, analisando as duas lápides postas lado a lado.
Mordi o lábio inferior e abaixei a cabeça, sem saber por onde começar. Era muito pouco provável que eles pudessem me ouvir, mesmo se eu gritasse, mas eu precisava falar, mesmo que as palavras se perdessem no ar depois de ditas.
“Pai” eu disse baixinho e me silenciei, quase desistindo de prosseguir, enquanto o vento soprava frio em meu rosto. Era difícil organizar as idéias, mesmo sabendo que aquilo era importante, e eu tinha consciência de que um mero pedido de desculpas não iria trazê-los de volta. Mas era o mínimo que eu poderia fazer tantos anos depois, então voltei a me concentrar. 
“Pai... eu sei que já faz muito tempo. Ignorei por muito tempo o fato de que você e a mamãe estavam aqui, assim como ignorei por muito tempo o fato de que estavam aqui por culpa minha. Por culpa do meu egoísmo, mais uma vez. Sei a pessoa horrível que eu fui para você e para a mamãe. E sei que você me amava. Você me amou até seu último momento de vida... mesmo que eu não tenha retribuído esse sentimento da forma como deveria ter feito. 
Eu errei, sei que errei. Errei muito. Admitir isso custa muito para mim, mas não tê-lo aqui custa muito mais, tenha certeza. Você foi uma das poucas pessoas que me deram amor e fui uma estúpida por não ter reconhecido isso. Eu só queria... Caramba, pai, eu não sei o que eu queria. Eu o admirava tanto que queria tê-lo de uma forma diferente. Eu o achava o homem mais incrível do mundo e acreditava que a mamãe não conseguia enxergar a pessoa maravilhosa com quem tinha se casado. Ela não dava o amor que o senhor merecia, não da forma como eu poderia dar. Era o que eu sentia, pai, e para mim era normal. Uma espécie de complexo de Édipo, talvez. Não adianta tentar explicar agora. Isso não vai mudar nada, não é? Se houvesse uma forma de mudar tudo isso, eu não pensaria duas vezes antes de tentar trazê-lo de volta. Eu queria muito vê-lo se encontrando com o Woody. Tenho certeza de que o senhor o amaria e se orgulharia dele tanto quanto eu me orgulho. E também adoraria vê-lo reencontrando o Michael. Ele me disse que vocês se conheceram no passado e sei que se davam bem.
 
Levantei a cabeça por um instante e vi Michael à distância, brincando com a aba do chapéu. Sorri baixo comigo mesma e voltei os olhos para a lápide.
Ok, vamos lá. Falar do Michael me deixa com cara de idiota. Ele é um homem muito importante para mim. Eu me apaixonei por ele no exato momento que o vi, mesmo que ele tenha me irritado à primeira vista. As coisas entre nós desandaram um pouco - desandaram muito, na verdade – mas agora tudo está indo tão bem... que eu me sinto apavorada. As pessoas ficam meio tolas quando se apaixonam. Eu me sinto a maior tola do Planeta Terra. O pior de tudo, uma tola feliz. Uma maldita tola feliz. E é muito bom me sentir assim, pai. Percebi que deixei um lado da minha personalidade morrer de inanição. Agora encontrei pessoas para o alimentarem. Talvez não seja tarde demais. Espero sinceramente que não seja.
Virei-me novamente e percebi que Michael não estava mais lá. Mordi o lábio inferior e me concentrei mais uma vez.
Meu pedido de perdão não fará o tempo voltar, mas quero pedir da mesma forma. Me perdoe. Por tudo que eu fui, e especialmente pelo que eu não fui. Pelo que eu fiz, e também por aquilo que não fiz. O Woody será um grande homem, tenho certeza, um homem tão maravilhoso como você. E ficarei feliz em falar para ele sobre seu avô, um homem maravilhoso chamado Donald, que tinha um coração enorme e que deixou saudades. Eu te adoro. Fique em paz.”
Assim como você, mãe. Fique em paz também.”

Apertei os olhos, contendo as lágrimas, e levantei-me, passando a mão pelos joelhos para limpar a grama que ficara presa na calça jeans. Ouvi passos e virei-me a tempo de ver Michael caminhando em minha direção, com um ramalhete de rosas brancas nas mãos. Respirei fundo e o abracei, querendo tê-lo bem próximo a mim.
Uma de suas mãos envolveram meu quadril e apoiei a cabeça em seus ombros, sentindo seu hálito em meus cabelos.
- Eles não deveriam estar aqui – eu disse baixo, ainda com os olhos marejados. – Eles não estariam mortos se...
Michael tocou meu rosto e me fez fitá-lo, interrompendo-me antes de terminar a frase.
- Se o quê Therese? – perguntou para mim. – Não temos como saber. Certas coisas acontecem simplesmente porque tem de acontecer. Eles poderiam estar mortos mesmo que você tivesse feito de tudo para tirá-los daquela casa em chamas. 
Sequei os olhos, dando um passo para trás. Não sei se conseguia ver as coisas por aquele ângulo. Se eu ao menos tivesse tentado... Engoli em seco. Michael esticou o ramalhete para mim. 
- Não. – Balancei a cabeça negativamente, recusando as flores. – Flores não irão trazê-los de volta.
- Nada irá – ele murmurou. – Mas é uma forma de mostrar que você se importa.
Desviei os olhos para a lápide outra vez e peguei o ramalhete de flores em suas mãos. Fiz uma oração em voz baixa e coloquei as flores ali, entre os dois túmulos.
Michael também disse algumas palavras em voz baixa e segurou a minha mão. Fizemos o caminho de volta, retornando pelo mesmo caminho de pedras, e deixamos o cemitério, voltando à rua onde o taxista ainda esperava por nós.
- Espere aqui – Michael disse quando abri a porta do carro.
- Aonde você vai? – perguntei, mas já era tarde demais. Estreitei os olhos de curiosidade quando o vi retornar ao cemitério, parando para conversar com um dos vendedores de flores na entrada.
Entrei no táxi e abaixei o vidro da janela para poder observá-lo. Menos de três minutos depois ele voltou com passos apressados, trazendo um enorme buquê de rosas vermelhas nas mãos.
- Oh meu Deus, Jackson, o taxímetro está rodando – eu disse quando ele entrou e se sentou ao meu lado no banco de trás. – Não dá mais tempo de voltar lá. Você devia ter comprado antes, junto com as outras flores. 
Ele me fitou com divertimento.
- Não são para eles – disse com um pequeno sorriso marcando os lábios. – São para você. 
Permaneci alguns segundos fitando-o, sem conseguir acreditar naquilo. Era a primeira vez na vida que alguém me dava flores.
- Sei que não é o melhor lugar para comprar flores, senhorita Brown, e também sei que ganhá-las não faz o seu estilo, mas, pelo menos uma vez na vida, vamos fingir que somos um casal normal, ok? Pegue esse buquê, sorria, diga que ele é lindo e me dê um beijo de agradecimento.
Abri um sorriso enorme e segurei o buquê. As flores eram realmente lindas e, definitivamente, dar um beijo de agradecimento seria a melhor parte das instruções. Cobri meus lábios com os seus e partilhamos um beijo longo, enquanto o taxista permanecia com o carro parado, sem saber para onde deveria nos levar.
- Eu adorei – eu disse colocando o buquê no colo. - É uma forma de dizer que você se importa? – perguntei para ele, usando o mesmo que ele me dissera lá dentro.
Michael sorriu.
- Não apenas isso. É uma forma de pedi-la em casamento – ele disse acariciando o meu rosto, com a voz mais natural do mundo. Minha boca paralisou-se, assim como os olhos, as mãos, e a maldição do corpo inteiro, enquanto eu ainda tentava decifrar se realmente havia escutado direito. - Temos um filho que precisa de nós, Tess. Temos uma família para construir. Temos passos para dar, juntos. Você pode dizer sim e se abrir para uma nova vida ou pode dizer não e continuar a fugir de uma parte maravilhosa que existe aqui dentro, em seu coração – disse e tocou meu seio esquerdo. – Uma parte realmente maravilhosa – murmurou de brincadeira e apertou meu seio de leve por cima da blusa, alargando ainda mais o sorriso travesso quando o taxista viu a cena pelo retrovisor. – O que me diz? Aceita ser minha mulher?
Eu o fitei, com um turbilhão de sensações fazendo piruetas dentro de mim. Eu sempre quis ouvi-lo dizer aquilo. Sempre quis tê-lo perto de mim, sempre quis ser sua, sempre quis ter com ele uma vida em comum. 
Nunca fomos um casal como os outros, definitivamente, mas sempre nos entendemos bem nosso melhor e em nosso pior. Sempre soubemos que a natureza humana pode nos apresentar diversas facetas. Todos nós somos formados por uma compilação de defeitos e qualidades, erros e acertos, bons e maus sentimentos: porque ser dual faz parte de ser humano.
Muitas pessoas perdem tempo tentando definir a diferença entre bem e mal, sem perceberem que esses dois aspectos aparentemente antagônicos são dependentes um do outro; eles se mesclam e se completam. Todos tempos luz e trevas em nossos corações, o que nos resta é sobrepor um ao outro, tentar encontrar o equilíbrio, como o yin e o yang. 
- Eu sabia que ainda iria ouvi-lo dizer isso – murmurei e o fitei. Sorri e aproximei nossos lábios. – Sim. Sim, sim, absolutamente sim. 
Michael sorriu e me beijou, puxando-me para os seus braços. Suas mãos passearam lentamente pelas minhas costas, trazendo-me para ainda mais perto dele, e ouvimos o taxista dar um alto pigarro.
- Senhores? – perguntou, nitidamente desconfortável. – Senhores? – repetiu quando percebeu que não tínhamos dado a mínima.
Michael colocou a mão no bolso e jogou a carteira para ele.
- Tire todo o dinheiro que estiver aí e vá dar uma volta – murmurou tirando os lábios dos meus por um momento. – Pode deixar o taxímetro rodando. Mas não volte enquanto os vidros permanecerem fechados, certo?
O cara olhou para Michael com incredulidade.
- Não... Mas, vocês não podem... Pelo amor de Deus, senhores, estamos estacionados na rua...
- Faça o que ele disse, meu senhor – insisti lançando um olhar duro em sua direção. Ele assentiu rapidamente e saiu às pressas, batendo a porta do carro. Gargalhei e voltei a fitar Michael. – Meu Deus, isso sempre funciona! Tenho cara de louca, Jackson?
Michael me derrubou no banco e colocou-se em cima de mim. Antes que eu pudesse puxar o ar, suas mãos estavam arrancando os meus sapatos e a calça jeans.
- Tem, e isso é útil e sexy – disse sorrindo, enquanto eu também tentava lhe despir. – Adoro isso em você. – Beijou meu pescoço e logo estávamos nus, apertados no banco de trás, tentando encontrar uma posição confortável naquele espaço pequeno. Estaríamos perdidos se alguém se aproximasse muito dos vidros da janela. 
Seus olhos me fitaram com intensidade quando ele me penetrou, abafando com a boca meus suspiros e gemidos. Seu corpo se movia com habilidade em cima do meu e eu o prendia junto a mim, com as unhas enfiadas em suas costas e as pernas entrelaçadas nas suas, sem permitir distância entre nós dois. O orgasmo logo veio, para os dois ao mesmo tempo, fazendo nossos corpos tremerem e se contorcerem em sintonia. O modo como nos segurávamos e nos apertávamos possessivamente deixaria ambos marcados, e nada no mundo poderia me deixar mais satisfeita do que aquilo. 
- Conhece um lugar mais seu do que esse? – murmurei quando ele parou de se mover, com o membro ainda dentro de mim. 
Ele sorriu e mordeu meu lábio. 
– Não – disse e arremeteu mais uma vez. - Gosto muito de estar dentro de você, futura senhora Jackson. 
“Futura senhora Jackson”. Caramba. Como era bom ouvir aquilo.
- Então não saia, está bem? Não saia – sussurrei para ele, sabendo que aquele era o meu encaixe perfeito. – Esse lugar pertence a você, e eu amo ter você aqui. 
Enlacei os braços em torno do seu pescoço e sorrimos enquanto começávamos tudo de novo, com ainda mais desejo e intensidade do que antes. Permaneceríamos muito tempo naquele carro, esquecidos do resto do mundo, esquecidos do passado, do futuro, dos erros e dos acertos, deixando apenas nossos corpos se comunicarem. 
Sabíamos que tínhamos uma nova vida esperando por nós. Precisávamos fazer com que aquilo desse certo.
Conseguiríamos?
A estrada seria longa, sem sobra alguma de dúvida. 
E nada me faria mais feliz do que percorrer ao seu lado cada passo daquele imprevisível caminho.

Epílogo

Michael

29 de agosto de 2013, Los Angeles, 5:20 P.M 

Uma das maiores forças do mundo com certeza é o poder do tempo. 
Ele passa sem pedir licença, tão rapidamente que nem conseguimos acreditar quando olhamos para trás e vemos quem já fomos um dia. O tempo constrói e destrói, aproxima e afasta. Molda e modifica, acima de qualquer coisa. As experiências vividas deixam seus ensinamentos e a idade trás consigo uma visão bastante ampla do mundo. Vocês podem estar pensando “Meu Deus, que papo de velho”, e eu concordo completamente com vocês. Estou mesmo ficando velho. São 55 anos. 55 anos! Como irão colocar 55 velas em cima de um bolo? Santo Deus! Faltam apenas cinco anos pros sessenta. Quinze anos pros setenta. Apenas 45 anos para os cem!
- Amor? – ouvi uma voz perguntar na porta do quarto. – Estão todos aí. Todos querem vê-lo. Dá pra se apressar?
Tirei os olhos do homem no espelho e vi Therese parada na porta, absolutamente linda em um vestido azul escuro pouco acima dos joelhos. Os anos a deixaram ainda mais bonita e gostosa, se é que isso é possível. Em dez anos de casamento, não houve um dia sequer que eu não tenha contemplado sua beleza. O tempo parou para ela. Para mim não. Afinal de contas, se tivesse parado, eu não estaria completando 55 anos hoje. Eu não estaria me transformando em um... senhor. Meu Deus, um senhor. Um senhor de 55 anos.
- Estou quase terminando - eu disse, terminando de ajustar a roupa.
- Olha só o que temos aqui... – ela disse entrando no quarto e parando diante de mim. – Magnífico. Os anos estão sendo maravilhosos com você, Jackson. Você está com um ar absolutamente sexy de homem experiente.
Sorri quando ela caminhou até mim e me deu um beijo nos lábios.
- Estou completando meio século e cinco anos. Talvez devêssemos sair dessa casa e ir morar em um museu.
Ela gargalhou e me deu outro beijo. Prendi minhas mãos em sua cintura, moldando seu corpo ao meu.
- Que drama! – murmurou. – Você está melhor do que nunca. Se não estivesse tão atrasado, eu iria adorar tirar essa sua roupa e fazer uma festinha particular em cima de você.
Mordi o lábio inferior e senti uma vibração dentro da cueca. Therese adorava me provocar; e meus instintos sempre respondiam apressadamente.
- Eu acho uma ótima ideia – disse para ela e procurei com uma das mãos os botões traseiros do seu vestido. 
- Pai? Mãe? Onde vocês estão? – uma voz disse no corredor e nos entreolhamos, descobrindo que aquela comemoração teria que ficar para depois. Afastei-me dela e Woody surgiu no quarto, colocando-se para dentro também. – Pai, está todo mundo lá fora querendo saber de você. Você não vai descer? 
Olhei para ele, percebendo que a enorme passagem do tempo também estava presente ali. Aquele pequeno garoto agora era um rapaz de 17 anos, inteligente e obstinado, que pretendia terminar o ensino médio no ano seguinte e entrar para a faculdade de artes cênicas. Woody era um garoto maravilhoso, que tinha superado com coragem todas as adversidades da vida, e me ensinou muito em todos aqueles anos incríveis de convivência. Caminhei até ele e dei um beijo em sua testa.
- Vamos - murmurei indo em direção à porta. – Já deixei nossos amigos esperando tempo demais. 
- Veja só como seu pai está lindo – ouvi Therese dizer para Woody logo atrás, envolvendo seus ombros com um dos braços. – Fique de olho nele, ok? Se alguma das convidadas sorrirem muito abertamente para ele trate de vir me avisar.
- Eu estou ouvindo isso – murmurei olhando para trás.
- Então trate de andar na linha – ela disse me lançando um olhar que era meio ameaça, meio sorriso.
A expressão em seu rosto me fez sorrir. Quando me casei com Therese não tinha a mínima certeza de que aquilo daria certo, mas minhas incertezas também se desvaneceram ao longo do tempo. Somos felizes, absolutamente felizes e realizados. Hoje não tenho dúvida alguma de que ela é a mulher da minha vida
A festa de aniversário aconteceria no jardim e, assim que apareci, a música parou e os convidados entoaram um entusiasmado “parabéns para você”, assoviando e batendo palmas. Therese tinha cuidado de tudo, transformando o jardim em um espaço cheio de mesas, cadeiras, faixas e bexigas, além de uma enorme mesa de doces, salgados, e um bolo com duas velas em forma de 5 acesas em cima. Sorri quando vi aquilo. Era uma ótima maneira de economizar espaço.
- Parabéns, pai – Blanket disse abrindo espaço entre as outras pessoas e vindo até mim, acompanhado por uma garota morena. Deu-me um abraço e sorriu. – Como se sente sendo um coroa?
- Melhor do que aos vinte – eu disse com diversão na voz. Céus, meu pequeno Blanket também crescera muito. Estava com 16 anos e quase da minha altura. Olhar para meus filhos sempre me deixava com uma tremenda cara de idiota, tamanho era meu orgulho deles; e, bem, na maior parte do tempo eu nem conseguia disfarçar. – Sua mãe e o Robert já chegaram de viagem? 
Ele balançou a cabeça negativamente. Mel e um cardiologista chamado Robert haviam se casado cinco anos antes; e estavam em Paris a duas semanas, comemorando o aniversário de casamento. 
- Não, eles só chegarão na quinta – Blanket respondeu. – Ela pediu que eu lhe desse os parabéns e desejasse felicidades. Disse também que encheu sua caixa de entrada do email de mensagens, mas o senhor ainda não respondeu nenhuma. 
Tentei lembrar a última vez que abri o email, provavelmente vários dias atrás. Eu e as novas tecnologias não nos entendemos muito bem.Telefonar é tão mais simples.
- Vou telefonar para ela – eu disse com uma piscadela. Desviei os olhos para a garota ao lado de Blanket e percebi que estavam de mãos dadas. Sim, os anos passam mesmo depressa. Aparentemente meu filho já tinha uma namorada e ainda não tinha me contado aquilo. – Não vai me apresentar a moça?
A garota me fitou com grandes olhos pretos e Blanket me fitou com olhos de quem diz “qual é, pai, não há necessidade disso”. Ele sempre foi tímido e isso não mudou na adolescência. Eu e ele teríamos que conversar sobre aquele assunto. Será que eles já estão..., comecei a pensar. Não, claro que não, são duas crianças! Mas se estiverem, Deus queira que estejam se prevenindo.
- Prazer, senhor Jackson – a garota disse e esticou a mão para mim. – Parabéns. A festa está maneira. Ah, meu nome é Courtney.
- Prazer Courtney – eu disse afagando sua mão e sorri. – Não me chame de senhor, eu me sinto ainda mais velho quando ouço isso. Pode me chamar de Michael, está bem?
Ela assentiu. Tive vontade de acrescentar “e tome cuidado para não machucar o coração do meu filho”, mas Blanket certamente abandonaria a festa se eu dissesse algo daquele tipo. Ele iria dizer que o estava “fazendo pagar mico” ou alguma coisa desse gênero.
- Mike! – alguém disse atrás de mim. Virei-me e enxerguei Chris sorrindo e estendo os braços em minha direção. Vestia um terno cinza com gravata vermelha, em um estilo bem Chris de ser. Certas coisas nunca mudam, não importa quando tempo se passe. – Mike! Felicidades, cara. – Deu uma olhada em volta, observando as convidadas, e soltou um suspiro de aprovação. – Essa sua festa está cheia de belezinhas, hein? Quem são? Amigas da Therese?
Sorri para ele. Certas coisas não mudam mesmo.
- Vizinhas, clientes, amigas da família, mas tire esse sorriso do rosto porque quase todas são casadas. Terminou com a Alice? – aquele ali trocava de parceira como quem trocava de roupa.
- Ela terminou comigo – disse com um leve dar de ombros. – Disse que o problema era ela, não eu, e todo aquele papo chato de fim de relacionamento. Oi Blankie – acrescentou de repente, quando o viu parado ao meu lado. – Não vai me apresentar à sua garota?
- Oh tio, essa é a Courtney – disse apressadamente e trocaram apertos de mão. 
- Mandou bem garoto – ele disse e deu um tapinha no ombro de Blanket. – Camisinha sempre, ok?
Blanket ficou completamente ruborizado e fingiu não ter escutado aquilo. Era evidente que teria matado Chris se pudesse.
- Onde está o Woody? – Blanket desconversou, olhando ao redor. – Ainda não o vi. Vou procurar por ele.
Recebi outros abraços e felicitações de conhecidos e amigos de longa data e logo Therese veio me encontrar outra vez. Estava com um copo de whisky na mão e o estendeu para mim quando se aproximou, abraçando-me em seguida.
- Está gostando da festa?
- Sim – respondi e deu um beijo em seus lábios. – Acabo de reencontrar pessoas que eu não vejo há muito tempo.
- Agora só está falando uma coisa. – murmurou quando bebi o primeiro gole.
- Que coisa?
Ela sorriu e gesticulou para o outro lado do jardim. A música parou e todos voltaram para suas mesas, enquanto Woody pegava um microfone e pedia a atenção dos presentes.
- Discurso – ela disse e tomou o copo das minhas mãos.
- Oh, não – tentei recusar, mas ela já estava me empurrando por entre as mesas.
- Aqui, pai. – A voz de Woody soou no microfone. – Vem. Queremos ouvir algumas palavras.
- Só algumas palavrinhas, amor – Therese insistiu levando-me até lá. – Você é a estrela da festa e todos querem ouvi-lo.
Ela me beijou antes de dar a volta e também sentar-se em uma das mesas, ao lado de Blanket e Courtney. Chris também estava sentado, assim como a Lorna e os avós, pessoas do escritório, amigos de Woody, antigos amigos da faculdade, muitas das pessoas que faziam parte da minha vida. Limpei a garganta e peguei o microfone das mãos de Woody, fitando todos que sorriam para mim.
O silêncio caiu sobre o jardim e me vi com as mãos suadas, sem saber ao certo o que dizer. Eu estava diante de algumas das pessoas que mais amava na vida e acho que fazê-los saber daquilo seria o mais sincero de todos os discursos.
- Bom, eu não sei por onde começar. Não trouxe nada escrito. Antes de descer eu estava treinando algumas palavras no espelho, mas acreditem, estava péssimo – eu disse e os fiz sorrir. – Na maior parte do tempo eu estava tentando me convencer de que estou mesmo fazendo cinqüenta e cinco anos. Eu me sinto com vinte e cinco. A única diferença é que agora podem ser encontrados alguns fios grisalhos em minha cabeça, mas sei que isso acentua ainda mais o meu charme.
Dessa vez os risos foram ainda mais sonoros. Houve uma longa salva de palmas.
- Tess, Woody, Blanket... quero dizer que os amo muito, com todo meu coração.
- Ei! – Chris gritou de lá.
- Você também Chris – acrescentei. - O tempo passa depressa, muito depressa, e o que realmente importa é viver cercado das pessoas que amamos. Esse é o sentido da vida. Se você chega neste mundo sabendo que é amado e sai dele ainda sabendo disso, então será possível lidar com tudo que lhe acontecer entre sua chegada e partida. É assim que eu me sinto hoje. Se amanhã eu não estivesse aqui, entre vocês, teria partido feliz, porque levaria coisas maravilhosas em meu coração. 
“Agradeço muito a todos que vieram até aqui hoje. Que Deus os proteja. Olhando para vocês tenho a dimensão do quando sou amado e querido, do quanto tenho sorte por ter a chance de conviver com todos vocês. O que colhemos hoje é resultado do que plantamos ontem e, vendo cada um neste fim de tarde, tenho certeza de que semeei muitas coisas boas ao longo da vida.”
“Obrigado por terem contribuído para fazer de mim o homem que sou hoje, cada uma à sua maneira.”
“Isso me faz sorrir e saber que desses cinqüenta e cinco anos... todos os minutos valeram a pena.”

- FIM
 

Meninas, é desta forma que essa história finalmente chega ao fim. Como vocês puderam ver, o Michael e a Therese acabaram ficando juntos no fim das contas; e sei que isso irá gerar o opiniões opostas.



A Therese acabou sendo amada por uns e odiada por outras. Ela não é uma mocinha convencional, absolutamente. Creio que ela estava mais para uma vilã, mas como pude notar no desenrolar das postagens, muitas pessoas (a grande maioria) passaram a torcer por ela e pelo Michael.



Algumas podem perguntar “Mas, Nai, você tá ficando maluca?! Como pôde deixar uma mulher como ela se dar bem no final da história?! Ela era má! Ela não prestava!” Tudo bem, ela não era a mais correta e adorável das mulheres, mas, como vimos, ela conseguiu fazer o Michael absolutamente feliz. Ela aprendeu com ele, ele aprendeu com ela e o amor a transformou em uma pessoa melhor.



Como a própria Therese disse em certo momento “a linha entre o melhor e o pior é tênue demais para nos preocuparmos com ela”. O bom e o mau só depende do ângulo que olhamos para algo.



Espero do fundo do coração que todas possam entender o final.

E muito obrigada por terem acompanhado!

54 comentários:

  1. Fic Nova genteeeeeeeeeeeeeeeeeee :D Para quem não leu ainda a 1º Parte tem aqui :D

    http://michaeljacksonfanfics.blogspot.pt/2014/04/fanfic-perigosa-obsessao-18.html

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  2. Prontinho, meninas. está postado o primeiro capítulo.

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  3. Continuaaaaa , pensei que tinha acabado , porque eu li a parte 1 e nossa amei , obrigada por matar minha saudade Nai...

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  4. Meninas, muito obrigada por estarem acompanhando <3

    Ana, eu é que agradeço, thank you por estar aqui na segunda fase dessa aventura.
    Capítulo 2 postado.

    Beijos!

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    1. Eu não perderia essa segunda fase por nada , se na primeira eu me aventurei , nessa eu quero aprofundar no perigo...God Bless You....!

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    1. Só esperar a Nai Postar, não sei se ela vai actualizar hoje:\

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  6. Aiiiiwn ainda bem que a Therese não foi presa , amo muito essa mulher para acontecer algum mau a ela novamente......Continuaaaaaaaaaaaaaaa

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  7. Muita água vai rolar por baixo dessa ponte, Ana, e Therese tem uma carta na manga :3 Fique atenta ao flashback... Ele irá começar a esclarecer algo que ainda não foi citado.

    Beijos!

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  8. Nai , acabei de ler o flashback e eu ja tenho noção do que seja , vai Therese você consegue , estou aqui com você mulher !!!! continuaaaaaaaaaaaaaaaa bjsss

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    1. Obrigada por estar acompanhando, flor. Mais flashbacks virão futuramente para dar alguma pista do que pode ter acontecido na vida da Therese quando ela estava internada.

      Obrigada por comentar. Beijos!

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    2. Ta otima , com os flashbacks vai ficar mais facil de desvendar a historia junto com Michael...

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  9. continua mulherrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr , ansiosa por mais

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  10. POSTA MAIS POR FAVOR NAI <3 TE AMO PAGO MIL DOLARES POR FAVOR , :(

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    1. ahhhh , bem eu agr não sei quando ela posta, pois ela tem a faculdade pelo que sei e mal tem tempo

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    2. Não é preciso chorar, só questão de esperar sei como é dificil eu tb estou a acompanhar, e queremos sempre cap novos

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  11. Prontinho, honey, acabei de postar mais um kkkk. I love you more, tá? Obrigada por ler e comentar.
    Realmente a facul consome bastante do meu tempo, e talvez eu atrase um pouquinho os próximos capítulos pois terei que estudar para duas provas >< Mas farei o possível para trazer mais logo.

    Beijos!

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  12. Uhu espero que tenha mais hehe valeu Nai

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  13. Ahhhhhhh Therese eu amo você e a Nai....Heheheh Michael agora não tem mais saida e realmente você tem razão amor não se compra , mas quem disse que Therese vai precisar comprar o seu amor , ela ja o tem nas mãos homem de deus.....

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  14. Bom dia meninas! Acabo de atualizar a fic. Obrigada por estarem lendo e comentando. Prometo que logo virá um hot dos dois.

    Love u all. Beijos!

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  15. Continuaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa , to morta de curiosidade , bem feito Michael , cara porque que homens são assim BURROS kkkk não para não Nai

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    1. Obrigada pelo coment flor kkkkk. Agora o Mike tá começando a se deixar levar por ela, vamos ver onde isso vai parar. Beijos.

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    2. Nossa vey ta muito perfeita , Michael acha que tem escapatória , Therese Brown não é burra Michael

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  16. Continuaa! Por favor! Sua Fic é mt mt boa, não desista dela!

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    1. Não irei desistir,pode ficar tranquila, viu? Estou demorando com as postagens porque estou um pouco sem tempo, mas não vou parar de postar<3 Obrigada por acompanhar.

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  17. Capítulos postados, obrigada por estarem acompanhando <3 Beijos.

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  18. Hahahahahah bem feito Michael bem feito para você , vey na hora que ela disse que por hoje seria so a foto , desculpe , mais eu tive que rir do Michael kkkkkkkkk continuaaaaaaaaaaaaaaaaa Please

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    1. kkkkkkkkk Ela sabe bem instigar a curiosidade dele.
      Obrigada por estar acompanhando, honey.
      Beijos!

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    2. Dnada....God Bless You...kisses

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  19. Chris só você mesmo '' Por que ninguém me faz uma proposta dessas? ''' kkkkkkkkkkkkkkkk em um momento de apelo do Michael e você me vem com gracinhas kkkkkkk continuaaaaaaaaaaaaa

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  20. kkkkkkkkkk Pois é, Chris é uma figura. Acabei de postar mais um, viu?
    Beijooos!

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  21. Não acredito que ela matou o bebê.

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  22. Essa Theresa é uma vadia vagabunda BITCH, mas acho que não foi ela, mesmo assim nunca gostei dela essa maluca tem que voltar pro hospício, galinha BITCH

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  23. Eu amo a theresa acho que ela tem que fica com o Michael no final por que ele combinam então tomara que a theresa fica com o Michael.

    #theresa #e #michael.
    Continua.

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  24. Ele tem que fica com theresa ,eu não acredito que ela matou o bebe aconteceu alguma coisa #Michael e treresa��♥♥♥

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  25. Olá, meninas! Trouxe mais um pouco da fic. Finalmente saberemos o que aconteceu com o bebê.

    Sei que há muitas que torcem a favor de Therese e muitas que torcem contra rs. Espero conseguir encaixar tudo em seu devido lugar.

    Obrigada por estarem acompanhando.
    Beijos <3

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  26. Faz ele ficar com ela ,ela merece uma chave porfavor

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    1. A fic está chegando na reta final e logo saberemos se ele ficará com a Tess, tá bem?
      Obrigada por estar aqui <3
      Beijos!

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  27. Postado o último capítulo meninas. Obrigada a todas que acompanharam <3 Beijos!

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  28. Pra mim ficou perfeita eu torce prós dois ficarem junto eles mereciam mesmo depois de tudo que a therese fez acho que todo mundo viu que ela merecia ficar com ele. Amei o final amei a fic.
    Ficou perfeita.

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  29. Adoreeeei perfeito tava torcendo ela merecia acho que o filho teve grande parte da mudança dela e Michael também.bjus vc tem talento garota continue assim talentosa.��

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